[França] O dilema: o dinheiro ou a vida

Quando neste começo do mês de agosto vemos como os focos ativos, da COVID-19, voltam a fazer estragos em quase todos os continentes, e quando os contágios confirmados no mundo são já mais de 18 milhões e as mortes mais de 700.000, como não inquietar-se pela ineficácia das estratégias utilizadas para fazer frente a esta pandemia? Pois, ainda que alguma tenha sido finalmente mais ou menos eficaz no plano sanitário local/nacional, todas fracassaram no plano internacional, além de provocar uma crise econômica e social, a mais devastadora dos últimos 100 anos.

Desde o princípio foi evidente que se sabia muito pouco do coronavírus e da enfermidade que ele provocava. Mas, o que sim, se soube e se pode ver muito rapidamente, foi sua potencialidade expansiva nas sociedades do mundo globalizado. Pelo que o enfoque correto, nesses momentos, era assumir o risco do pior e atuar logo: tanto para conseguir uma detecção precoce do sistema de contato, através do rastreio, como para poder controlar – nacional e mundialmente – aos “supertransmissores” e as situações e eventos públicos mais propícios para a “supertransmissão”.

Após o ocorrido nestes cinco meses de pandemia, é obrigado constatar o errático proceder das autoridades para assumir este enfoque, como também suas vacilações e demoras em fechar os lugares onde se produz mais facilmente a transmissão, que é a medida mais eficaz até ter o vírus controlado ou dispor de uma vacina…

No entanto, não é este o enfoque adotado pelos governos, pois até o chinês tardou em assumir o risco do pior e decidir-se a atuar em consequência para cortar a transmissão do vírus.

A verdade é que, salvo em Taiwán, essa foi a tônica geral dos governos frente a uma ameaça que era cada dia mais real e mundial, e mais difícil de evitar. Uma inconsciência paradóxica e muito significativa do modo de funcionar do mundo globalizado. E não pela inépcia deste ou daquele chefe de Estado, pois a realidade é que todos os governos, fossem ou não tão negacionistas como os dirigidos por Donald Trump, Boris Johnson ou Bolsonaro, atuaram fora do momento adequado e sem nenhum consenso supranacional. Não só por razões ideológicas – a primazia da atividade econômica acima de outra consideração – mas também pelo modo de funcionar dos governos no mundo de hoje, ao ser sua principal preocupação e ocupação a gestão do dia a dia com vistas à próxima eleição.

Em tais condições, como esperar destes aparatos burocráticos uma resposta lúcida e racional a uma pandemia, de uma magnitude nunca vista, como a que estamos padecendo? E mais sabendo que sua responsabilidade é muito concreta, dada sua dependência – com os outros poderes – no marco institucional, e que sua missão, trate-se de governos competentes ou incompetentes, mais ou menos progressistas, é manter o atual sistema de convivência baseado na competição e na acumulação do capital. Um sistema que mantêm permanentemente as pessoas ante o dilema do dinheiro ou a vida.

Como, pois, esperar outro comportamento, dos Governos e dos poderes fáticos, para enfrentar o dilema no qual nos meteram com sua irresponsável e lamentável gestão da pandemia e a precipitada volta à normalidade, apesar de o vírus continuar circulando pelo mundo? E mais agora, quando essa volta à normalidade não para de provocar novos surtos por todo o planeta, mergulhando a humanidade em uma ansiedade paralisante, mais e mais tanatofóbica, frente à incerteza de seu futuro.

É óbvio pois que em tais circunstâncias não nos resta alternativa, às simples pessoas, que a de decidir o prioritário nesse dilema, pois, mais do que nunca, disso depende o que será nosso porvir e o das gerações que vão nos suceder.

Assim pois, o dinheiro ou a vida? Ou seja, seguir como até agora dando prioridade ao dinheiro, apesar da sinistra realidade do presente e do apocalíptico futuro que isso implica, ou priorizar a vida para que o dinheiro não acabe com ela.

Assim claramente é a opção: ou nos resignarmos a seguir vivendo na atual ansiedade tanatofóbica do império do dinheiro ou resistir e lutar para preservar a vida e a humanidade de um final tão inconsciente e indigno da condição humana.

De nós depende que o mundo de amanhã seja uma cópia – ainda mais trágica e funesta – do presente ou o começo desse outro mundo possível pelo qual a parte mais consciente e solidária da humanidade leva tantos anos lutando.

Octavio Alberola

Tradução > Sol de Abril

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