por Vantiê Clínio Carvalho de Oliveira | 21/10/2018
É exatamente a experiência “de exceção” (pois foi a primeira e única) da Espanha que demonstrou claramente para a história dos anarquismos o quanto é um equívoco estratégico ceder à falácia do sufrágio universal burguês, mesmo que apenas por uma questão meramente conjuntural: foi exatamente a “frente ampla progressista” do governo republicano eleito pelo voto anarcossindicalista que favoreceu o avanço do fascismo, primeiro se negando a liberar armas para a/os trabalhadora/es antifascistas e depois orquestrando junto com os “comunistas” a grande traição ao campo revolucionário autogestionário pois, segundo a/os própria/os integrantes do governo republicano chegaram a declarar publicamente, para ela/es era preferível a “ordem fascista” do que a “subversão anarquista”.
Sobre todo este processo há um ótimo documentário disponível no youtube intitulado “Vivir La Utopia“.
“Anarquista” que toma o equívoco cometido na Espanha pela CNT naquele momento histórico (ao apoiar um governo dito “progressista” por questões “conjunturais”) como um “dogma” a ser seguido pelo campo libertário – ou seja, que vê aquela experiência como uma “fórmula” a ser seguida, do tipo: “sempre que os fascismos forem mobilizados pela burguesia para dividir o povo e assim enfraquecer seu potencial revolucionário, a/os anarquistas devem apoiar governos ditos ‘progressistas'” – não enxerga que aquele evento foi a experiência decisiva que demonstrou cabalmente ao campo libertário que a/os projetos de sociedade do campo político hierarquizante em geral (sejam de direita, centro, esquerda ou traseira) têm mais afinidades entre si do que com o projeto social autogestionário (como se não bastasse todas as traições históricas anteriores da/os dita/os governos “revolucionários populares” contra o campo revolucionário popular autogestionário) e, por isto, está fadada/o a (a/os dita/os “anarquistas” que tomam aquela experiência de exceção da CNT espanhola como uma “fórmula dogmática” a ser seguida em certos momentos conjunturais específicos) repetir os mesmos erros que levaram a quase totalidade das experiências históricas revolucionárias libertárias a sofrerem seus reveses decisivos (por darem suporte a adversários do projeto político libertário, sob o raciocínio equivocado de que tratava-se ali de um “mal menor” diante do fascismo “declarado” – sim, pois, mesmo não sendo “declarado”, os demais projetos políticos hierarquizantes também são variações de fascismo, entendido aqui como sendo a imposição de cadeias de mando/obediência da parte dos “de cima” sobre “a/os de baixo”).
E talvez até – esta/es “anarquistas” que não aprendem com a lição definitiva desta experiência de exceção -, estarão fadada/os também a, em algum possível momento futuro, se verem na mesma situação do pequeno grupo de membra/os da CNT que acabaram entrando para o governo republicano durante a guerra civil e que num determinado momento se viram fazendo parte de um órgão que tramou e executou uma escandalosa traição contra aquela que foi a maior experiência revolucionária autogestionaria da história.
Sim, a experiência de exceção da CNT durante aquele período é realmente um grande balizamento histórico para o amadurecimento estratégico do campo libertário, mas a lição inequívoca que ela nos trouxe não é uma pretensa fórmula segundo a qual “em tempos de mobilização fratricida do fascismo que visa enfraquecer um potencial avanço do campo revolucionário a/os anarquistas devem se aliar a/os autoritária/os autodenominada/os progressistas”, mas sim (a lição inequívoca desta experiência é) a certeza tantas vezes demonstrada por todas as experiências revolucionárias libertárias históricas de que quem quer a autoridade piramidal, e não a liberdade, será sempre um ‘aliado natural’ da hierarquia – leia-se: do militarismo, do elitismo, da estrutura de dominação de classe (mesmo que seja de uma classe “gerencial” sobre outra “gerenciada”) – e portanto (quem quer a autoridade piramidal), será sempre um ‘inimigo natural e contumaz’ do projeto libertário.
Experiências devem servir para ampliar o acúmulo de aprendizado histórico, e não para serem erigidas em uma espécie de “sintoma neurótico” pelo qual se permanece presa/o indefinidamente à repetição de determinados esquemas de resposta inadequados.
E, diante da história secular dos anarquismos, não aprendermos com todo esse acúmulo de experiência, mais do que favorecer “neuroses organizativas de repetição”, é sintoma de limitação intelectual.
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