A fotógrafa de origem polaca deixou um valioso testemunho gráfico da contenda espanhola, resgatado agora em Amsterdam pela historiadora Almudena Rubio
Por Isabel Ferrer | 06/06/2020
Os arquivos clássicos são como cofres do tesouro ao contrário: humildes por fora, seus segredos nem sempre saltam à vista ao abri-los. Há que saber olhar, porque só assim aparecem jóias, como os negativos das imagens captadas por Margaret Michaelis (Czechowice-Dziedzice, 1902 – Melbourne, 1985), fotógrafa de origem polaca que documentou a revolução social promovida pelo anarquismo durante a Guerra Civil espanhola, para a Confederação Nacional do Trabalho, e a Federação Anarquista Ibérica, a CNT-FAI. Imigrante judia que fugiu dos nazis, o coração de seu trabalho, isto é, o filme utilizado em sua câmara, não se perdeu. Se encontrava junto ao resto do material dos anarquistas que, armazenado nas denominadas Caixas de Amsterdam, chegou nos anos quarenta ao International Institute of Social History (IISH) da cidade. O legado de Michaelis começa a ressurgir graças ao trabalho da historiadora espanhola de arte Almudena Rubio.
Até agora, se conheciam as fotografias da guerra tomadas por Michaelis para o Comissariat de Propaganda da Generalitat, depositadas no Arxiu Nacional da Catalunha, as do Arxiu Fotogràfic de Barcelona, e as cópias da contenda, cedidas por ela, junto com o resto de seus documentos, à National Gallery da Austrália. “Em Amsterdam, no entanto, nos encontramos com o que provavelmente seja seu maior acervo fotográfico procedente da Guerra Civil anotado até a data: centenas de negativos de 35 milímetros feitos com uma Leica, entre os quais figuram algumas tomadas já resenhadas, como a chegada da Cruz Vermelha a Portbou (França), ou suas viagens a Aragão e Valência em outubro de 1936”, explica Rubio, responsável por sua vez do achado dos 514 negativos da fotógrafa húngara Kati Horna, incluídos nas mesmas caixas.
Horna e Michaelis foram duas mulheres contemporâneas que puseram suas câmaras a serviço dos anarquistas, e suas fotografias, em certo modo complementares, são um testemunho gráfico essencial da retaguarda revolucionária dos primeiros anos da guerra. Margaret se casou em 1933 com Rudolf Michaelis, um anarcossindicalista germano e arqueólogo de profissão, e ambos foram presos em Berlim pelos nazis.
Alemães antifascistas
Uma vez liberados, o primeiro que fizeram foi emigrar a Barcelona, onde estava assentado um grupo de alemães antifascistas com os quais se puseram em contato, e que logo formariam o Grupo DAS, a seção de exilados germanos do anarquismo espanhol. Ela trabalhou para GATCPAC, o afastado catalão do grupo de arquitetos de vanguarda, e tinha certa vantagem porque já conhecia a cidade. Fez uma visita fugaz em 1932, e pode captar o Bairro Chinês e a seus moradores, que desconfiaram porque pensaram que talvez se tratasse de um trabalho policial. E em 1935 viajou a Andaluzia com o pintor Joan Miró, e o arquiteto Josep Lluís Sert.
Margaret e Rudolf Michaelis frequentavam os círculos anarquistas, e ainda que o matrimônio se desfez em 1934, ela conservou o sobrenome e lhe pôs o nome de Foto-Elis a seu novo estúdio em Barcelona. Durante a Guerra Civil, Rudolf foi delegado político do Grupo Internacional na Coluna Durruti, e a fotógrafa trabalhou para a seção gráfica dos Escritórios de Propaganda Exterior da CNT-FAI. “A partir de então, suas fotografias nos falam do que ocorria na retaguarda. Mostram a destruição do monumento de Antonio López na cidade, ou a agitação da venda ambulante, mas também o processo de coletivização vivido nas fábricas e o transporte catalão, protagonizado pela classe obreira nesse afã por construir uma nova sociedade”, segue a experta.
Michaelis gozava da confiança da CNT, e as viagens que faz em 1936 pelas zonas coletivizadas de Aragão e Valência com a anarquista e escritora russa Emma Goldman, serão o documento gráfico da classe obreira à frente de seu destino. “Publicadas algumas na imprensa anarquista, as fotos parecem ter sido tomadas com rapidez, com menos cuidado formal na composição que as de antes da guerra. Mas é só porque, em meio de uma nova realidade, tem outra força e outra urgência”, pondera Rubio.
Em 1937 chega a Barcelona Kati Horna, convidada pela CNT-FAI, e isso supôs uma série de mudanças na Seção Gráfica que, segundo a historiadora, pode afetar a relação de Margaret com os anarquistas. Horna passou a converter-se na fotógrafa oficial, com um salário semanal, e a criação da Spanish Photo Agency (Photo SPA), a agência dos anarquistas, derivou na gestão comercial das fotos.
Placas armazenadas
Tanto esta parte da obra de Horna como as fotos de Michaelis, se encontravam, junto ao resto dos celuloides dos anarquistas, no arquivo dos mencionados Escritórios de Propaganda Exterior da CNT-FAI. O compõem mais de 5.000 negativos, ao redor de 2.300 fotografias e 270 placas fotográficas, que a experta gestiona e investiga desde 2015 no seio do IISH. E diz: “Consultando os inventários originais da CNT-FAI, elaborados em abril de 1939, em Paris, observei que haviam sido registradas centenas de placas de cristal fotográficas. Mas, onde estavam ditas placas? As achei armazenadas em duas caixas, com o resto de material ainda por inspecionar em uma das salas do IISH, e por fim fazem parte do arquivo da CNT-FAI”.
Margaret Michaelis abandonará Espanha até finais de 1937, e passa por França, Polônia e Londres antes de ir para a Austrália. Ali trabalha primeiro no serviço doméstico até que conseguiu abrir um novo estúdio.
Quarenta e cinco reproduções de imagens do arquivo fotográfico da CNT-FAI, depositado em Amsterdam, entre elas duas de Michaelis, podem se ver hoje na mostra aberta no Arxiu Fotogràfic de Barcelona. O IISH prepara, por sua parte, uma exposição itinerante centrada no legado até agora inédito de Horna e Michaelis, que espera poder apresentar nos museus espanhóis com o respaldo da Fundação Anselmo Lorenzo (FAL), proprietários do arquivo.
Fonte: https://elpais.com/cultura/2020-06-06/la-guerra-civil-de-margaret-michaelis.html?ssm=TW_CC
Tradução > Sol de Abril
agência de notícias anarquistas-ana
Apenas um pássaro
Companheiro do caminho
Pelo campo seco.
Senna
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!