A sociedade bielorrussa constrói músculos

Milhares de bielorrussos protestaram após as autoridades impedirem vários políticos de concorrer à presidência. Vídeos e fotos na internet mostram dezenas de casos nos quais os manifestantes atacam a OMON e libertam seus camaradas anteriormente detidos. A “valente” tropa de choque da OMON não via uma atitude assim das pessoas há muito tempo. Isso pode explicar a coragem deles quando eles invadiram uma multidão de manifestantes em um pequeno grupo e ficaram pasmos devido à pressão recebida. Foi assim que os policiais foram vistos pela última vez nos anos 90. Aqueles que serviram estão agora aposentados ou trabalhando em escritórios. Os homens jovens e atrevidos da OMON, que vivem sobre os ombros da população trabalhadora, até recentemente, sentiam-se poderosos no país.

Alguns dias atrás, eu li outra notícia em apoio ao mito de um bielorrusso “pacífico”. Que sempre é razoável e calmo, e em alguns lugares até covarde. Esse mito não é espalhado apenas pelas autoridades, que têm interesses na cultura de bielorrussos “pacíficos”, mas também por seus oponentes. Surpreendentemente, nos últimos 20 anos, a oposição esteve obcecada por protestos pacíficos, e o método mais radical de combater a ditadura ainda é a lendária “Square”. Contrariando todas as expectativas, a ditadura sobreviveu a 2006 e 2010, e em 2015 tudo foi relativamente pacífico sob o tácito slogan “no war” (“sem guerra) (sic!).

A ausência de líderes nas ruas pode desempenhar um papel positivo nessa situação. Não há mais políticos pedindo por protestos pacíficos e por diálogos com as autoridades. O desembarque dos candidatos, lucrativo à primeira vista, acabou sendo um erro para Lukashenko – ele não tem parceiros para um diálogo, e não são os políticos que estão contra ele, mas a auto-organização do povo que não pode e não planeja um diálogo com “Batka” (apelido de Lukashenko, que significa “pai”).

A sociedade bielorrussa, como qualquer outra sociedade, é capaz de mudar apenas quando tem confiança em suas próprias forças. Por isso, regimes autoritários tentam destruir as conexões sociais da sociedade e portanto, impedir transformações radicais. Na Bielorrússia, esse processo continuou por toda a existência da ditadura. Uma breve pausa após a União Soviética conseguiu fornecer energia suficiente para os protestos e revoltas nos anos 90, mas desde então entrou em declínio. Os grandes protestos espontâneos pós-eleição em 2010 foram principalmente contra os problemas econômicos e levaram ao primeiro recuo da ditadura bielorrussa de seus próprios planos em 2017. Vamos deixar para trás o fato de que a lei sobre “parasitas sociais” foi assinada, mas o próprio fato do recuo de Lukashenko merece respeito.

É difícil dizer o que serviu como principal catalisador para os protestos no país hoje. É claro que o fracasso absoluto das autoridades no combate contra o coronavírus e os problemas econômicos dos últimos meses (que vão apenas aumentar) desempenharam seus papéis. A crise política com a Rússia também teve um impacto negativo na estabilidade do regime.

Nesse sentido, o enfraquecimento da posição do Estado pode se tornar um dos catalisadores para a formação de um poder social. O povo está começando a acreditar, não apenas em sua própria força, mas também no sucesso da ação coletiva, que é um dos fatores chaves na transformação radical. O sucesso nos confrontos com a OMON demonstra que o Estado não é protegido por super-heróis, que podem dividir você ao meio quando quiserem. Este Estado é protegido por pessoas como você e eu, que tem medo e desejo de preservar sua própria saúde. Cada vídeo e foto de um homem arrancado das mãos das autoridades é um símbolo do poder do povo bielorrusso na luta contra a ditadura de Lukashenko.

Fonte: https://pramen.io/en/2020/07/belarusian-society-builds-muscles-comments-on-the-protests-14-july/

Tradução > Brulego

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