Por Francisco José Cuevas Noa | 04/02/2021
No 100º aniversário do falecimento de Piotr Kropotkin, 1921–2021
No jornal anarquista Bandera Libre de dezembro de 1920, editado em Cádiz, trabalhadores gaditanos e de El Arahal põem um anúncio com o título “Pro – Kropotkine”, no qual informam de que há uma inscrição aberta para recolher dinheiro para o libertário russo. Assim como se arrecadam fundos para companheiros despedidos, em prisão, ou para órfãos de lutadores obreiros… Tenta-se sustentar o geógrafo russo, que se encontra vivendo em condições penosas junto a sua companheira e sua filha na aldeia de Dmitrov, a 65 quilômetros de Moscou. Para os anarquistas andaluzes desses anos, Kropotkin é mais um companheiro, a socorrer com algo de dinheiro para alimentos ou para lenha.
Mas o que aconteceu ao longo dos anos para que este nobre russo, geógrafo, intelectual, se conectasse tanto com o proletariado andaluz? Está claro que Kropotkin era um desclassificado — havia pertencido ao corpo de acompanhantes do Czar e renunciou à vida de aristocrata —, mas sua distância geográfica — Rússia, o exílio britânico e francês — poderia ter sido uma barreira para se conectar com o movimento obreiro andaluz e espanhol.
Duas razões potentes possibilitaram o encontro entre o pai do anarco-comunismo e a classe obreira organizada andaluza:
· Em primeiro lugar, a aceitação plena das proposições do comunismo libertário entre os anarquistas andaluzes. Como não iriam abraçar as ideias de propriedade coletiva e de apoio mútuo, trabalhadores que estavam acostumados desde a infância a compartilhar a bacia, o balde e recuo, ao trabalho comunitário, a pôr o lenço para recolher umas moedas quando um irmão de classe precisava levar uma criança ao médico ou levar-lhe um cesto ao cárcere? As práticas populares de apoio mútuo em Andaluzia, especialmente arraigadas no meio rural, supunham uma confirmação na prática das teses do comunismo libertário. “A cada um, segundo suas necessidades; de cada um, segundo suas capacidades”.
· O trabalho abnegado e continuado do anarquista gaditano Fermín Salvochea, que editou o jornal El Socialismo desde Cádiz, entre 1885 e 1891, e desde o qual difundiu amplamente as ideias de Kropotkin, fazendo traduções de seus artigos e livros do inglês. Salvochea conseguiu introduzir as proposições do comunismo anarquistas entre os ambientes ácratas espanhóis, que debatiam com as ideias do anarco-coletivismo de Bakunin.
Desde finais do século XIX, pois, a imagem de Kropotkin passará a presidir as sedes de sindicatos e ateneus libertários, junto à de Bakunin e a de Proudhon. O impulso do geógrafo russo ficou para sempre nos corações e nos anseios da classe obreira andaluza. Tanto é assim, que em janeiro de 1933 tem lugar os acontecimentos de Casas Viejas, uma tentativa insurrecional dos jornaleiros [camponeses] para implantar o comunismo libertário, mas que também se reproduz em La Rinconada, e em alguns povoados de La Rioja. Durante umas horas, os obreiros acariciaram seu sonho de abolir a propriedade e pôr em comum os bens para o povo.
As ideias kropotkinianas, inclusive, influem no debate ideológico andaluz das primeiras décadas do século XX mais além das filas ácratas, como no caso de Blas Infante, que se mostrou mais próximo ao evolucionismo cooperativo do cientista russo que as teses do neodarwinismo, como pode se observar em sua obra el Ideal andaluz (1915).
As ideias de expropriação, produção descentralizada e de gestão comunal das terras e das fábricas, que o russo descreveu excelentemente em sua obra La conquista del pan (que teve ampla difusão entre a classe obreira daqui) arraigaram profundamente na psicologia dos/as trabalhadores/as de Andaluzia, especialmente no meio rural. Esta direção para o comunismo libertário cristaliza de forma vigorosa e unânime no Congresso da CNT de Zaragoza de Maio de 1936, que estabelece em uma decisão como haverá de ser a futura sociedade anarquista, de caráter revolucionário, e organizada mediante coletividades de trabalhadoras de forma federal e sem Estado.
Como conclusão, em 19 de Julho de 1936 se dá o fenômeno conhecido como Revolução Espanhola, no qual grande parte das propostas kropotkinianas se materializam mediante a coletivização de campos, indústrias e serviços, em lugares como Catalunha e Aragão, mas também em Andaluzia Oriental. Kropotkin não viveu para vê-lo, mas seus irmãos sim foram capazes de fazer a colheita do que ele semeou.
Fonte: https://www.lavozdelsur.es/opinion/kropotkin-nuestros_255572_102.html
Tradução > Sol de Abril
agência de notícias anarquistas-ana
Tangerina cai
e a casca ferida exala
gemidos de dor.
José N. Reis
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!