A seguir, entrevista de Luiza Angélica Paschoeto Guimarães concedida ao Instituto de Estudos Libertários (IEL).
Instituto de Estudos Libertários > Quem é Luiza Angélica Paschoeto Guimarães?
Luiza Angélica Paschoeto Guimarães < Eu sou uma mulher de 60 anos que atuo na área da educação desde os 18, quando me formei no Curso Normal de Nível Médio. Em 1990, concluí a Pedagogia e em 1997 passei a trabalhar com a formação de professores, primeiro no ensino médio e depois em cursos de Licenciatura. Conhecida nos meios acadêmicos como Luiza Paschoeto, atualmente, além de professora, sou também coordenadora do Curso de Pedagogia do Centro Universitário Geraldo Di Biase, em Volta Redonda, no qual venho difundindo a Educação Libertária e o Anarquismo sempre que encontro oportunidade. Passei a minha vida inteira trabalhando e estudando, e cheguei ao Pós-doutorado (que ainda não concluí), às custas de meu próprio esforço.
IEL > Como se deu seu primeiro contato com o pensamento libertário?
Luiza < Meu primeiro contato com o pensamento libertário foi no V Congresso Brasileiro de História da Educação – SBHE, em 2008, quando participei de um minicurso com o professor José Damiro de Moraes. Até então, só conhecia o Anarquismo pela minissérie “Anarquistas, Gracas a Deus”, baseada no livro de mesmo nome de Zelia Gattai, que, aliás, me deu uma visão bem distorcida acerca do Anarquismo. Nesse Congresso, eu fui apresentar um trabalho resultante de minha Dissertação de Mestrado que tratou das políticas públicas de Anísio Teixeira.
IEL > E Proudhon? Como ele entrou no seu campo de interesse?
Luiza < Nesse mesmo minicurso, o professor Damiro apresentou uma pequena biografia de anarquistas que direta ou indiretamente se envolveram com a educação, Proudhon estava entre eles. Minha identificação com ele foi imediata: filho de trabalhadores, com poucos recursos financeiros para estudar, um autodidata… E naquele momento, percebi que tinha “abandonado” Anísio Teixeira. Meu foco passou a ser Proudhon e passei a comprar e a ler seus livros editados no Brasil e muitos outros que se referiam a ele. E quando surgiu a oportunidade de cursar o Doutorado, lá estava eu a elaborar um projeto de pesquisa sobre o pensamento de Proudhon em educação.
IEL > Nos fale um pouco sobre a sua produção acadêmica na universidade.
Luiza < Minha produção acadêmica é pequena. Tenho poucos artigos publicados e a maioria deles tratam de assuntos relativos à Pedagogia. No campo do Anarquismo, publiquei um livro com parte da minha Tese de Doutorado; um capítulo no livro “O pensamento de Proudhon em Educação” da Intermezzo e um capítulo do Livro “Anarquismo e Educação Integral – memória da 3ª Jornada de Pedagogia Libertária”. Fui coautora com alunos da Pedagogia em dois artigos publicados na Revista Episteme Transversalis – um tratou da Escola Moderna e outro da escola Yasnaia Poliana de Tolstói. Também apresentei alguns trabalhos, conferências e palestras em Congressos e Jornadas de Educação Libertária. Na instituição onde atuo (UGB), implantei o “Simpósio de Educação: Cotidiano, História e Políticas” (que parou na 5ª edição, por causa da pandemia), no qual o tema central é a Educação Libertária. Além disso, no curso de Pedagogia temos a disciplina “Laboratório de Prática Pedagógica II”, cuja temática é pensamento libertário na educação e é ministrada por mim.
IEL > Como foi o seu trabalho em Portugal?
Luiza < Em Portugal, fui cursar o Pós-doutorado em História Contemporânea na Universidade de Évora. Fiquei lá realizando pesquisa durante dois meses, fotografando documentos em arquivos públicos e na Biblioteca Nacional de Lisboa. Tive contato com diversos anarquistas com os quais aprendi muito. Minha pesquisa envolveu o jornalista brasileiro Pinto Quartim e sua esposa professora Deolinda Vieira – portuguesa, ambos anarquistas do início do século XX. Ainda não consegui produzir o trabalho acadêmico, pois esses dois últimos anos não foram fáceis, mas ainda não desisti. A ideia é demonstrar as contribuições de ambos para o pensamento libertário em Portugal.
IEL > Em que o anarquismo contribuiu para a sua prática pedagógica?
Luiza < O Anarquismo mudou meu modo de pensar e agir em todos os sentidos, tanto na vida pessoal quanto na profissional. Como pessoa, aprendi que ser livre não é fácil, mas não é impossível na medida em que compreendemos o sentido do termo “liberdade” como a possibilidade de agir de modo consciente, responsável e solidário consigo mesmo e com os outros. E é desse modo que procuro exercer as minhas funções como professora nas licenciaturas e como coordenadora do curso de Pedagogia.
Na minha prática, procuro agir com amorosidade para que meus alunos compreendam que ser professor é muito mais do que transmitir conhecimentos. Ser professor é “permitir” que os estudantes encontrem seus próprios meios e caminhos para aprender, assim como para se tornarem pessoas melhores. Pois educar é lidar com diferentes inteligências, sendo provedor de liberdade e felicidade, e é assim que contribuímos para a revolução social. E isso eu aprendi com Proudhon.
IEL > Como é estudar anarquismo em um contexto político tão adverso como o que estamos vivendo?
Luiza < Estudar o anarquismo atualmente não é nada fácil, pois vivemos entre dois polos autoritários que consideram o anarquismo como utopia romântica e caótica, muitas vezes visto com desconfiança e preconceito decorrente da falta de conhecimento sobre o assunto. No meu caso específico, que vivo no interior do estado do Rio de Janeiro, os anarquistas são em número reduzido (ou não se manifestam com muita frequência), o que dificulta ainda mais o estudo e a produção do conhecimento nesse campo.
Acredito na construção coletiva do conhecimento e isso se faz inicialmente pela reunião das pessoas com o intuito de estudar o assunto. Algumas vezes encontro pessoas que se autointitulam anarquistas, mas não demonstram estarem dispostas a se aprofundarem nas questões relativas ao pensamento libertário ou não têm tempo para se dedicarem a esses estudos.
IEL > Suas considerações finais.
Luiza < Preciso, inicialmente, agradecer ao Instituto de Estudos Libertários e ao professor Alexandre Samis pela oportunidade.
Acredito que há possibilidades de transformar o mundo em que vivemos, com tantas manifestações de violência contra a pessoa humana, principalmente contra aquelas consideradas diferentes do que a sociedade instituiu como “o comum”. Cada um pode fazer isso ao seu modo, via sindicato, grupos coletivos etc., considerando que há diferentes modos de “fazer” política, desde que realmente tenha vontade de fazê-lo. Eu escolhi a educação há 42 anos e o anarquismo há 14 anos para exercer, ao meu modo, a política.
Procuro utilizar o que aprendi com o pensamento libertário, principalmente ao ler Proudhon, na minha vida e no meu trabalho, na medida do que é possível. Minha luta contra o autoritarismo é via educação, pois é o que aprendi (e continuo aprendendo diariamente) e sei fazer. Por essa razão, não me incomodo em ser chamada de “utópica” ou “romântica”, afinal, sou anarquista (Rsrs).
Para acessar a tese A Educação do trabalhador no Movimento Operário da Primeira República no Rio de Janeiro: apropriações e traduções do pensamento de Pierre-Joseph Proudhon, clique no link a seguir: https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/24075/24075.PDF
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Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!