Por Silvia Ribeiro | 14/08/2021
Esta semana, um novo informe do Painel Intergovernamental de especialistas sobre Mudança Climática (IPCC, em sua sigla em inglês) voltou a mostrar que o desequilíbrio climático global é muito severo e que as coisas estão piores do que já tinham advertido em seu informe anterior em 2013.
O ritmo do aquecimento global, desde o período industrial, não tem precedentes e a maioria ocorreu desde fins da década de 90. Estimam que o aquecimento não havia sido tão alto em 125 mil anos, nesse caso, devido a mudanças na órbita da Terra. Isto se traduz em aumento de furacões, chuvas e secas extremas; derretimento de glaciais e outros gelos permanentes; acidificação e aumento do nível do mar, assim como irrupção de correntes oceânicas que regulam a temperatura em países costeiros.
Em suma, os dados mostram que o capitalismo como sistema e uma centena de suas empresas transnacionais conseguiram desequilibrar em tempo recorde o clima global que para estabilizar-se levou milhões de anos de evolução, com um aquecimento que poderia levar ao planeta, em poucas décadas, a pontos de não retorno, o qual nos afetará a todos, mas fundamentalmente a quem menos recursos têm para enfrentar a crise.
Foi um processo consciente dos causadores do caos climático. Setenta e um por cento das emissões de gases de efeito estufa (GEI) são responsabilidade de 100 empresas transnacionais, principalmente da indústria de combustíveis fósseis (petróleo, gás e carvão). Essa indústria é a que mais cedo começou a estudar a mudança climática (muito antes do IPCC), para entender o que estavam causando e buscar formas de prevenir as demandas que poderiam enfrentar, demandas que ainda não se materializam, apesar de alguns avanços como a que ganhou Amigos da Terra contra Shell este ano, que exige à petroleira reduzir suas emissões em 45 por cento (https://tinyurl.com/4j76kj7c).
Por enquanto, como explica John Saxe-Fernández, a indústria da energia fóssil, brutalmente devastadora de comunidades e do ambiente, segue sendo a que mais subvenções públicas recebe, com mais de 5.3 bilhões de dólares anuais (https://tinyurl.com/3ry4j6sp).
Apesar de tudo isto, a declaratória de “emergência climática” ou “código vermelho para a humanidade” como a chamou o Secretário das Nações Unidas, António Guterres, não nos ajuda a enfrentar a situação. Para começar, porque desde o IPCC ao próprio Guterres, em lugar de promover ações para conseguir reduções de GEI reais, o qual implica necessariamente questionar a essas indústrias de altas emissões e o modelo de produção e consumo massivo e injusto, aceitam que as empresas que mais contaminam (energia, agronegócios, alimentar, aviação, construção, mineração, automotriz e financeira, tecnológica, entre outras) avancem em consolidar uma nova armadilha chamada “emissões liquidas zero”.
Essas empresas afirmam ainda que vão aumentar suas emissões (a indústria petroleira e de gás em forma exponencial), as vão “compensar” com megaplantações de árvores e mono-cultivos, com mercados de carbono e com técnicas de geo-engenharia (armazenamento de carbono, captura direta de ar, manipulação da química oceânica, cultivos transgênicos, etc.) que não funcionam para cessar a mudança climática; são de alto risco e provocam maior deslocamento de comunidades e acúmulo de terras. Estados Unidos já aprovou novos subsídios milionários para o desenvolvimento destas técnicas “captura de carbono”, que irão parar fundamentalmente nas arcas das empresas petroleiras, as quais, paradoxalmente, as usam para extrair mais petróleo de reservas profundas às quais não podiam aceder (https://tinyurl.com/35e6j2sz).
Sem questionar as causas estruturais nem assinalar claramente os culpados do caos climático, chamar a impor um estado de “emergência climática” cria um ambiente de desespero e incerteza e prepara o terreno para que não nos oponhamos a essas e outras medidas inaceitáveis, que só vão favorecer as mesmas empresas e perpetuar o caos.
Tom Goldtooth, navajo, diretor da Red Ambiental Indígena e membro da Aliança por Justiça Climática declarou: “A gravidade da crise climática foi denunciada incansavelmente pelas comunidades indígenas e de base afetadas durante décadas. Devemos pressionar o IPCC antes que se publique o seguinte informe sobre mitigação no ano que vem, para que escutem as vozes e conhecimentos tradicionais dos povos indígenas e ponham fim às propostas de falsas soluções, como pôr preço ao carbono, a captura de carbono e a geo engenharia solar, que facilitam que se siga extraindo combustíveis fósseis”.
Ainda que a situação seja grave, desde os povos indígenas, das organizações camponesas e por justiça climática, das comunidades rurais e urbanas temos uma grande diversidade de propostas, experiências e conhecimentos para a justiça climática e social, como a produção camponesa e agroecológica de alimentos, o cuidado e restauração de bosques, manguezais e ecossistemas com os povos e comunidades, a construção e organização coletivas urbanas, sistemas de transporte coletivos e muitas mais, que são as que realmente urge apoiar e fortalecer, porque não só podem absorver parte do carbono excedente, mas, sobretudo prevenir futuras emissões.
Fonte: https://www.briega.org/es/opinion/estamos-fritos
agência de notícias anarquistas-ana
Virada do morro:
Ipê e seu grito amarelo
perpendicular.
Eolo Yberê Libera
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!