Nossa fúria não está fadada a morrer em buscas vãs, mesmo que façam tudo para que isso aconteça. Vamos cultivar a nossa fúria, adicionar sua força e atacar.
Nos vinte anos anteriores à pandemia de coronavírus, os ultra-liberais da direita e da esquerda que subiram ao poder destruíram sistematicamente o hospital público, fechando dezenas de milhares de leitos, serviços de reanimação e de UTI, mesmo que todos os relatórios sobre risco pandêmico recomendassem o contrário [1]: leitos, respiradores, máscaras, profissionais qualificados e formados… Os ultra-liberais agiram com pleno conhecimento das consequências de suas decisões: milhares de mortes que seriam facilmente evitáveis… Em Grand Est, uma das regiões mais afetadas pela Covid-19, foi onde houve o maior número de fechamento de leitos e serviços de reanimação durante esses anos [2]. Na França, foram 100.000 leitos fechados em 20 anos…
Nesses anos, a pesquisa e a universidade foram atacadas por reformas neoliberais que tiveram um sério impacto nos estudos sobre os coronavírus, fazendo atrasar anos de pesquisa dessa família de vírus… [3]. Mais uma vez, mais mortes…
Esses criminosos liberais da direita e da esquerda também não consideraram útil renovar o estoque necessário de máscaras FFP2, ao mesmo tempo em que aumentavam o orçamento do exército e da defesa… Nós sabemos qual foi a consequência: milhares de contaminações que poderiam ter sido facilmente evitadas, e, como também dezenas de mortes…
Mesmo entre dezembro de 2019 e março de 2020, quando a ameaça da pandemia se tornou mais clara e eles foram informados [4], o governo Macron não fez nada para adquirir máscaras, respiradores e leitos, nem o recrutamento de profissionais de saúde para evitar a triagem de pacientes em reanimação, o que ainda poderia ter evitado muitas mortes…
Quando a pandemia começou a se espalhar, o governo, muito ocupado destruindo a [reforma] da aposentadoria dos trabalhadores, não achou oportuno tomar ações rápidas, manteve eleições e reuniões perigosas, até pedindo para que as pessoas se reunissem em pleno crescimento da epidemia [5]…
Quando a pandemia começou a se espalhar, o governo e seu “conselho científico” de fantoches e servos argumentaram que as máscaras eram inúteis ou até perigosas e desaconselhavam o uso delas pela população, contra a recomendação da esmagadora maioria de organismos científicos internacionais… isso porque eles ainda não tinham feito um estoque, mentindo deliberadamente, preferindo pôr em perigo a população do que admitir sua total ineficiência na aquisição preventiva de máscaras…
O governo não fez nada para multiplicar o rastreamento e acompanhamento dos casos da Covid-19 e de seus contatos no início da epidemia, em um momento em que seria necessário poucas ações para prevenir ou retardar significativamente a disseminação, apesar de todas as recomendações urgentes da OMS… Até o momento, em pleno “desconfinamento” autoritário, ainda não existe uma política sistemática de acompanhamento, que permitiu a muitos países reduzir drasticamente a contaminação… Novamente muitas outras mortes evitáveis…
Quando o governo finalmente decidiu agir, foi instituído um confinamento autoritário, confinando os doentes com suas famílias, o que favoreceu a continuação do contágio, em vez de colocar em quarentena com base em testes para rastrear os infectados e seus contatos. O governo mandou a polícia para as ruas, distribuindo as multas sobretudo na periferia de Paris, no 93, policiais que fiscalizavam sem máscara milhares de pessoas cujas vidas estavam em perigo. Com a duração do confinamento, 10 pessoas morreram como resultado de ações policiais [6], perpetuando a eliminação social republicana de pessoas negras: todas as vítimas vieram de bairros da classe trabalhadora e de populações sistematicamente discriminadas; sem contar os vários feridos graves pela polícia, violência gratuita e insultos racistas…
Quando o pico da epidemia se aproximou, diante da saturação dos serviços de reanimação, o governo divulgou guias através dos ARS, de “sociedades instruídas” e “recomendações éticas” para classificar aqueles que iriam viver e aqueles que iriam morrer, com bases eugenistas, interesses específicos e discriminatórios em relação a idosos e deficientes, sistematicamente privados do direito à reanimação. O governo incentivou a prestação de cuidados paliativos sem hospitalização em casa ou em lares de idosos para milhares de pessoas resgatadas, enquanto recusava testes post-morte que poderiam ter permitido aos familiares das vítimas processar e obter indenização…
As empresas privadas de Ehpad que obtêm lucros milagrosos nas costas dos idosos não têm nada para lidar com a pandemia, deixando a equipe e os moradores sem proteção, sem fazer testes com os residentes e cuidadores, administrando o crescimento das mortes com muita falta de transparência…
Os membros do governo e parte do “conselho científico” sempre acreditaram que a “solução” da crise viria da crença criminal de imunidade coletiva, mesmo sabendo que era loucura, supostamente esperando centenas de milhares de mortes, por um resultado puramente hipotético [7]. Nesta perspectiva, não era realmente necessário lutar contra a propagação da epidemia, mas, pelo contrário, favorecê-la… dezenas de mortes por causa dessa crença em uma teoria abertamente eugenista por meio de escolhas políticas…
O governo se recusou, assim, a suspender todas as atividades não essenciais, favorecendo a continuação de contaminações facilmente evitáveis, novamente com uma escolha puramente capitalista. Não fechou o transporte público nem tornou obrigatório o uso de máscara, causando novas contaminações e, novamente, muitas mortes… Por outro lado, em seu comando autoritário, proibiu caminhadas nas florestas, montanha ou beira-mar, conforme autorizado por vários países que não confinaram toda a população e reduziram drasticamente as contaminações com sucesso.
O confinamento autoritário atingiu com força total as populações mais precárias: não há medidas para abrigar os sem-teto, confinados nas ruas; uma obstinação em prender migrantes sem documentos em centros de detenção administrativa, superlotação das prisões, fechamento do acesso público à água e aos banheiros para as pessoas deixadas nas ruas, estigmatização dos bairros da classe trabalhadora.
Além disso, todas as medidas destrutivas dos direitos trabalhistas, prolongamento do horário de trabalho, violação de feriados remunerados, propostas ofensivas de pedir aos trabalhadores que cedam seus direitos de férias aos profissionais de saúde, primeiros anúncios de demissões, manutenção do pagamento de dividendos aos acionistas, “presentes” aos empregadores aumentando o déficit da previdência social, todas as medidas tirando proveito de uma pandemia para atacar os trabalhadores…
Contra a recomendação do seu próprio conselho científico, e com o único objetivo de liberar os pais de suas obrigações familiares para enviá-los de volta ao trabalho para a recuperação dos lucros do capital, o governo ordenou a reabertura de escolas, enquanto todos os países que foram severamente afetados pela pandemia adiaram qualquer retorno até setembro. Mais uma vez, as contaminações levarão a mortes evitáveis, para grande satisfação do ministro da Educação social-darwinista, Blanquer, que apoia a “imunidade da maioria”…
Por outro lado, a pandemia foi a ocasião de uma aceleração da ordem totalitária em direção a um Estado policial completo: implantação de drones policiais, projeto de rastreamento de populações, controle policial da expressão pública e lei de censura policial “Avia”, aumento mortal da população negra, distribuição de multas nas periferias por meio do sistema de vídeo-vigilância, poderes policiais concedidos a guardas e milícias privadas, extensão de detenção preventiva, detecção automática do uso de máscaras no metrô via câmeras “inteligentes”, aceleração do estabelecimento do “Health Data Hub” e divulgação de nossos dados de saúde [8], proibição de manifestações ao ar livre mesmo durante o “desconfinamento”, enquanto permite aglomeração viral de trabalhadores no metrô…
Desconfinamento somente para as “necessidades” do capital, proibindo testagem nas empresas, sem máscaras de FFP2 para toda a população, reabrindo atividades não essenciais, reabrindo escolas e transportes públicos, mesmo que o número diário de mortes permanecendo alto, o governo criou todas as condições favoráveis a uma segunda onda epidêmica, a uma nova saturação dos serviços de reanimação e a uma nova triagem dos pacientes, e a novas mortes em massa…
Não apenas devemos nos livrar desse governo criminoso e fascista o mais rápido possível, mas, ao mesmo tempo, destruir permanentemente o capitalismo que destrói nossas vidas e cria as condições para a reprodução de epidemias, destruindo o planeta e a biodiversidade. E reconstruir toda a sociedade com base na autodeterminação total, na solidariedade e na emancipação geral.
Leia o manifesto: https://paris-luttes.info/covid-19-non-au-darwinisme-social-13890
Assine a petição: https://www.change.org/p/non-au-darwinisme-social-et-au-tri-eug%C3%A9nique-par-manque-de-lits-et-de-respirateurs
Notas
[1] https://www.facebook.com/groups/591274398144542/permalink/602371263701522/ et https://www.facebook.com/groups/591274398144542/permalink/598003234138325/
[5] https://www.youtube.com/watch?v=9fB35Do68eM... Cette lenteur insupportable a tué, par dizaines
[7] https://www.monde-diplomatique.fr/2020/04/BOURGERON/61622
Fonte: https://paris-luttes.info/la-somme-de-nos-coleres-construire-14027?lang=fr
Tradução > Estrela
agência de notícias anarquistas-ana
Nuvens,
sem raízes
até que chova.
Werner Lambersy
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!