[EUA] Um Anarquista Condenado Fala a Verdade sobre a Injustiça – por Dan Baker

Não posso continuar calado face a autoridade corrupta e eventos recentes. Meus amigos ririam e perguntariam quando estive calado em primeiro lugar. Tentei dar uma diminuída antes do meu julgamento e sentença, mas disse ao meu comitê de defesa que mesmo se “eu me ajoelhasse”, como dizem em Game of Thrones, e beijasse o anel e lambesse as botas, mesmo se me rebaixasse dessa forma, o juiz tentaria jogar o livro em mim. Fui acusado injustamente de “Extorsão – transmitir uma ameaça interestadual de sequestro ou agressão a uma pessoa” porque postei panfletos encorajando minha comunidade a se defender de um golpe fascista, o que falhou em fazer em 6 de janeiro de 2021, para derrubar os resultados de eleições democráticas. No mesmo ano, Kyle Rittenhhouse foi absolvido após ultrapassar as fronteiras do estado com um rifle de assalto e matar vários manifestantes. Essa é a razão pela qual os Estados Unidos são a chacota do mundo. Isso me enoja. No último ano, tenho pulado pelo país entre 4 prisões, detido ilegalmente antes do julgamento e sujeitado a condições e torturas piores do que se estivesse em um zoológico, tudo porque sou anarquista. Por meu amor à liberdade, sou um preso político.

O Federal Bureau of Investigation (FBI), por incompetência ou cooperação complicada, falhou em deter o tiroteio de Rittenhouse, mas conseguiu organizar um ataque da SWAT contra mim por postar panfletos online. Enquanto gasta uma quantidade obscena de recursos me rastreando, assediando-me, ligando para minha família, amigos, empregadores, e tentando me jogar em um comportamento antissocial, o FBI falhou em deter dezenas de atiradores. Ao fazer isso, provou todas as críticas anarquistas à prisão e ao complexo industrial militar.

O anarquismo é uma ideia em evolução, uma ideia viva baseada na cooperação, liberdade e democracia direta. Anarquistas exigem liberdade humana máxima porque a natureza humana é social e tende a trabalhar para o benefício mútuo de todos. Rejeitamos o governo, a hierarquia, a dominação, a propriedade privada, a coerção e a autoridade. A liberdade depende da igualdade, e essa igualdade é produto de indivíduos livres trabalhando juntos para assegurar que todos tenham acesso igualitário aos recursos produzidos coletivamente. Ao rejeitar a privatização de riquezas pelo Estado, seja ele socialista ou capitalista, acreditamos que ele seja desnecessário e que a organização social é melhor quando deixada à associação livre de indivíduos para que decidam seus destinos pela democracia direta. As pessoas deveriam ser livres para se associarem na criação de organizações sociais feitas para estruturar a vida social.

Movimentos anarquistas desafiam os Estados liberais democráticos, os quais empoderam a criminalização da pobreza, criando um Estado policial distópico. A justiça criminal e a lei são apenas uma outra forma de coerção.

Há nada que posso aprender na prisão que não poderia ter aprendido em uma comunidade saudável, funcional e social. Quanto mais sou oprimido pelo governo estadunidense, mais sou motivado e empoderado a remover todos os obstáculos da opressão. Fui criado por um xerife do Condado de Palm Beach que me tirou da minha mãe porque ela usava drogas, as quais ele fornecia. Sou o resultado de um caso dela com outro homem. Fui tirado dela, e então colocado na rua quando adolescente. Depois de uma infância em que fui forçado a treinar, atirar e brigar, senti que não tinha outra escolha senão entrar para o exército. Lá fui designado a uma unidade que se gabava de estupros, saqueamentos e assassinatos que cometiam no Afeganistão. Tornei-me foragido quando foram enviados ao Iraque, ausente sem licença. Consegui evitar ser enviado com essa unidade e, enquanto estavam no Iraque, cometeram o Mahmudiyah Gang Rape Massacre [Massacre e Estupro Coletivo de Mahmudiyah] – pesquise. Então, embora tenha sido chutado sem dispensa honrosa, preservei minha integridade, mas a “sociedade” estadunidense é dura com veteranos sem-teto e tive dificuldades para encontrar emprego, habitação e educação. Usei esmolas para treinar jiu jitsu e lutar em torneios. Quando recuperei minhas forças, usei esmolas para voar para o Iraque, onde cruzei a fronteira para a Síria e então para Rojava, onde entrei para a YPG curda, a People’s Protection Unit. Fiz isso porque acredito na revolução de Rojava, que é baseada no feminismo, ecologia social, democracia direta e as ideias levadas adiante por Murray Bookchin e Abdullah Öcalan. Lá, lutei contra o ISIS e vi os militares estadunidenses massacrarem uma multidão de mulheres que escaparam dos jihadis e tentavam se render. Elas foram desintegradas por um ataque aéreo e partes de seus corpos choviam em nós por vários longos minutos. Quando voltei para casa, para ajudar a cuidar do homem que me criou enquanto ele morria, fui perseguido por agentes do FBI como Brian King e Nicolas Marti. Minha mãe morreu um pouco antes de quando fui para Rojava. Tornei-me alvo por criticar a ICE e Trump. Apesar de me manter longe de problemas, e recusar me envolver em comportamento “criminal” que agentes disfarçados tentavam armar, disseram que “estavam vindo para cima de mim com tudo”. Até disse a eles que me renderia pacificamente se tivessem um mandado, mas, em 15 de janeiro de 2021, o FBI arrombou minha porta aos chutes, logo após ter deixado as ruas e ter uma casa, recém saído da condição de rua. Fui arrastado direto para a prisão e jogado em uma cela coberta por merda para seis meses de isolamento antes do julgamento. Fui submetido a abuso criminal e tenho algumas críticas que estão inclusas em meus processos contra os agentes carcerários.

Prisões escravizam pessoas e traficam seus corpos por trabalho e para justificar seus orçamentos inchados. Carcereiros são endoutrinados em uma ideologia que os convencem que todos os encarcerados são criminosos sub-humanos, o pior da sociedade. Na verdade, a maior parte dos encarcerados são apenas pessoas sem acesso à educação que lutam contra a pobreza, uma pobreza esmagadora e planejada que existe para manter uma massa de pessoas escravizadas no chamado “trabalho não qualificado”. Prisões também têm como alvos os deficientes. Um de meus vizinhos de isolamento era um homem autista claramente sofrendo com uma crise contínua de saúde mental. Ele gritava constantemente quando sua luz estava acesa e esmurrava e chutava sua porta a cada 30 segundos. Os carcereiros diziam, “vá se foder, seu neguinho, vou deixar a luz acesa!” Após 3 dias gritando, tornava-se desarticulado, parava de gritar “apaguem minha luz!”, apenas tremendo. Os carcereiros se recusavam a coletar nossos isopores com comida por dias, dizendo então ao meu vizinho autista para dar descarga nos dele. Quando a privada entupia, acusavam-no de tentar inundar sua cela e desligavam seu abastecimento de água por 3 dias. Esse homem falava apenas 20-30 frases repetidamente. O capitão da unidade espirrava mace, então atirava bolas de papel e, finalmente, jogava granadas de CS em sua cela até que ele desmaiasse. Os agentes carcerários abertamente falavam sobre tentar fazer com que se matasse, dizendo-lhe para se enforcar com os lençóis. Ele espalhava suas fezes por toda sua cela e empurrava-as pela porta em direção ao corredor. Por vários meses não fui levado a locais externos. Não vi o sol nem senti uma brisa sequer, e tudo o que podia escutar eram os gritos, dia e noite.

Inscrito nos corpos de muitos encarcerados e nas paredes das celas e cidades, você encontrará o símbolo do A circulado. Pierre-Joseph Proudhon argumentava que a anarquia é a realidade da condição humana da qual emerge a verdadeira liberdade, como uma flor crescendo do chão da existência. Acredita-se que o A circulado foi tirado da proposição proudhoniana de que anarquia é ordem – o A no O.” de ‘Classic Writings in Anarchist Criminology’ (AK Press, 2020)

Como revolucionários internacionais, devemos receber em nossos postos quaisquer estrangeiros, indivíduos isolados, províncias, comunas, associações e países que se rebelaram em nome dos mesmos princípios, mesmo que pertençam a sistemas políticos diferentes. Tomem como exemplo os voluntários internacionais do Batalhão Internacional da YPG.

Durante meu julgamento, o promotor me acusou de odiar o governo estadunidense. Neguei essa acusação na época e continuo a negá-la agora, sentado na prisão. Nem mesmo odeio o ISIS, mesmo que tenha lutado contra jihadis nas linhas de frente. Como anarquista e ascético filosófico, estou contente em sentar e distribuir comida enquanto a economia entra em colapso sob sua própria decadência e ruína. Ensino ioga, meditação e primeiros socorros. A resiliência de nossa saúde, processos de cura e ajuda mútua são mais fortes que qualquer estrutura de poder temporária, não importa o quão fascista e autoritária seja. Ao mesmo tempo, entramos em grupos de apoio inspirados em Tyler Durdan. Tudo é temporário – seu corpo, o planeta, o sol, impérios, tudo. Eventualmente todos os tiranos insignificantes caem. Não precisamos ao menos empurrá-los; se você é tão impaciente que precisa recorrer a ações diretas, lembre-se das primeiras duas regras do Clube da Luta: não falamos sobre isso. Amo minha cidade, meus vizinhos e todos os povos. Nações e Estados não são o povo, não são as sociedades em si. Esses governos são meras ideias se disfarçando de estruturas corruptas de poder. Essa é uma guerra para sua mente, uma guerra espiritual de ideias. Você deve defini-la por você mesmo através da leitura, discussão e ação, pelas conclusões em que sua comunidade tem acordo. Recomendo fazer sabão e jardins comunitários.

Daniel Alan Baker 25765-509
FCI Memphis
PO Box 34550
Memphis, TN 38184 – EUA

Fonte: https://mongoosedistro.com/2021/12/09/a-convicted-anarchist-speaks-truth-to-injustice-by-dan-baker/

Tradução > Sky

agência de notícias anarquistas-ana

flores ao vento
na cortina da janela
cores da primavera

Alonso Alvarez