Por causa das greves e manifestações que nossos vizinhos franceses estão realizando para mostrar seu rechaço frontal à reforma das pensões imposta pelo governo de Macron, são muitas as opiniões, nas redes sociais ou em qualquer âmbito social, nos quais não se oculta uma mescla de admiração e inveja ao comparar o espírito de luta de trabalhadores e sindicatos franceses com a indolência e resignação de seus irmãos de classe do Pirineus abaixo, inclusive ante agressões muito mais duras, de fato as ruas de Paris e outras cidades francesas ardem ante o aumento da idade de aposentadoria dos 62 para 64 anos, enquanto na Espanha estamos a uma década avançando inexoravelmente para os 67 anos e não acontece nada.
Por Antonio Pérez Collado | 03/04/2023
Ao final, costumam acabar as reflexões com um triste suspiro e um desejo de que a França siga marcando a rota dos que não se rendem, de todos os loucos que seguem sonhando com essa revolução cada vez mais impossível. Salvando grandes distâncias, estaria se fazendo um pobre remake da mítica cena de Casablanca quando ao final do filme Humphrey Bogart (Rick) se despede definitivamente de Ingrid Bergman (Lisa) consolando-a com a famosa frase de que “sempre nos ficará Paris”.
Em nosso caso, como trabalhadores (ou como classe media trabalhadora, como gostam de dizer agora) nos falta o valor e o compromisso social que ainda ficava aos protagonistas do filme de Michael Curtiz. Admiramos a disposição do povo francês em lutar por seus direitos, mas nunca encontramos vontade nem tempo para fazer o mesmo aqui quando somos chamados a tomar as ruas, não pelos sindicatos do sistema, mas sim por outras organizações e coletivos que resistem em jogar a toalha.
E é que ataques às pensões, similares aos que sofrem agora os franceses, estamos padecendo aqui desde 2011, ano em que começou o processo para aumentar a idade de aposentadoria de 65 a 67 anos, aumentar para 38 anos e meio o requisito para ter direito a 100% da pensão e ampliar de 15 a 25 anos o período sobre o qual calcular a quantia da pensão.
Estes sacrifícios se justificavam, naqueles anos em que governava Rodríguez Zapatero, assegurando que uma vez plenamente implantados (exatamente em 2027) o sistema público de pensões estaria saneado e não seriam necessários novos cortes. Mas vejam só que, antes inclusive de cumprir-se o prazo estabelecido e com outro governo social democrata, voltaram a nos contar que o sistema de pensões poderia fazer água se não se abordarem agora novos ajustes. Nesta ocasião será o período de cálculo em que se verá afetado novamente. Agora será aumentado dos 25 aos 29 anos. Com facilidades, claro, porque até 2040 se poderá escolher entre os últimos 25 anos cotizados e os 27 (porque dos 29 se podem descartar os dois anos com piores cotizações) mas logo desaparecerá a opção dos 25.
Independentemente de que os obreiros franceses consigam ou não fazer Macron retroceder, temos que reconhecer que o povo vizinho vem nos dando sucessivas alegrias ao longo dos tempos. Marcos históricos como a Revolução Francesa, a Comuna, o Maio de 68 e tantíssimas transformações sociais e culturais como inspiraram as luzes de Paris, gerando entre nós um alto grau de simpatia e o desejo de que, lamentando o grau de derrotismo do pessoal, ao menos nos fica Paris.
Fonte: https://www.elsaltodiario.com/alkimia/siempre-nos-quedara-paris-(y-burdeos-lyon-marsella)
Tradução > Sol de Abril
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