COMPLETAM 40 ANOS DE CANÇÕES DE FOGO, O DISCO QUE IMPRIMIU AO FOLK UMA LÍNGUA LÉSBICA E INCENDIÁRIA
O som de Safo
O aniversário número 40 de seu disco Canções de fogo é uma oportunidade ideal para recuperar o som e o pensamento ardente de Kathy Fire, pioneira em conjugar ativismo anarquista, gordo e lésbico.
por Nicolás Cuello | 12/10/2018
Poucos teriam imaginado que aquela pequena menina gorda que colhia sorrisos de fim de semana por sua astúcia musical em diversos coros de igrejas de bairros na Filadélfia dos anos 60 alguns anos depois se converteria em uma das vozes mais rebeldes da música folk independente. Mas sim, aquele foi o cenário no qual tomará forma a paixão incendiária que acompanharia a adrenalínica vida de Kathy Fire, uma autoproclamada ativista lésbica, anarquista e gorda, cujas canções abriram um espaço a força no imaginário sensível da música de protesto de uma geração que buscou transformar tudo.
Apesar de uma complexa quantidade de projetos vinculados à música, que incluem sua passagem pelas pequenas igrejas de sua Delaware Valley natal, tanto como seus concertos em festividades locais ou bares precários repletos de gogo dancers mal pagas, Kathy Fire sempre preferiu ser reconhecida por sua atividade como uma militante organizada. Se envolveu desde tenra idade em grupos de mulheres scouts; uma vez que tomou contato com a consciência feminista em ebulição durante aquelas décadas foi impulsionadora da primeira sede em toda New Jersey da Organização Nacional de Mulheres; a partir de algumas discrepâncias com os cercos heterossexualizantes da política majoritária daquele movimento se converteu na criadora do grupo de ação direta lésbica Dyketactics!; e nem bem desembarcou em Los Angeles, após ser perseguida politicamente, se uniu ao primeiro espaço de caráter lésbico feminista que problematizou criticamente a opressão em torno da gordura, o Fat Underground.
Isso foram os anos 70 para Fire, um curso interminável de experiências políticas que a viram como protagonista de sentadas públicas pela liberação de presas políticas, de enfrentamentos diretos com a polícia contra a brutalidade racial, participando em filmes experimentais de consciência feminista e em ações de difusão pública contra a opressão corporal. Mas uma vez hostilizada pela pressão contínua que significava o enfrentamento explícito com o poder, decidiu empreender uma viagem com sua parceira Barbara Ruth, poeta com quem improvisaria uma turnê com o projeto Mother Rage, um espetáculo de poesia performática que intercalava algumas canções solistas de Ruth.
Assim foi tomando forma a necessidade de editar o vinil Songs of Fire. Songs of a Lesbian Anarchist (Canções de uma lésbica anarquista) editado por Folkways Records no ano de 1978, que compila todo seu trabalho como compositora durante sua turnê pelos Estados Unidos. Trata-se de nove canções cujas letras retratam de maneira biográfica sua experiência como uma mulher, como lésbica e como gorda, mas longe da representação debilitante da ferida, mas ao contrário, propondo-se como uma barricada low fi, que faz da crua fortaleza política de uma voz indômita, titubeante, ágria e eloquente, um chamado à organização prazerosa.
Hoje, quarenta anos depois, este disco se converteu não só em uma peça fundamental das canções de protesto, que logrou modular uma língua rebelde até o momento desconhecida para a música folk, mas também como a prova viva do lugar privilegiado que as sensibilidades minoritárias ocupam na escrita coletiva de nossa interminável história de resistência. Essa que assim como Kathy Fire em sua canção “City of Fire” nos pergunta: “Vais te deixar esfriar pela prisão que te distancia da verdadeira mudança e da vida? Vais te deixar levar pelo fluxo aquoso do normal sem desafiar nada do que te rodeia? Ou deixarás que as chamas da verdade e da justiça se acendam em ti fazendo com que a raiva se converta em uma força liberadora no mundo? Vais ser gelo, água ou fogo?”.
Fonte: https://www.pagina12.com.ar/147671-el-sonido-de-safo
Tradução > Sol de Abril
agência de notícias anarquistas-ana
é quase noitinha
o céu entorna no poente
um copo de vinho
Humberto del Maestro
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!