Rodolfo Montes de Oca
Desde baixo, é uma série de entrevistas que busca abordar as eleições presidenciais nos EUA sob uma ótica diferente, fazendo ênfase nos movimentos sociais e nos grupos de base que não se veem representados nesta eleição. Nesta edição falamos com Luis Prat, trovador e ativista cubano-americano, membro do sindicato Industrial Workers of the World (IWW) e do Movimento Libertário Cubano no Exílio (MLC-E). Aqui te deixamos uma perspectiva distinta do “Election Day”.
Pergunta > Como você observa as eleições nos EUA? Um populismo conservador com Donald Trump ou a continuidade do liberalismo econômico com Hillary Clinton?
Resposta < Esta eleição, imagino que será como a maioria das eleições em todo o mundo: um circo, um teatro do absurdo, para fazer-nos crer que de verdade temos democracia e liberdade. Se nos remontarmos oito anos atrás, vemos que do nada surge um candidato, “the junior senator from Illinois” [o jovem senador do Illinois], Barack Obama. Poucos, a não ser os habitantes de Chicago, Illinois, haviam ouvido falar do tal Barack Obama. E de repente, eis ele aí, o candidato do partido democrata. Como surgiu? Alguém o elevou até aí? Caramba, de onde saiu este cara? Minha opinião &eacut e; que existe um poder detrás do poder, esse poder é o que põe as regras e os candidatos. Esse poder controla ambos partidos, esse poder controla tudo: os bancos, as empresas multinacionais, os governos das nações, declara guerras e arbitra pazes. Esse poder estabelece as regras da “democracia” e as “eleições” e põe os candidatos que elegeram para continuar seu projeto, que não é outro que adquirir mais e mais poder. Creio que nós os anarquistas entendemos isto.
Neste ciclo eleitoral decidiram subir o show até as nuvens. Assim que tivemos o espetáculo de 17 republicanos brigando entre eles para ao final acabar com Donald Trump. Por parte dos democratas, acabamos com a Hillary após um pouco mais de circo. E disso se trata: eleger o candidato-candidata que ganhe o concurso de beleza. Esse poder sabe bem que Trump é, aparte de narcisista egomaníaco, um ator que se excede interpretando o papel de consumado filho da puta machista abusador. A aposta é que o votante médio ficará enojado e votará na Hillary. A Hillary… que se pode dizer da imprescindível matrona do establishment? Sua voz me irrita, estridente, de um populismo barato, mentirosa como boa política, comprada por Wall Street, a i ndústria petroleira e a do armamento. Guerras e capitalismo. Enfim, estamos fodidos, ganhe quem ganhe, nada bom se augura.
Da minha parte, devo explicar que votei por uma candidata inédita do partido Peace and Freedom (Paz e Liberdade) porque gostei do nome e era uma mulher. Aparte disso, na cédula há muitas coisas mais a votar, tais como a congressista democrata (melhor que o republicano), e as proposições tais como a abolição da pena de morte e a legalização da marijuana. Já vês que não é tão simples como dizer não votes, há muitas coisas em jogo e algo se pode avançar. O importante é reconhecer que isto não é nada mais que um circo, e que as opções são absolutamente asquerosas, mas a maioria votará pelo mal menor, ou seja, Hillary. Esse é meu progn&o acute;stico.
Pergunta > Qual é sua opinião sobre o enfoque de ambos candidatos sobre a imigração nos EUA?
Resposta < Já sabemos que Trump deportará 12 milhões de pessoas indocumentadas, e construirá um muro de 2.000 milhas e fará com que o México o pague, assim se livrará dos narcotraficantes e violadores mexicanos que tanto nos ameaçam (segundo ele). Enquanto Hillary Clinton, imagino que continuará com a política de Obama, que é o presidente que deportou mais pessoas, que separou mais famílias na história recente.
Pergunta > São oito anos da “Era Obama”… Como avalia sua gestão?
Resposta < Creio que Barack Obama tinha boas intenções, dentro do marco permitido por esse poder de amarras. Mas o racismo da maioria dos integrantes do senado e da câmara de representantes ganhou. Lhe obstruíram em tudo o que lhes foi possível. Nunca foi visto um espetáculo tal como um dos juízes da Suprema Corte, Scalia, gritando ao presidente durante seu discurso nas Cortes. Puro racismo, lhe faltaram com o respeito e lhe obstaculizaram todas e cada uma de suas medidas, assim que não pôde fazer muito do que talvez ele tenha querido fazer. Criou um plano de saúde que na teoria cobre a todas as pessoas neste país, mas na prática é uma bonança para as companh ias de seguros. Não é um plano de saúde universal pago pelo Estado, é um emaranhado de leis que ao final beneficiam as companhias de seguros. Ainda assim, deve ser um queridinho dessa oligarquia: promove os tratados de livre comércio, amplifica as guerras por drones, deporta um número recorde de indocumentados…
Pergunta > Dependendo do ganhador qual deveria ser a atitude dos anarquistas nos EUA?
Resposta < Não importa quem ganhe, o sistema seguirá em pé. A polícia continuará assassinando gente, principalmente negros e latinos, o complexo carcerário continuará encarcerando, talvez ponham mais ênfase no encarceramento de indocumentados já que vários estados votarão pela legalização da marijuana, até hoje uma das fontes que mais corpos abastecem ao complexo carcerário. O que está acontecendo na Dakota do Norte com o protesto contra o oleoduto nos dá uma mostra do que pode passar no futuro: a resposta do Estado será brutal, militarizada, com cães, gases, canhões de som e toda classe de balas. Mas o povo vencer&a acute;: sem violência mas firmes, com a participação massiva, a todos os níveis, das pessoas comuns e correntes. O ideal anarquista não se pode relegar a grupinhos com uma estética mais ou menos. Sem ofender a ninguém, creio que tem que sair desses confins e chegar ao resto das pessoas, aos trabalhadores e desempregados. Somente uma greve geral, massiva, digamos que 80% da população que se negue a trabalhar, a usar os meios de transporte estatais, a comprar, a pagar impostos ou alugueis… uma greve geral de tais dimensões, que paralise o país e a economia, uma greve geral na qual pessoas queiram comer e saqueiem os supermercados, uma greve geral onde os hospitais CUREM SUAS FERIDAS SEM COBRAR-TE, uma greve geral onde o povo invade e abre os cárceres… Isso seria um bom começo, na minha opinião.
Pergunta > Está a décadas lutando pela ideia anarquista… Que recomendarias às novas gerações e os desafios que lhe tocam enfrentar…
Resposta < O desafio mais perigoso é sem dúvida a mudança climática global. A não ser que esses poderes de quem falávamos se dignem a mudar de linha, não creio que possamos sobreviver, talvez já seja demasiado tarde para qualquer classe de mudança, não sei. O único que me ocorre é que com a devida pressão desde baixo, alguns governos possam mudar sua linha, como o recém acordado tratado em Paris. A nível local, cada região enfrenta problemas que muitas vezes acabam sendo parte do problema global. Volto ao do oleoduto na Dakota do Norte, um assunto local com consequências mais além se converte em uma causa global, ao menos creio qu e a notícia chegou a todo o mundo.
Não sou ninguém para dizer como a juventude anarquista deveria enfrentar os futuros desafios. Só posso colaborar com um pouco de filosofia destilada dos anos e as coisas que me couberam viver, e das ideias e loucuras que têm enchido este cérebro que eu mesmo cultivei. A quem interesse, pode me contatar chulocuban@gmail.com.
Fonte: http://periodicoellibertario.blogspot.com.br/2016/11/desdeabajo-no-importa-quien-gane-el.html
Tradução > Sol de Abril
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