[Espanha] Expropriadores anarquistas: “Los Solidarios” da Transição

No 84º aniversário da morte de Buenaventura Durruti repassamos a trajetória dos libertários que se dedicaram nos anos 70 e 80 ao assalto de bancos para financiar o movimento.

Por Héctor González | 20/11/2020

Não foram muitos mas se fizeram sentir. Durante a Transição diversos grupos de militantes da esquerda radical recorreram à expropriação (assaltos) para financiar organizações e lutas obreiras. Dentre todos eles seriam os anarquistas que jogariam um papel mais destacado. E é que este tipo de ações se inseriam dentro de uma tradição ilegalista que durante este período se reivindicava como continuadora da onda de grupos como Los Solidarios e de militantes como García Oliver ou os malogrados Ascaso, Escartín ou Durruti.

A situação sociopolítica o requeria e quase o justificava: com a morte de Franco se abria um período incerto que ia desembocar na democracia, devia fazê-lo mediante a ruptura e podia concluir com uma revolução. As greves, não poucas delas selvagens, se estendiam por todo o país e o anarquismo, que ressurgia qual Ave Fênix em fábricas e bairros, necessitava uns fundos dos quais carecia para animar greves, editar propaganda e financiar suas iniciativas.

Enquanto a maioria se ocupava de estruturar suas organizações para dotá-las de rendas regulares e legais, uma pequena parte punha seus olhos nos bancos. Se dispunha de armas e carros com certa facilidade, as medidas de segurança das sucursais bancárias brilhavam por sua ausência, em clara contradição com a quantidade de dinheiro que albergavam; e as necessidades econômicas da luta pela emancipação eram elevadas. Os bancos representavam ademais a maior perversão do sistema capitalista, a usura, pelo que a expropriação, um ato recorrente dentro do mundo libertário (e não só dele), era um ato de justiça que punha à disposição da classe trabalhadora e da revolução os recursos do inimigo.

De maneira informal foram se formando desde princípios dos anos 70, diferentes grupos de ação (em um número variável mas nunca superior às poucas dezenas) que com pequenas redes de apoio, realizaram centenas de expropriações por todo o país, sobretudo no triênio 1977-1979. Mas, mais além dos assaltos existia também outra gama de ações que também cultivaram estes e outros grupos (mais centrados na confrontação direta com a patronal): pressões a empresários, sabotagens, piquetes em conflitos laborais, pequenos atentados contra materiais e, no caso do País Basco (onde a situação sociopolítica conduzia com maior facilidade à violência), inclusive contra pessoas.

A Federação Ibérica de Grupos Anarquistas (FIGA)

Frente a uma FAI rodeada de mística mas resultante de grupos pouco operativos, surgiu em Madrid uma nova específica (de ação) que supunha a exceção à norma da informalidade. Muito influenciada pela marca pessoal de seus principais impulsionadores, Alejandro Mata e Agustín Valiente, a FIGA projetava linhas que enlaçavam com os do anarquismo de ação do primeiro terço do Século XX.

Mata e Valiente foram os principais expoentes do protótipo de homem de ação durante a Transição, dada a notoriedade que adquiriram tanto seus nomes como suas ações. Várias dezenas de assaltos (a polícia chegou a imputar-lhes 21), nos quais conseguiram um grande botim (mais de 52 milhões de pesetas) dedicado integralmente a sustentar greves, sindicatos e, sim se faz caso de certas afirmações, a financiar o CNT (jornal da Confederação); levam sua assinatura. Ademais, ambos militantes tiveram significado em várias greves e haviam organizado sindicatos e trabalhadores em diferentes pontos do país.

Sua queda também foi espetacular como suas ações. Em 18 de junho de 1979, após a realização de dois assaltos de cara descoberta, Mata e Valiente eram rodeados em sua casa segura, o que deu lugar a um tiroteio no qual resultaram feridos dois policiais e no qual Valiente perdeu a vida. Mata foi detido e enviado à prisão. Dois anos depois de sua libertação, em 1985, voltaria ao cárcere após uma nova campanha de assaltos e ações, até que na primavera de 1989, graças à mediação da CGT, recuperava definitivamente a liberdade através de um indulto.

Outros grupos de ação intervieram diretamente em conflitos laborais tratando de amedrontar a patronal. Tal foi o caso (sobretudo) basco, onde os Comandos Autônomos Anticapitalistas, além de realizar dezenas de ações para manter os diferentes focos de autonomia obreira, trataram de assassinar, em 1980, o diretor da fábrica de Michelín em Vitoria. Por sua parte, nos ambientes mais sociais, grupos como o de Manuel Martínez se dedicaram aos assaltos para apoiar os presos comuns. Martínez, preso desde a adolescência, faria parte da Coordenadora de Presos em Luta da Transição. Após sua libertação participaria em vários assaltos na Espanha e Portugal para “apoiar economicamente os companheiros que haviam ficado dentro”. Sua vida está contada no livro de Eduardo Romero “Autobiografia de Manuel Martínez”.

Assim como seus predecessores, os expropriadores não gozaram de muito boa impressão no seio da CNT. A maioria de sua militância desaprovava suas ações ao entender que fora da conflitividade laboral, era muito complicado assumir atos violentos. Ademais, os assaltos, o uso de armas e o critério das ações destes grupos, supunham um sério prejuízo para a organização, que se via envolvida em assuntos que não emanavam de seu seio, de muito difícil justificação e que lhe traziam grandes dores de cabeça, tanto internos como frente à polícia e a imprensa. A atitude distante, e inclusive beligerante, da Confederação para com este tipo de ações, deu lugar à recriminação de organizações como a FIGA, que denunciavam que enquanto a CNT santificava figuras como a de Durruti, abandonava a sua sorte aqueles militantes que continuavam sua senda.

Haveriam de chegar os anos 80 para que da mão do que hoje é a CGT, os militantes de ação e os expropriadores tivessem um abrigo sob o qual apegar-se com o aumento da repressão. Foi nesta década ademais quando, paulatinamente, estes grupos começaram a entrar em declive, ainda que seus ecos se fizeram sentir até bem entrados os anos 90. O aumento da segurança nos bancos, o incremento dos meios policiais e a definitiva desaparição das perspectivas revolucionárias, se conjugaram para cercear a capacidade operativa, as perspectivas de êxito e o relevo geracional dos Durrutis da Transição.

Fonte: https://www.nortes.me/2020/11/20/expropiadores-anarquistas-los-solidarios-de-la-transicion/?fbclid=IwAR1WTxV-FO1MfLNEBFl63g3aVsTe4OA01mOG7AEXUwryud83vZCahkEaglg

Tradução > Sol de Abril

agência de notícias anarquistas-ana

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Jandira Mingarelli