A Audiência Nacional arquiva o processo da Operação Piñata, que tinha um saldo de quinze detenções e cinco encarceramentos. Finalmente, as teses policiais a respeito do terrorismo anarquista não encontraram sua acolhida nos tribunais
Quarta-feira, 31 de janeiro de 2018
Uma vez mais, tudo deu em nada. Quase três anos depois de se produzirem a detenção de quinze pessoas no marco da Operação Piñata (março de 2015), o Tribunal Central de Instrução n.º 6 da Audiência Nacional arquivou o processo, após a petição de arquivamento que fizemos nas defesas dos investigados e das investigadas, a qual aderiu a Promotoria.
Desta maneira, a Operação Piñata se une à Operação Pandora e à Pandora II como causas penais contra o denominado “terrorismo anarquista” (o “terrorismo anarco”, como o denominou o secretário de Estado de Segurança, Francisco Martínez, durante a manhã em que se produziram as detenções) que terminaram por encerrar-se.
Depois de realizarem-se 33 detenções no total, com entradas e registros em locais e domicílios particulares desde Palencia até Granada. Após mais de três anos de instrução, em que se analisaram centenas de documentos, horas e horas de intervenções telefônicas, se bloquearam contas bancárias solidárias, e o que é pior, depois que alguns dos detidos tenham sofrido meses de cárcere e dispersão por diferentes centros penitenciários do estado espanhol, finalmente a própria promotoria da Audiência Nacional considera que não existem elementos suficientes para poder levar a julgamento a nenhuma das processadas. Parece que a contundência dos informes policiais não puderam ser acompanhadas de indícios ou provas objetivas.
Cinco das doze pessoas que ingressaram em prisão preventiva durante uns meses o fizeram como consequência da Operação Piñata. O auto de prisão fez referência em seu dia à produção de sabotagens, a posse de explosivos e inclusive a “possíveis ilícitos penais relacionados com o tráfico de substâncias estupefacientes ou psicotrópicas”.
Apesar disso, no processo em nenhum momento os vincularam com algum ato violento, além de uma explosão no interior da Basílica do Pilar. No entanto, a Sala do Penal da Audiência Nacional, em sentença ratificada posteriormente pelo Supremo, concluiu que dita ação havia sido realizada por dois indivíduos de nacionalidade chilena que haviam atuado de maneira individual, sem coordenação alguma com as detidas das operações Pandora, Pandora II ou Piñata. Quer dizer, estas 33 pessoas, foram detidas pela comissão, pelo delito de pertencer a uma suposta organização terrorista, mas que não havia cometido nenhum tipo de atentado, senão que havia se limitado a distribuir propaganda anarquista e a publicar textos ou editar livros como o ensaio intitulado Contra a Democracia.
Ademais a própria sentença que absolvia aos dois chilenos do delito de integração em organização terrorista, assinalava em referência à presumível organização terrorista que realmente “estávamos ante uma organização a nível mundial carente de ‘organização‘ (sic), sem estrutura, sem liderança, pelo que não estamos ante uma organização criminosa, nem ante grupos criminosos aos quais se refere nosso Código Penal”, chegando a afirmar que “uma organização de estrutura horizontal não é organização” (sic).
Evidentemente, falar de terrorismo sem violência é uma extensão inaceitável do conceito, que esvazia de conteúdo outros tipos penais e não quantifica, em seu justo termo, a autêntica entidade das infrações que se dizem cometidas, nem as tipifica adequadamente. Por isso, foi um alívio, ainda que não uma surpresa, que em junho de 2016 a Audiência Nacional arquivasse o processo pela Operação Pandora II e em maio de 2017 se fizesse o mesmo com a primeira das Pandoras.
Os autos de arquivamento destas operações criticaram em seu dia que se detivessem as anarquistas sem “indícios racionais da comissão de uma ação delitiva”, nem a “comissão de ações terroristas de nenhum tipo, não constando esses supostos ataques indiscriminados nem se produziram uma situação de grave alteração”. Ambos autos concluíram que “a escassa intensidade dos fatos atribuídos pela Polícia impede falar da existência de uma organização terrorista já que não existe um grupo coordenado, hierarquizado e estruturado; nem as ações que lhes atribuem tem finalidade terrorista, senão que, normalmente, geralmente respondem a protestos concretos” e que “suas atividades eram absolutamente legais e não tinham nada que ocultar, como o demonstra o fato de que conheciam que eram objeto de investigação policial”.
Ademais da passagem pela prisão de cinco pessoas, a Operação Piñata teve outras consequências negativas para alguns dos investigados, como a publicação de seus nomes e sobrenomes na imprensa, vinculando-os com o terrorismo, o que evidentemente a longo prazo teve consequências em suas vidas pessoais.
Transcorreram mais de três anos desde que o então diretor da Polícia Nacional, Ignacio Cosidó, anunciara que “o terrorismo anarquista havia se implantado na Espanha”, sem que tal afirmação tenha encontrado finalmente acolhida nos tribunais.
O arquivamento judicial da Operação Piñata supõe o final da ofensiva mais virulenta que sofreu o anarquismo ibérico provavelmente desde o “caso Scala” (1978). Sem esquecer, isso sim, que ainda segue em instrução outra operação, denominada ICE, realizada contra o movimento anarco-vegano Straight Edge mas que por suas características e diferente fio condutor temos de situá-la fora do marco das operações aqui comentadas.
Contudo, a existência do processo judicial resultou ser, uma vez mais, a condenação. Independentemente de que se consiga, ou não, levar a julgamento aos processados neste tipo de procedimento, o que se se consegue sempre é desmantelar centros sociais, gerar inquietude e desconfiança entre os militantes, desarticular as redes de apoio e criminalizar uma ideologia que, por sua própria essência, está contra o Estado como instituição, e precisamente por isso sempre, como dizia Shlomo Vlascov, vai ser um coringa que vai encaixar para o sistema no caso de que se queira encontrar culpados de algo, e é possível que volte a necessitá-lo mais cedo ou mais tarde.
Por sorte, as investigadas estiveram acompanhadas durante todo este tempo por quem lhes tem ajudado a seguir adiante. E agora chega o momento de escutar a estas pessoas. Hoje, a conta de Twitter da campanha Colze a Colze anunciou que em uns dias publicarão um comunicado com suas avaliações. Estaremos atentos a sua web.
Fonte: https://www.elsaltodiario.com/conquista-derecho/carpetazo-judicial-operacion-pinata
Tradução > Sol de Abril
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