[EUA] Deusa da Anarquia: A escritora Jacqueline Jones reflete sobre Lucy Parsons, o tema de seu último livro

Lucy Parsons (c. 1851-1942) era considerada uma anarquista perigosa e extrema, o tipo de oradora e escritora capaz de impactar seu público: a força de trabalho daquela época. Pois dirigia-se à sofrida classe operária que tinha que trabalhar longas horas em péssimas condições. Enquanto alguns agora veem nela uma feminista e líder sindical, o fato é que incutia medo e pavor na polícia e na classe empresarial da época.

Embora a ousada e veemente anarquista fosse amplamente conhecida em sua época, embora promovesse o uso da violência, nas últimas décadas, Parsons parece ter sido largamente deixada para trás na história. No entanto, quando uma pessoa morre, o objeto de sua luta não desaparece e ela não é totalmente esquecida. O livro da Profa. Dra. Jacqueline Jones da Universidade do Texas em Austin ilustra a longa vida de Parsons, desde sua atuação no movimento trabalhista, sua presença no Motim do Haymarket, até sua defesa dos Scottsboro Boys e da liberdade de expressão. Nesta entrevista por e-mail, Jones fala de seu livro “The Goddess of Anarchy: The Life and Times of Lucy Parsons, American Radical” (A Deusa da Anarquia: a vida e a época de Lucy Parsons, uma americana radical) sobre Parsons.

Ithaca Times: Como chegou a escrever sobre Lucy Parsons e o que a atraiu nela enquanto feminista e líder sindical em seu livro “The Goddess of Anarchy: The Life and Times of Lucy Parsons, American Radical?”.

Jacqueline Jones: Tinha ouvido falar dela e sabia que a primeira e única biografia dela foi escrita em 1976 (por Carolyn Ashbaugh) e que estava na hora de reexaminar a vida de Parsons à luz de novas fontes online agora disponíveis. Ashbaugh não conseguiu descobrir nada sobre sua vida antes de ela chegar a Waco; por minha parte, localizei elementos em jornais que mostravam que ela havia nascido de uma mulher escravizada na Virgínia em 1851 e teve de fugir com sua mãe e seus irmãos para o Texas durante a guerra (de secessão). Embora famigerada, Parsons foi muito famosa quando viva e achei que mais pessoas deveriam conhecê-la.

Entretanto, não a chamaria nem de “feminista” nem de “líder sindical”. Ela nunca usou este último termo e, claro, achava que nem homens nem mulheres deveriam votar. Em seus pronunciamentos públicos, pelo menos, apresentava-se como uma pudica esposa e mãe, mais tarde viúva, vitoriana. Além disso, não tinha muito interesse em trabalhar como dirigente sindical; fez discursos inflamados para instigar seus apoiadores e amedrontar seus inimigos; mas não tinha paciência para ir de loja em loja e exortar mulheres (ou homens) a se afiliarem a um sindicato.

TI: Lucy Parsons conseguiu falar e escrever muito, embora trabalhasse para as mudanças necessárias, como a jornada de oito horas. Mas poderia falar sobre o que a impeliu a lutar e a se manter fiel aos seus princípios para as mudanças necessárias? O que a levou a trabalhar em prol da igualdade e da justiça?

JJ: Acho que ela se preocupava profundamente com a injustiça para com os homens e mulheres brancos de classe operária. Mas perceba que não demonstrou nenhum interesse pelos negros em Chicago—ou no resto do país, por sinal. Não era muito prática, pois em alguns casos pelo menos sua retórica crua e irada causou mais danos do que bem. A famosa dirigente sindical Mary “Mother” Jones se opôs a Parsons e seus camaradas porque usavam uma retórica dura, desprezavam instituições e símbolos americanos e (segundo Jones) manchavam toda a classe trabalhadora com seu radicalismo.

Acho que Parsons gostava de se apresentar, por assim dizer; nunca estava tão feliz como quando fazia um discurso inflamado ou escapava da polícia de uma esquina à outra. Era principalmente uma escritora e uma oradora, não uma dirigente.

IT: Poderia falar de quando, em 1905, Parsons fundou os Industrial Workers of the World (Trabalhadores Industriais do Mundo), conhecidos como “Wobblies” e o fato de ela ter sido a única mulher a falar no evento internacional do sindicato dos trabalhadores?

JJ: Tenho uma seção sobre isso em meu livro onde explico que os organizadores do encontro (Bill Haywood e outros) a convidaram para aparecer por respeito a ela enquanto viúva de um mártir de Haymarket. Não pretendiam deixá-la falar até que ela insistisse em fazê-lo. Mais tarde ela percorreu o Noroeste, vendendo a biografia de seu marido e outros materiais; mas ela nunca realmente trabalhou como dirigente do IWW.

IT: Lucy Parsons era conhecida por ter uma visão de longo prazo nas lutas que empreendia, mas qual é o seu legado e a mensagem que deixou para o futuro?

JJ: É difícil dizer; o que lhe valeu a fama foram seus discursos e é claro que não podemos ouvi-los hoje, então sua influência se desvaneceu. Ao longo de sua vida, no entanto, manteve viva a chama dos mártires de Haymarket e a lembrança do juiz e do júri tendenciosos que os condenaram. Muitos de seus ouvintes [ficavam] empolgados [com] sua retórica radical.

Entretanto, como disse acima, não tinha interesse pela condição dos trabalhadores negros (ou imigrantes chineses, por sinal). Além disso, nunca admitiu em público que havia nascido escrava. Antes, em diferentes momentos de sua vida, afirmou ser filha de um mexicano e de uma nativa americana. Como tinha pele clara (era provavelmente filha de seu proprietário), pôde perpetuar a ficção de que era índia ou mexicana. Acho que ela temia que os trabalhadores brancos não a escutassem se pensassem que era uma ex-escrava. Como não deixou documentos particulares, tudo o que sabemos sobre ela vem do que seus amigos e apoiadores escreveram sobre ela e do que jornais disseram sobre ela; ela permanece um mistério, ainda hoje.

Fonte: https://www.ithaca.com/entertainment/books/goddess-of-anarchy-author-jacqueline-jones-reflects-on-lucy-parsons-the-subject-of-her-latest/article_1009c412-884a-11eb-a1c8-c3bd22232721.html

Tradução > Alainf_13

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