Uma pressão exorbitante foi posta sobre o anarquismo nas eleições de 2018, no Brasil, e possivelmente será posta nas eleições de 2022. O país já vivenciou diversos modos do governo se colocar diante de seu povo: ditaduras, governos militares e regimes democráticos, mas esta experiência que estamos vivendo com o governo Bolsonaro, o fascismo, conhecíamos somente através dos livros, no Brasil, com o Integralismo e o Estado Novo de 1937. A crítica mais ferrenha é aquela que nos responsabiliza, junto aos bolsonaristas, por levar Bolsonaro ao poder.
Bolsonaro, o clã Bolsonaro, e seus seguidores são realidades que não se limitam à democracia representativa, não são – como todo fascismo – passíveis de conversação e negociação, cedo ou tarde, a sociedade irá perceber a ignorância e o perigo que alimentam estes grupos, e irá decidir o destino do qual são merecedores.
Do ponto de vista mais próximo, a eleição propriamente dita, a lição que ela nos dá, “repisa” sempre as mesmas coisas: 1º) aquela que o repulsivo Hitler nos deixou, é possível chegarmos ao fascismo pela via do voto, na democracia; 2º) não há, depois da desaparição da União Soviética e do socialismo autoritário, uma oposição entre democracia e capitalismo; a democracia é mais uma forma de governar o capitalismo, como as ditaduras, formas equivalentes se, economicamente, produzem o lucro; 3º) entramos em uma nova fase de organização política do capitalismo, o Lawfare onde os dispositivos jurídicos entram em conluio com dispositivos midiáticos e parlamento para governar seja por meios democráticos, seja por meios golpistas.
De um ponto de vista mais longínquo, do olhar e da utopia anarquista, desde a desilusão de Proudhon com o Parlamento e após as revoluções de 1848, o anarquismo busca um outro tipo de democracia. O anarquista repudia a democracia representativa – baseada no voto – e defende, em seus escritos e em suas ações, a “democracia direta”, experiência permanente de autogoverno da sociedade, sem a necessidade histórica da existência do Estado.
Assim, pedir para que um anarquista vote, é como pedir que nos esqueçamos a ideia anarquista de “democracia direta”, e assumamos uma democracia duvidosa, a democracia representativa – que só é festejada no dia da eleição, e nos dias posteriores, passe a ser alvo – com razão – da indignação e do sentimento de traição, por parte dos eleitores.
Pedir ao anarquista que vote é desrespeitar um dos princípios fundamentais de sua existência, o primeiro passo – o voto nulo – de sua Revolução Política.
A “democracia” que o anarquista vislumbra não tem compromisso algum com as “democracias representativas”, construídas com eleições normais ou fraudulentas; não nos peça que votemos; peça-nos outra coisa! Melhor, não peça, junte-se ao NÓS enquanto coletivo humano. Demonstre que a solidariedade na ação direta é possível entre trabalhadores, homens e mulheres, lgbtq para pôr fim ao capitalismo e construir esta sociedade inteiramente nova, baseada na autogestão e na democracia direta. Na Comuna de Paris de 1871, na Guerra Civil Espanhola da década de 1930 com os anarquistas, a utopia mostrou-se possível. Não tema, não se culpabilize!
Sempre: Vote Nulo!
Edivaldo Vieira da Silva
Prof. Doutor em Ciências Sociais pela PUC/SP
09/11/2020
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Esqueletos de árvores,
lampiões rodando no vento,
no chão, sombras, bêbadas.
Alexei Bueno
Só discordo de uma coisa: o anarquismo não se trata de “democracia direta”, isto é mais uma ‘parasitagem semântica’ das visões políticas hierarquizantes (acadêmicas, em especial) sobre o ideário acrata. Toda ‘democracia’ é a ditadura da maioria sobre a minoria e, em oposição a isso, o q o pensamento libertário propõe é a auto gestão, o q significa o consenso em primeiro lugar, e não a votação..
Precisamos ser mais espertos e sacar mais agilmente as estratégias de manipulação do sistema para tornar inócuas as potências radicalmente transformadoras do anarquismo..
Aliás, não deve ser mera coincidência o fato d q já está em andamento um processo d transição das ‘democracias’ representativas burguesas para ‘novas’ democracias diretas fundadas em recursos informacionais (sistemas de votação universal instalados em apps de celulares – o Brasil, inclusive, está sendo palco d uma experiência piloto disto, em micro escala, durante estas eleições municipais)..