Prisioneiro anarquista libertado da Bielorrússia

O regime deportou 52 prisioneiros políticos em troca de alívio nas sanções

Nikita Ivansky ~

O anarquista Nikolai (Mikola) Dziadok estava entre os 52 prisioneiros políticos libertados e deportados da Bielorrússia para a Lituânia em 11 de setembro último, após negociações entre o ditador Alexander Lukashenko e o enviado dos EUA, John Colae. Em troca, os EUA suspenderam as sanções contra a companhia aérea estatal Belavia e renovaram os apelos para reabrir a embaixada em Minsk, uma das maiores libertações de prisioneiros desde a revolta de 2020.

Dziadok enfrentava até 13 anos de prisão pela acusação de organizar a “Ação Autônoma Bielorrússia”, considerada pelo regime como grupo criminoso. Após cumprir 5 anos de pena, de 2010 a 2015, foi um dos últimos presos do período a ser perdoado. Embora a sua libertação estivesse prevista para abril, um novo processo foi aberto contra ele, prolongando a detenção em condições de tortura e isolamento quase total.

Como outros dos libertados, Dziadok foi levado de ônibus da fronteira da Lituânia e expulso. Oficiais da KGB bielorrussa rasgaram o seu passaporte, como fizeram com diversos prisioneiros naquele dia, deliberadamente complicando as suas vidas no exílio. A maioria dos deportados não têm estatuto legal na União Europeia, embora a Lituânia tenha concedido vistos temporários a eles.

Os anarquistas do grupo bielorrusso Pramen descrevem as deportações como “uma nova punição: em vez de tempo na cadeia, enfrentam, agora, exílio por tempo indeterminado em países da União Europeia. O regime de Lukashenko está tentando se livrar não só dos prisioneiros, mas das suas famílias, filhos e pessoas próximas, forçados a sair da Bielorrússia depois de 5 anos lutando contra as prisões”.

Nem todos aceitam o acordo. O líder da oposição, Mikola Statkevich se recusou a sair da Bielorrússia ao ser levado à zona “neutra” de fronteira, conforme relatório revelador de agentes da KGB: “Não me importa o seu líder Kolkhoz”, em alusão ao passado soviético de Lukashenko. Passadas muitas horas, homens mascarados o levaram de volta à Bielorrússia. O seu destino é desconhecido.

Diálogos sobre troca de prisioneiros políticos por sanções circularam por meses. Círculos liberais de oposição no exílio até discutem um acampamento temporário na Lituânia para hospedar futuros libertos. Hoje, na Bielorrússia, mais de 1300 continuam aprisionados, incluindo 24 anarquistas e antifascistas.

Fonte: https://freedomnews.org.uk/2025/09/12/anarchist-prisoner-released-from-belarus/

Tradução > CF Puig

agência de notícias anarquistas-ana

de momento em momento
tudo que eu digo
se choca com o vento

Camila Jabur

[Espanha] Reflexões sobre as propostas anarquistas (ou libertárias ou autogestionárias ou como queiramos chamá-las)

Por Capi Vidal

Lanço algumas reflexões sobre as propostas anarquistas no século XXI, tentando fugir de clichés e distorções, e recordando a visão libertária sobre uma autogestão social na qual, como não poderia ser diferente, a solidariedade é um valor inegociável. Nunca é demais, diante do que vemos, esclarecer muitas coisas sobre o anarquismo, sem que minhas palavras sejam tomadas como definitivas (são reflexões baseadas em um conhecimento, obviamente limitado, mas sempre realizadas diante de um horizonte libertário). É preciso aceitar que, se formos rigorosos com a etimologia da palavra anarquismo (“ausência de princípio”), o tema parece convidar à polêmica desde o início. Como é lógico, o anarquismo não nega de forma alguma o poder, mas sim sua concentração; nem mesmo se pode dizer que seja contra o poder político, mas sim contra o Estado, ou seja, contra aquela concentração de poder que implica uma divisão rígida entre quem manda e quem obedece. O mesmo ocorre com a ideia de autoridade, que não é negada pelo anarquismo, pois reconhece uma autoridade natural baseada no saber e na capacidade dos indivíduos.

Portanto, desmontamos esses clichés (pobres, baseados no desconhecimento ou destinados a desacreditar as ideias libertárias): em nenhum caso se nega a autoridade e o poder por si só. Lembremos, em primeiro lugar, que nas sociedades chamadas “primitivas”, onde não existia o Estado, existia o poder político e a autoridade, entendida como simples competência; quem mais sabe sobre um assunto exerce sua autoridade, mas sempre de forma parcial, temporária e sem que isso implique qualquer dominação sobre a execução da tarefa social em si (ou seja, a autoridade começa e termina na própria tarefa, como pode ser a caça ou a construção de uma casa).

Atenção: dito isso, não quero que esta reflexão seja confundida com qualquer tendência primitivista ou reacionária no anarquismo. Se observamos sociedades do passado, é precisamente por sua confiança em modos de vida e organização melhores. Existe confiança, esperança ou otimismo, se quisermos definir assim, de que as relações humanas podem e devem melhorar. Portanto, há um projeto radical para transformar a sociedade que, obviamente, nada tem a ver com o autoritarismo. Na verdade, é lógico pensar que muitos pensadores contemporâneos, embora próximos do anarquismo, têm sido cautelosos em proclamá-lo devido à influência perniciosa do socialismo autoritário. Este contribuiu enormemente para que muitas pessoas vejam qualquer ideia radical e utópica como um perigo para a humanidade; acredito que os reacionários e conservadores, de um tipo ou outro, se beneficiaram disso.

Não deveríamos temer ser chamados de ingênuos ou mesmo crédulos, nós anarquistas; o verdadeiro crédulo e lamentável, além de conformista e tolo, é acreditar que o mundo deve permanecer como está. Os anarquistas sempre foram e são os grandes inimigos de todo autoritarismo, por isso não podemos permitir que o liberalismo invoque esse perigo para justificar o status quo. O anarquismo, apesar de ter convicções claras sobre a humanidade, rejeita qualquer forma de dogmatismo, algo que se resume muito bem nesta frase de Malatesta: “Eu acredito na infalibilidade da ciência tanto quanto na infalibilidade do Papa”. É por isso que a vigência do anarquismo é, podemos dizer, atemporal; suas propostas, entendidas como uma elevada aspiração moral das sociedades humanas, nunca podem ser consideradas ultrapassadas. O anarquismo se baseia, em grande medida, na afirmação de valores éticos que são supra-históricos.

O projeto radical do anarquismo pode ser resumido na seguinte mudança de paradigma: a vinculação entre ética e política. Nas sociedades contemporâneas, e há vários séculos, há uma clara separação entre esses dois campos. É um projeto difícil, muito difícil, nunca se negou isso, mas sua construção começa aqui e agora, na sociedade em que estamos, e não há negociações de classe que transgridam esses valores. Entenda-se: não estou falando de incoerências, provavelmente inerentes ao ser humano e até muito saudáveis quando ocorrem (deixemos a perfeição e o fundamentalismo para outras ideias), mas sim de um projeto ético e político com propostas e convicções muito claras.

Aproveito para apontar o que considero uma falácia idealista: a necessidade da “mudança interior” do ser humano para transformar a sociedade. Não acredito que, de uma perspectiva libertária, devamos cair nesse idealismo simplório, mas sim nos esforçar pela mudança em todos os âmbitos, pois, do meu ponto de vista, trata-se de um processo de interação (uma vida amplamente moral do indivíduo só é possível se houver a moralização da sociedade). Traços anarquistas existem em muitos movimentos sociais, e a ausência de sectarismo fez com que não se limitassem ao mundo operário (embora, é claro, a autogestão econômica seja um objetivo principal). Se conseguirmos conectar todos esses movimentos antiautoritários (Redes Libertárias é um exemplo desse esforço), nos quais a solidariedade pode se tornar o valor principal, qualquer forma de autoritarismo encontrará verdadeiros obstáculos para se desenvolver. Apesar do desprestígio da palavra democracia, por motivos óbvios, eu acredito que o anarquismo está dentro de uma tradição democrática em um sentido muito profundo. A grande alternativa atual ao que hoje se chama democracia, que não passa de submissão às grandes oligarquias liberais, pode estar nesse projeto anarquista ou libertário: se quisermos, podemos chamá-lo, na economia, de socialismo autogestionário ou libertário, mas sem perder de vista o ideal anarquista no horizonte.

Fonte: https://redeslibertarias.com/2025/07/18/reflexoes-sobre-as-propostas-anarquistas-ou-libertarias-ou-autogestionarias-ou-como-queramos-chamalas/

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

Algo de dança
nas algas,
quase canção dos corais.

Yeda Prates Bernis

[Grécia] 12 anos do assassinato do antifascista Pavlos Fyssas | Mobilizações em Atenas e Tessalônica

MORTE AO FASCISMO, AO ESTADO E AO CAPITALISMO
12 anos do assassinato do antifascista Pavlos Fyssas

Em 18 de setembro de 2013, um batalhão de assalto paraestatal do A.A. realizou um ataque assassino em Keratsini, do qual o antifascista Pavlos Fyssas caiu morto, esfaqueado no coração pelo membro do Aurora Dourada, G. Roupakias. O assassinato de Pavlos Fyssas foi mais um episódio sangrento na lista de ações assassinas da gangue paraestatal do A.A. contra ativistas anarquistas e de esquerda, sindicalistas, refugiados, imigrantes e espaços de luta ocupados e autogestionados. Diante da perspectiva de expressar a raiva social acumulada após o assassinato de P. Fyssas, o Estado encaminhou o A.A. a julgamento como uma organização criminosa, buscando se apresentar como o único órgão de justiça e garantidor da ordem social. Com o fiasco do julgamento, o “antifascismo” institucional tentou desvalorizar a luta antifascista, consolidar a teoria dos dois extremos e neutralizar tanto as ações de gangues neonazistas quanto o próprio Estado, o principal orquestrador dos ataques fascistas-paraestatais. Em outubro de 2020, o A.A. foi condenado como organização criminosa, a maioria das figuras importantes foi condenada por liderança e apenas 11 membros dos batalhões de assalto foram temporariamente presos, recebendo as penas mínimas. Em 15 de junho de 2022, teve início o julgamento do A.A., que deverá ser concluído – com alguns fascistas, no entanto, já tendo sido libertados da prisão devido às penas baixas.

No entanto, a festa da lavagem do Estado e da luta organizada antifascista não muda a realidade. O Estado e o capital sabem quem realmente enfiou os fascistas, seus fantoches leais, em seus buracos. Das barricadas de solidariedade internacionalista e das mobilizações antifascistas de todos os anos anteriores, aos locais de trabalho, escolas, universidades e bairros, as resistências sociais e de classe coletivas se opõem ao fascismo, que teimosamente continua a lutar contra o racismo, a intolerância, a repressão e a exploração do homem pelo homem e a erguer barreiras aos apetites do poder, do Estado e do capitalismo. Assim, nas atuais condições de crise sistêmica e no quadro do totalitarismo moderno, o sistema dominante de exploração mais uma vez convoca sua reserva essencialmente contrarrevolucionária (gangues fascistas, formações neonazistas, partidos de extrema direita, etc.) para funcionar como um freio contra aqueles que ainda resistem, para interromper as lutas sociais e de classe e para aterrorizar aqueles que continuam a participar delas.

É por isso que o fascismo não desapareceu para sempre com a condenação em primeira instância do A.A. Ele se aninha nas rachaduras que o sistema dominante de exploração causa na sociedade como um todo, por meio da difusão do ódio em todas as suas formas, para que, no momento certo, quando o Estado e o capital precisarem, possa aparecer e funcionar como um complemento a eles. Dos ataques de gangues fascistas a antifascistas e estruturas de luta e dos pogroms contra imigrantes; dos assassinatos estatais em delegacias de polícia daqueles que o Estado considera populações excedentes; da política anti-imigração mais ampla promovida em todo o Ocidente, por meio da negação de asilo, dos sequestros e deportações de refugiados e imigrantes, até sua prisão em campos de concentração e seu assassinato aos milhares nas águas sangrentas do Mediterrâneo; do acobertamento de estupradores e redes de tráfico; da criminalização da luta antifascista e antiestatal, da repressão a manifestações e greves, das remoções de ocupações, da perseguição a ativistas, ao apoio descarado, por parte dos Estados ocidentais, a Israel, máquina de morte definitiva e modelo de expansionismo e militarização modernos, buscando silenciar as vozes solidárias que demonstram o genocídio que atualmente ocorre na Palestina, Estado, capital e fascistas caminham de mãos dadas com o objetivo de aterrorizar os de baixo e esmagar todo centro de resistência e solidariedade.

Diante dos contínuos crimes de Estado contra a plebe e a natureza, da guerra e da barbárie que se pretende instaurar como o novo normal em todos os cantos do mundo, dos constantes ataques repressivos contra a luta anarquista, das ocupações e das resistências sociais e de classe até o reaparecimento das gangues fascistas, neonazistas e assassinas, e da propaganda dominante que promove o racismo, o nacionalismo e a intolerância, dando origem a crimes canibais, a única perspectiva realista, vista de baixo, é a organização e a luta pela Revolução Social. Sem ilusões de que o sistema de exploração e opressão possa ser embelezado, sem ilusões de que qualquer governo ou instituição estatal possa constituir uma barreira ao monstro do fascismo, propomos a solidariedade social e a ajuda mútua entre os oprimidos. Promovemos a organização de base, a humanidade, a ética anarquista, os valores atemporais da anarquia e do comunismo libertário, por um mundo de igualdade, justiça e liberdade.

CONTRA O ESTADO E A BARBÁRIE CAPITALISTA DA GUERRA, DO FASCISMO, DA EXPLORAÇÃO E DA REPRESSÃO

ORGANIZAÇÃO E LUTA PELA REVOLUÇÃO SOCIAL, ANARQUIA E COMUNISMO LIBERTÁRIO

PAULO VIVE,
NÃO ESQUECEMOS – NÃO PERDOAMOS

Manifestações antifascistas, antiestatais e antirrepressivas, quinta-feira, 18 de setembro

Atenas: Keratsini (Pavlou Fyssa 60), 17h30 | Tessalônica: Kamara, 18h00

Organização Política Anarquista – Federação de Coletivos

agência de notícias anarquistas-ana

Um sol transparente
e um mar azulão
brilhando na areia quente

Winston

Novo Vídeo: Bolsonaro foi condenado.

E muitas pessoas estão celebrando, o que é compreensível. Porém sua prisão reforça a lógica carcerária e a legitimidade do chamado “Estado Democrático de Direito”, levando diversas pessoas que buscam por justiça social a apoiar as instituições de um Estado que é a base das injustiças que afligem este território há 500 anos.

Não queremos o fortalecimento das instituições que sempre foram usadas contra as pessoas mais vulneráveis e contra as lutas populares. Não queremos a soberania de um Estado que há 500 anos nos mata, nos oprime e devasta estas terras. Queremos sua abolição, para que possamos enfim buscar a libertação total, através da autodeterminação dos povos e territórios, da solidariedade e do internacionalismo.

>> Veja o vídeo aqui: https://antimidia.org/bolsonaro-foi-condenado/

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A lua da montanha
Gentilmente ilumina
O ladrão de flores.

Issa

Vamos Bloquear Tudo! 10 de setembro, França | Uma breve atualização sobre os protestos de 10 de setembro em Paris e na França.

Desde o amanhecer, em dezenas de cidades francesas, o movimento “Bloquons tout” (Vamos Bloquear Tudo”) começou com o objetivo de fechar as rodovias ao redor das cidades e bloquear o trânsito. Em algumas regiões, isso foi alcançado fechando completamente estradas, rodovias e até cidades inteiras, enquanto em Paris, tentou-se bloquear o anel viário que separa Paris dos subúrbios. Os policiais estavam de prontidão, com 80.000 policiais espalhados em todo o país. A partir das 6h, começaram os bloqueios de lojas/empresas/supermercados como o Carrefour (também alvo em solidariedade à Palestina), estações de trem e escolas de ensino médio, em centenas de lugares. A ordem dos policiais era intervir imediatamente nos pontos de bloqueio, com espancamentos e prisões (mais de 500 prisões em todo o país).

É claro que as forças de repressão em muitos pontos se viram desorganizadas e surpreendidas pelo movimento, encontrando resistência e contra-ataques. Muitos dos bloqueios duraram horas, até o dia inteiro, enquanto outros foram rapidamente dispersos, transformando a “retirada” em passeatas espontâneas e alvos alternativos. As pessoas permaneceram nas ruas do amanhecer ao anoitecer, interrompendo a normalidade por todos os meios, desde fanfarras a confrontos. Algumas ações interessantes foram:

– O bloqueio do colégio Hélène Boucher, em Paris. Os estudantes do ensino médio entraram em confronto com a polícia, juntando-se à marcha espontânea que começou no anel viário de Montreuil, onde dezenas de barricadas foram montadas no início da manhã.

– O bloqueio de uma fábrica que produz peças de armas para Israel em Marselha – Sabotagem de antenas em Toulouse – O ônibus queimado – barricada em Rennes.

– O bloqueio das estações centrais de trem em Paris Gare du Nord e Gare de Lyon.

– O fechamento da estação Halles e de um shopping center no coração de Paris, o que pode ter acontecido por ordem da polícia, já que o local estava lotado de pessoas.

O interessante é que essas mobilizações mantêm um caráter espontâneo, não integrado às políticas dos sindicatos e da esquerda, que, ao mesmo tempo, têm feito o trabalho de pacificação social e de extinção de incêndios dos movimentos rebeldes. A multidão, composta por muitos jovens e pessoas que escapam à estrutura dos partidos, está voltando sua atenção e se auto-organizando por meio de assembleias abertas.

O modo de ação do movimento de 10 de Setembro concentra-se nos pontos de bloqueio, mas espalha-se pela cidade com muitas marchas espontâneas que conectam os pontos no mapa. A cultura da manifestação selvagem, isto é, marchas que surgem da vontade do povo de ir às ruas, são criadas pelo ímpeto da multidão em direções desconhecidas e com o objetivo de muitas vezes criar o máximo de caos possível até que as forças da repressão intervenham, infelizmente, desde o início. Essas marchas ocorreram durante todo o dia em Paris, como a que ocorreu no centro de Paris na tarde de quarta-feira. Dezenas de milhares de pessoas se moveram pelas ruas principais com um único pulso, e à medida que a multidão crescia, também crescia o barulho, os incêndios aumentavam e as vitrines das lojas não tinham escolha a não ser destroçadas. Enquanto as pessoas saltavam sobre as barricadas em chamas, os policiais preparavam seu gás lacrimogêneo para repelir a multidão.

No final da tarde, milhares de pessoas se reuniram na Place des Fêtes, onde, apesar da chuva, foi realizada uma assembleia aberta que decidiu bloquear a Porte de Lilas, uma artéria urbana para os subúrbios, durante a noite. O grande incêndio no meio da praça levou alguns anárquicos (ou até mesmo bêbados) a saírem às ruas em uma procissão “selvagem”, onde todas as lixeiras em seu caminho foram viradas, materiais de construção encontraram seu devido uso e as janelas de bancos, supermercados e imobiliárias foram quebradas. Moradores do bairro saíram às ruas gritando e atirando objetos nos policiais que lentamente cercavam a praça.

Os canais televisivos com seus comentários clássicos minimizaram o número de manifestantes, numa tentativa de silenciar o movimento. Os tribunais lotaram no dia seguinte, liberando a maioria das pessoas e aplicando pesadas multas, uma tática sem precedentes. A partir do dia seguinte, as assembleias abertas nos bairros e cidades lotaram, com centenas de pessoas que continuaram a propor ações criativas para os dias seguintes, até a convocação da greve geral em 18 de setembro.

Este movimento ainda não tem certeza de suas posições políticas, já que as opiniões variam da mudança de governo à queda do Estado. No entanto, os meios utilizados até agora são certamente a auto-organização, a espontaneidade, a imaginação ou a destruição, com o objetivo de bloquear o país.

VAMOS BLOQUEAR TUDO!
LIBERDADE NA PALESTINA
FODA-SE O MACRON, NÃO QUEREMOS PODER NENHUM.
Zbeul partout!

Compas anarquistas

> Foto: “Kyriakos X. Presente”. Escrito em uma janela quebrada de banco.

Fonte: https://athens.indymedia.org/post/1637570/

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Não há céu nem terra,
apenas a neve
caindo sem parar.

Issa

[Porto Alegre-RD] Protesto anárquico na UFRGS contra o evento Pré-COP30.

A potência dum curto-circuito

Um curto-circuito ocorre quando o trajeto percorrido pela eletricidade não encontra obstáculo que a dissipe, é um trajeto mais ameno para a corrente elétrica que flui intensa e livremente podendo provocar pausas, danos ou incêndios. O curto circuito pode acontecer por introduzir um objeto estranho ou também por sobrecarga do sistema.

A COP30 (a ser realizado em Belém do Pará no mês de novembro) evento internacional de grande magnitude, de bilionários gastos públicos em obras que não respondem a nenhuma necessidade real das pessoas, de gentrificação urbana e social, de uso descarado da floresta amazônica como cenário, é a super exposição de políticos maquiando a devastação da terra, uma vez que esse mega evento tem como um dos objetivos não-declarados promover a exploração petrolífera da Foz do Rio Amazonas. O fato de que o governo esquerdista tenha criado dentro desse mega evento o rincão da inclusão, para fingir que leva em conta as palavras dos movimentos sociais, não afeta infimamente o grande intuito do evento: NADA em relação à terra. Apenas especulação e lobby político-empresarial. Nada além do truque mais engenhoso do sistema: incluir para apaziguar. Mais um mega evento cujos impactos esse território conhece bem.

Diante da realização da Pré-COP30-RS, aqui na cidade de Porto Alegre, imunes aos discursos e práticas inclusivas (apaziguadoras) do sistema, nossa opção foi a Ação Direta. Mediante uma caminhada curta, porém efetiva fomos juntando rebeldes até o Centro Cultural da UFRGS¹ para apresentar uma crítica radical à devastação. Cartazes nas ruas, panfletos, faixas, gritos, rojões, quebraram o silêncio da indiferença social, da cumplicidade social, da passividade inofensiva, ancoras de qualquer possível mudança, também um galão de óleo se transformou no tapete de recepção do prédio para interromper, ainda que momentaneamente, um evento hipócrita. Um curto circuito na normalidade.

E para aqueles que ainda duvidam se a universidade é um espaço coletivo ou é mais uma engrenagem da dominação: Enquanto os governos, ONGs, cientistas e movimentos sociais se dispunham a servir de colchão de impacto para os empresários da devastação da Terra, serão apenas falsos críticos, e seus espaços, como a Universidade serão apenas os locais de iludir ingênuos com falsas mudanças sendo contraponto domesticado.

Desde Belém do Pará, cidade sede da COP30, Anarquistas tem lançado chamados, convites e incitações a agitar contra a COP, em sintonia resgatamos alguns trechos que nos parecem importantes: “Agir por conta própria (…) Bloquear para avançar. (…) Romper essa atmosfera de consenso brando dentro do movimento ambientalista. A colaboração com os estados e as corporações só leva a piora da situação. Nossa única chance é construir um movimento que rejeite as estruturas responsáveis pela catástrofe: o capitalismo e o Estado. Portanto é importante atacar esses eventos que foram criados para nos tranquilizar e desviar nossa atenção.

Distanciamo-nos da esperança e estratégia focada apenas no movimento massivo, isso pode significar o imobilismo, ou uma espera eterna pelo “despertar social”. Uma interrupção, de poucas pessoas, num contexto determinado, pode ter consequências significativas, a relevância radica em gerar essa interrupção, em provocar um quebre na normalidade imposta, e isso é sempre necessário, por um lado para responder à opressão cotidiana e por outro lado porque essas irrupções representam possibilidades, e é possível atacar, interromper, sabotar, demonstrar nosso rechaço. Eis a beleza do curto-circuito: A passagem da corrente elétrica não encontra empecilhos, ela paralisa a máquina ainda que fugazmente.

Pelo Clima, contra a COP!

Que a luta seja contagiosa!

Que se espalhem as ações contra a COP de Belém ao resto do território em conflito com o Estado Brasileiro!

Nota 1. O compa detido ao final do protesto, está livre e forte. E nossa solidariedade e apoio com todxs que lutam é mais do que palavra escrita.

Nota 2. Palavras dos cartazes e panfletos espalhados no protesto contra a COP30:

“Pelo Clima contra a COP! Desprezamos a farsa da Conferência das Nações Unidas sobre as mudanças climáticas, e todos seus cúmplices na continuidade da exploração da natureza, aos responsáveis pela crise climática e os que se recusam a confrontar o capital para eliminá-la.

A defesa do planeta não será através de acordos entre chefes de Estado e grandes empresários dispostos apenas às menores alterações em seus projetos de lucro e devastação. A vida livre corre outros caminhos. Defende a terra como território e não como um recurso a explorar!”

“Pelo clima contra a COP! 30 anos de farsa. Ano após ano, chefes de Estado, representantes de empresas ligadas às principais indústrias responsáveis pela devastação ambiental, cientistas, etc, se reúnem para compartilhar seus interesses capitalistas diante da crise climática e discutir as melhores maneiras para seguir explorando recursos naturais e camuflar as reações equivalentes às suas ações. Para fingir preocupação com as vidas e o meio ambiente, criam metas de faixada que sequer tratam de cumprir.

Muitas pessoas acreditam que seus representantes favoritos irão defender seus direitos de respirar e beber água, ou proteger as árvores de seu bairro, sem saber que lubrificam as engrenagens responsáveis pela produção de seus pesadelos, para depois consumi-los com gosto, mas nós não!

Te revolta contra quem ataca tua dignidade e sufoca tua liberdade, contesta o que te é empurrado goela abaixo. Desobedeça, sabota, boicota e, destrói os responsáveis pelo sofrimento e aprisionamento das vidas, a menos que confie em vilões, neste caso vote, e aguarde a própria extinção, assistindo o espetáculo macabro que prepara nosso fim.”

[1] Universidade Federal do Rio Grande do Sul, universidade pública do estado do Rio Grande do Sul.

agência de notícias anarquistas-ana

Desobediência –
flor que nasce no fio
da cerca podre.

Liberto Herrera

[Taiwan] Anúncio do Encontro na Ilha da Paz

Os anarquistas e artistas performáticos de longa data Lenny e June estão convidando pessoas com ideias semelhantes para a Assembleia da Ilha da Paz. Este encontro acontecerá de 18 a 22 de setembro de 2025, na província de Keelung, Taiwan.

Como nos conta Lenny…

Minha parceira e alma gêmea, June, e eu descobrimos a Ilha da Paz (Heping) há dois anos. Ela faz parte da província de Keelung, no extremo norte de Taiwan. Fomos informados sobre a pequena ilha quando estávamos apresentando uma peça teatral sobre Hong Kong em uma igreja em Keelung.

A ilha é conectada ao continente por uma ponte pedonal que leva menos de 60 segundos para atravessar.

Fiquei encantado com o nome, e com a existência de um pedaço de terra tão pequeno e independente. É claro que, no nível do fundo do mar, tudo está conectado. Mas uma ilha é sempre poética e livre.

Foi dada a June e eu uma visita guiada à parte pública da ilha. Aprendemos sobre sua história, seu domínio sob o regime colonial e pós-colonial, como um posto avançado dos estados espanhol e japonês. Mais recentemente, o governo taiwanês estabeleceu uma área militar restrita para as forças armadas. No entanto, há também uma pequena seção residencial civil, incluindo o Parque Costeiro da Ilha da Paz.

Este é um belo cenário rural, mas não permaneceu intocado pelo nacionalismo moderno e pela industrialização.

Temos planejado um projeto de paz para 2025 em oposição ao holocausto que está ocorrendo em Gaza e em muitos outros campos de batalha por todo o planeta. Também sentimos que o assédio incessante de Taiwan pelo exército do Partido Comunista Chinês merece algum protesto e revolta pela paz.

Por isso, decidimos convocar uma reunião de pessoas, criações, arte, música e experiências, compartilhando na Ilha da Paz, em Keelung, durante o fim de semana do Dia Internacional da Paz.

Também estamos relembrando as lutas e conquistas das pessoas que iniciaram o movimento Nova Aldeia no Japão no final da década de 1910. Ele foi inspirado pelas esperanças de Tolstói pela paz internacional e pela união entre os povos. Os anarquistas chineses levaram a ideia para a China. O movimento é discutido no livro The New Village, de Ou Ning. O movimento Nova Aldeia inspirou muitos grupos comunitários de idealistas, incluindo anarquistas, que viviam juntos em ambientes rurais, isolados da sociedade industrial moderna, a fim de buscar relações humanas mais profundas.

The Ideal World” (O Mundo Ideal), de Ou Ning (E-flux Journal, março de 2025), discute o movimento, incluindo seus princípios básicos:

1. Nosso ideal é que todos os povos do mundo possam cumprir seus destinos e que cada pessoa também possa crescer plenamente.

2. Não prejudique os outros apenas para que você possa existir.

3. Você deve colocar sua vida no caminho certo. Não prejudique o destino e as necessidades legítimas dos outros por causa de seus próprios prazeres, alegrias e liberdade.

4. Devemos fazer o possível para que a humanidade em todo o mundo possa compartilhar o mesmo espírito e o mesmo modo de vida que nós, para que toda a humanidade possa cumprir suas obrigações, desfrutar da liberdade e ter uma vida digna que realize seus destinos (incluindo a individualidade).

5. Quem quer viver dessa maneira, acredita que é possível viver dessa maneira e espera que as pessoas em todo o mundo possam viver dessa maneira — essas pessoas são membros da Nova Aldeia e são nossos irmãos e irmãs.

6. Não queremos conflitos entre países e entre classes. Aqueles que entram na Nova Aldeia levam uma vida digna, trabalham juntos e acreditam que o mundo que esperamos surgirá, e trabalhamos duro para isso.

Estamos convocando uma “assemblage” (encontro) em vez de uma “assembly” (assembleia) porque será mais uma reunião de obras do que de seus criadores. Não temos recursos para organizar uma assembleia e não pretendemos fazê-lo. Não podemos pagar passagens aéreas para amigos interessados em vir a Keelung, Taiwan. Mas se eles tiverem interesse e motivação suficientes para vir, é claro que providenciaremos acomodações e alimentação. Outros podem participar pela Internet com criações artísticas e apresentações; este é um mundo dominado pelos dados.

Esperamos que haja uma exposição de arte, uma série de palestras compartilhadas (presenciais ou online), apresentações musicais coletivas e uma cozinha de ajuda mútua. Tudo acontecerá em espaços públicos ou doados.

Haverá também um álbum compilatório temático com “faixas solidárias” de amigos de todo o mundo, incluindo algumas músicas gravadas para esta coletânea em Tóquio, no inverno de 2024, por um pequeno círculo de amigos, todos trabalhando em prol da ajuda mútua ao movimento de resistência em Gaza.

Também esperamos receber artigos e outras publicações de amigos que desejam compartilhar suas experiências dessa forma.

Alguns documentários/vídeos também serão apresentados e exibidos durante o fim de semana.

Todos os eventos presenciais serão realizados na Ilha da Paz ou nas proximidades. Estamos procurando espaços para esses eventos. Existem muitos espaços não institucionais interessantes onde essas atividades podem ser realizadas.

A assembleia será uma reunião autônoma de pessoas, trabalhos e eventos. Não há coordenador de eventos ou exposições. Não há patrocinador. Não há presidente. Ninguém tem responsabilidade. É puramente uma assembleia de almas afins, pessoalmente ou na exibição de trabalhos. Portanto, não há orçamento financeiro. Cuidamos de nós mesmos enquanto também tentamos cuidar uns dos outros, sempre que necessário.

Tal como os participantes do movimento New Village, acreditamos que os projetos podem ser realizados quando as pessoas suspendem os seus julgamentos predeterminados e permitem que os outros sigam o fluxo das suas inspirações criativas em estruturas amplamente imaginadas. Acontece.

Se você desejar de participar, contate Lenny em lenny@rti.org.tw (radio show station) ou lenocato@icloud.com

A resistência L&J fica logo ao lado da Ilha da Paz, na ponta da costa do Pacífico de Taiwan.

Fonte: https://www.fifthestate.org/archive/peace-island-gathering/

Tradução > Lagarto Azul / acervo trans-anarquista

agência de notícias anarquistas-ana

Renasce o campo.
Borboletas planando:
Flores entre o verde.

Edu Otsuka

[Reino Unido] Nepal: uma revolta das bases

Nestes tempos sombrios e reacionários, vale a pena notar que, apesar da enxurrada de propaganda da mídia controlada pelo Estado e pelos capitalistas, a luta não morreu. Presenciamos as recentes greves dos transportes em Londres, a revolta na Indonésia e os bloqueios de 10 de setembro na França. A ACG espera comentar todos esses eventos, mas, aqui, vamos nos concentrar em outro acontecimento importante: o levante no Nepal.

Uma enorme onda de indignação popular tomou conta do governo nepalês quando, em 4 de setembro, tentou fechar 26 plataformas de mídia social. A desculpa era supressão ao discurso de ódio, mas o verdadeiro motivo era silenciar a dissidência. As condições econômicas forçaram dois milhões de trabalhadores a migrar para longe e, para eles, as mídias sociais são a principal forma de manter contato com as famílias. Cerca de 90% da população usa mídias sociais.

A indignação generalizada à corrupção dos políticos já é antiga, e isso foi rapidamente expresso em cartazes empunhados por milhares de manifestantes que saíram às ruas da capital Katmandu naquele dia. Muitos jovens, alguns com os seus uniformes escolares. A polícia respondeu com violência, usando cassetetes e canhões de água. Isso só aumentou a raiva dos manifestantes. Em 8 de setembro, a polícia intensificou a violência, atirando contra a multidão e matando manifestantes. Até o momento, o número de mortos pelas forças do Estado subiu para 25, mas pode aumentar. Muitos foram baleados na cabeça ou no peito, foram assassinatos deliberados. O governo impôs toque de recolher, mas isso não foi suficiente para deter os protestos.

Em resposta, as sedes dos partidos políticos foram incendiadas, assim como as casas dos respectivos líderes. Diante da ira popular, alguns precisaram de resgate, subindo em cordas penduradas por helicópteros da polícia, na tentativa desesperada de fugir dos manifestantes enfurecidos. Isso foi seguido pela queima do prédio do Congresso (Parlamento). O primeiro-ministro Khadga Prasad Sharma Oli foi forçado a renunciar. Pouco depois, a sua casa foi incendiada. O ministro do Interior, Ramesh Lekhak, renunciou, no dia anterior, após assumir a responsabilidade moral pela repressão. A proibição das redes sociais foi suspensa, mas, agora, o exército assume o controle das ruas.

Como tudo isso aconteceu? Um dos motivos para a proibição foi a divulgação de material nas redes sociais, mostrando o estilo de vida extravagante da elite nepalesa, em um país com graus muito altos de pobreza e 20% de desemprego entre os jovens. O descontentamento já vinha fervilhando há tempos, e a divulgação desse material e, em seguida, a proibição, foram só faíscas que acenderam a revolta social.

A insurreição não foi liderada por nenhum grupo específico, ao que parece. Foi um acontecimento descentralizado, liderado por jovens sem filiação a nenhum partido, atormentados pelo desemprego e pela necessidade de emigrar para encontrar ocupação. Só no ano passado, 740 mil pessoas foram forçadas a emigrar.

O Nepal evoluiu de uma monarquia hindu para uma democracia burguesa secular, após uma guerra civil com guerrilheiros maoístas, que levou a uma monarquia parlamentar e, por fim, à abolição da monarquia. Desde então, diversos partidos já governaram, incluindo alguns que se autodenominam comunistas, e os ex-guerrilheiros maoístas. Todos eles se adaptaram rapidamente ao sistema e às práticas corruptas da elite. Essa elite enriqueceu tremendamente, e as famílias ricas operam um sistema de nepotismo, no qual os seus familiares herdam cadeiras parlamentares, cargos governamentais e partidários, contratos estatais e posições de embaixada.

Um grupo chamado Safal, ou Comitê de Rua dos Trabalhadores do Nepal, surgiu e fez declaração dizendo que os eventos foram o “primeiro tiro na guerra de classes” e pedindo que a polícia fosse desarmada, as massas armadas e o parlamento dissolvido. Resta saber se esse é um grupo genuíno, organicamente relacionado à revolta, ou uma tentativa de elementos comunistas de se reabilitarem.

Seja como for, a revolta indica a dissidência latente não só do Nepal, mas por todo o mundo. As elites governantes da Índia e da China devem tomar nota e tremer. A revolução ainda é possível, seja no Oriente ou no Ocidente.

Fonte: https://www.anarchistcommunism.org/2025/09/13/nepal-a-grassroots-uprising/

Tradução > CF Puig

agência de notícias anarquistas-ana

A jabuticabeira.
Através de líquida cortina
olhos negros espiam.

Yeda Prates Bernis

Nem Washington nem Pequim: A Ilusão de Trocar de Carcereiro

Em um grupo do qual participo, solicitaram minha opinião sobre o embate entre Estados Unidos x China, questionando se a ascensão do Dragão não seria um golpe fatal no imperialismo ianque e uma aurora de maior liberdade para os povos oprimidos. Minha resposta é um retumbante e claro NÃO. Irmãs e irmãos, não se deixem enganar pela farsa geopolítica! Não passamos de espectadores de uma troca de guardas na mesma prisão. A queda de um carcereiro não significa a libertação dos presos; significa apenas que um novo algoz, talvez mais eficiente e implacável, assume o controle das chaves.

A China não é o antídoto para o veneno estadunidense; é meramente uma dose mais concentrada do mesmo veneno, disfarçada sob a roupagem de “comunismo” e “harmonia”. Seu modelo de capitalismo de vigilância de Estado, combinando exploração hiper-capitalista com um controle social orwelliano, não é uma alternativa ao imperialismo, mas a sua evolução mais perversa. O que vemos não é o fim da dominação, mas a sua modernização: as correntes do novo senhor não são menos pesadas, apenas são digitais, feitas de reconhecimento facial, crédito social e uma teia de dívidas que amarra o Sul Global num novo tipo de colonialismo. Por exemplo, a tal “Nova Rota da Seda” não é pensada para a solidariedade internacional; é a construção de uma nova espinha dorsal para a extração de riqueza, substituindo o FMI pelo Banco de Desenvolvimento da China, mas mantendo intacta a lógica de subjugação.

Portanto, camaradas, não celebrem esta mudança no topo da pirâmide. É uma ilusão perigosa acreditar que um Leviatã é preferível a outro. O imperialismo não é uma característica exclusiva de uma bandeira ou ideologia; é a manifestação lógica e poderosíssima do Estado e do Capital em sua busca infinita por expansão e controle. Trocar um dominador por outro não abala as fundações do cárcere hierárquico em que vivemos. Nossa luta não é para ver quem ocupa o trono, mas para DESTRUIR o trono e todos os que desejam se assentar nele.

Esta conjuntura de tensão, no entanto, não é de todo ruim. É precisamente nas fissuras criadas pelo choque entre estes dois titãs que nós, anarquistas, encontramos nossa oportunidade. Enquanto os Estados se digladiam pelo domínio global, sua atenção é desviada, seu controle sobre os territórios periféricos pode se fragilizar e brechas se abrem. Nossa tarefa é ocupar estas brechas! Devemos transformar a retórica vazia deles em nossa ação direta: organizar sindicatos autônomos nas fábricas, ocupar terras, criar comunidades de apoio mútuo, erguer barricadas contra a repressão de QUALQUER Estado. Nossa agitação deve expor a farsa dos dois lados e mostrar que a única luta válida é a luta pela libertação total, horizontal e federalista.

Dessa forma, não nos importa quem vencer esta batalha de gigantes. Nosso campo é o do povo em luta, contra todos os senhores. Aproveitemos a crise de hegemonia para semear o caos criativo da Anarquia. Enquanto eles disputam o mundo, nós o construiremos nas ruínas do seu poder. Nossa resposta ao embate imperialista não deve ser torcer por um lado, mas intensificar o ataque contra ambos, transformando nosso ideal em movimentos, ações e agitações que preparem o terreno para um mundo verdadeiramente livre, sem mestres nem imperadores. A luta continua, e ela é contra TODOS os Estados!

Liberto Herrera.

> Imagem: Desfile militar do Dia da Vitória da China de 2025

agência de notícias anarquistas-ana

lua na neve
aqui a vida vai ser jogada
em breve

Kikaku

[Grécia] Atenas: Ação de solidariedade com os rebeldes na Indonésia

Durante o verão, protestos em massa ocorreram em várias partes da Indonésia contra novas medidas de austeridade, aumentos de impostos e aumentos salariais para membros do parlamento, cujos salários são 30 vezes maiores que o salário mínimo.

Em 28 de agosto, durante um protesto, um veículo blindado da polícia atropelou Affan Kurniawan, de 21 anos, matando-o. Affan trabalhava como entregador e estava a caminho de entregar comida. Depois disso, a violência eclodiu.

Uma revolta sem precedentes em todo o país. Delegacias de polícia foram destruídas, parlamentos locais e prédios governamentais foram incendiados e casas de políticos foram saqueadas. O Estado, para ganhar tempo, declara que reduzirá os privilégios da elite política, ao mesmo tempo em que intensificará a repressão e levará o exército às ruas. Até o momento, há 10 mortos, dezenas de desaparecidos, centenas de feridos e milhares de presos. Apesar das promessas do Estado e da repressão, a chama da revolta parece não se apagar.

Os protestos e confrontos em massa na Indonésia são um lembrete brilhante para os oprimidos deste mundo de que, mesmo nos tempos mais difíceis e sob os regimes mais severos, a busca de liberdade e igualdade não pode ser sufocada. Nas dezenas de revoltas dos últimos anos em todo o planeta, a busca de um mundo melhor respira vida.

É crucial intensificar a luta em nível global. Construir relações de solidariedade e camaradagem além das fronteiras, trocar experiências, aprender uns com os outros, lutar lado a lado contra toda autoridade. Espalhar a chama da rebelião por todo o planeta, rumo à revolução social global, ao fim de toda autoridade. À criação de um mundo de solidariedade, igualdade, liberdade e à anarquia.

Atendendo ao apelo dos nossos camaradas da Palang Hitam Anarkis (Cruz Negra Anarquista), realizamos uma intervenção com faixas e folhetos na embaixada da Indonésia na quinta-feira, 11 de setembro.

Da Indonésia ao Nepal, solidariedade aos rebeldes.

Da Indonésia à Palestina, que a chama da rebelião se espalhe por toda a Terra.

Coletivo Anarquista Acte

acte@riseup.net/acte.espivblogs.net

agência de notícias anarquistas-ana

Cadeira vazia no trono –
o povo senta no chão,
mas ergue a festa.

Liberto Herrera

[Espanha] Declaração sobre o genocídio contra o povo palestino

Da CNT-AIT Madrid, declaramos nosso mais firme apoio ao povo palestino frente ao seu genocídio e à ocupação de seu território. Não podemos ficar calados sem denunciar o genocídio e o crime cotidiano que o povo palestino sofre. Não são necessários muitos exemplos para comprovar isso. Desde outubro de 2023, mais de 60.000 palestinos foram assassinados pelo estado sionista de Israel. Também não podemos ficar calados ante a violação sistêmica de todos os direitos, inclusive o de informação, com o assassinato de cerca de 200 jornalistas e trabalhadores da comunicação. Seu assassinato é outro exemplo de como o estado sionista de Israel quer silenciar as vozes dos palestinos, ocultar seus crimes e perpetuar e ampliar a ocupação dos territórios palestinos, como vem fazendo desde meados do século XX.

Diante da atual atrocidade vivida em Gaza, não é necessário relatar mais exemplos ou provas para qualificar a situação como um genocídio. Destacamos e condenamos ainda as ações de ocupação e assassinatos produzidos pelo sionismo israelense na Cisjordânia. Por tudo isso, chamamos ao boicote das empresas que colaboram com o estado sionista de Israel e com o genocídio palestino, empresas que são apontadas pelo movimento Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS).

Da mesma forma, apontamos para os estados cúmplices e artífices deste genocídio. Sem o apoio e a legitimidade que concederam ao estado sionista de Israel, não se teria chegado a esta situação. Não importam as declarações simbólicas que fazem em direção ao povo palestino, porque continuam e vão continuar alimentando o monstro sionista e reprimindo quem denuncie o genocídio que está cometendo.

Por último, mas não menos importante, também condenamos aqueles genocídios que estão sendo cometidos atualmente e que têm menos holofotes midiáticos, mas não por isso são menos dolorosos e criminosos. Estes genocídios são os de Darfur (Sudão), os das regiões de Kivu do Norte, Ituri, Kivu do Sul e Tanganica da República Democrática do Congo, os produzidos na Nigéria, no Afeganistão e em Tigray (Etiópia), assim como aqueles cometidos contra os rohingya (Mianmar) e contra uigures e outras etnias muçulmanas na China.

Fim do Genocídio Palestino!
Fim da ocupação dos territórios palestinos!
Boicote a Israel!

Fonte: https://madrid.cntait.org/no-al-genocidio-pueblo-palestino/

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

O vento é o tempo:
sopra varre levanta lambe
desfaz o que foi feito.

Thiago de Mello

Rebeliões conectadas | Por que One Piece é o símbolo das revoltas da Geração Z?

Por Gorgon Eloquentia Verax

Rebeliões recentes no Nepal, na Indonésia e em outros países asiáticos têm um símbolo inesperado: a bandeira pirata de One Piece. A caveira com chapéu de palha, marca dos “Piratas do Chapéu de Palha”, aparece entre faixas contra corrupção, censura e abuso de poder.

Não é só referência nerd. Para muitos jovens, ela expressa liberdade melhor do que qualquer bandeira partidária. Eles cresceram vendo Luffy e sua tripulação enfrentando governos autoritários, corporações violentas e desigualdade. A mensagem é clara: seguir o próprio caminho, romper hierarquias, lutar contra injustiça.

Essa geração não quer herdar símbolos ideológicos que já chegam carregados de disputas e burocracias. As velhas bandeiras (de partidos, sindicatos, movimentos institucionalizados) perderam força por estarem associadas a chefias, negociações de gabinete e promessas que não mudam a vida cotidiana. As bandeiras comunistas não funcionam, pois muitos jovens estão desiludidos com o legado desses movimentos; e as do anarquismo foram historicamente perseguidas e marginalizadas. Um ícone vindo da cultura pop, sem dono oficial, permite união imediata. Ele comunica resistência e solidariedade sem dividir quem está na rua por rótulos políticos.

No Nepal, a bandeira pirata apareceu em protestos contra leis que tentam controlar redes sociais e criminalizar críticas ao governo. Na Indonésia, foi levantada por caminhoneiros e estudantes insatisfeitos com preços, impostos e desigualdade. Em outros lugares, virou forma de driblar repressão: um pano de mangá é mais difícil de censurar que um estandarte abertamente político.

Autoridades têm reagido, chamando o símbolo de “antipatriótico” e confiscando bandeiras. Mas a cada tentativa de repressão, a imagem se espalha ainda mais.

Para quem vive e constrói práticas libertárias, o recado é nítido: quando as estruturas tradicionais perdem credibilidade, novos sinais surgem. A caveira com chapéu de palha não é só um meme; é o aviso de que a juventude quer liberdade real, sem chefes nem rótulos, e que está disposta a criar seus próprios símbolos para defendê-la.

agência de notícias anarquistas-ana

Vidraça quebrada –
o reflexo do opressor
se esvai em estilhaços.

Liberto Herrera

No Nepal, fogo… No Brasil, hmmm…

No Nepal, a população se revoltou com a vida de luxo de políticos, autoridades, grandes empresários… No Brasil, em pleno Estado Democrático de Direito (sic), muitos políticos, autoridades e grandes empresários também vivem uma vida de luxo… Mas…

// Recentemente Roberto Irineu Marinho, um dos principais empresários do Brasil e herdeiro do Grupo Globo, comprou o superiate Feadship Project 827, avaliado em cerca de US$ 180 milhões (equivalente a mais de R$ 1 bilhão). O iate, com 70 metros de comprimento, é um dos mais avançados do mundo, construído pelo estaleiro holandês Feadship e equipado com propulsão híbrida para operação silenciosa e sustentável. \\

VAMOS ROMPER O SILÊNCIO!

QUE O MEDO MUDE DE LADO!

ABAIXO O ESTADO E O CAPITALISMO!

LIVRES E SELVAGENS!

VIVA A ANARQUIA!!!

agência de notícias anarquistas-ana

Paz não é silêncio.
É o trovão que desaba
sobre tribunais.

Liberto Herrera

[EUA] A morte de Charlie Kirk e a violência do capitalismo

Charlie Kirk está morto – o fundador da Turning Point USA, o homem que passou uma década criticando “marxismo cultural”, estudantes, pessoas queer e trabalhadores em greve, foi baleado no pescoço enquanto discursava em um palco em Utah. Diante da plateia ao vivo, sangrou até a morte. Apoiadores se apressaram em transformá-lo em mártir da causa da “liberdade de expressão”. Já os inimigos, ficaram divididos. Alguns comemoraram abertamente, outros se preocuparam com o que isso significaria para a esquerda. O Estado, como era de se esperar, agiu rapidamente, caçando o atirador, prometendo “justiça” e, discretamente, começando a lançar mão da retórica familiar da lei e da ordem.

Da perspectiva anarco-comunista, este momento não se resume só à morte de um homem. Diz respeito ao mundo que produziu tanto Charlie Kirk quanto o homem que o matou. Trata-se da violência sempre presente do capitalismo, do monopólio da força pelo Estado, da forma como os antagonismos políticos se transformam em derramamento de sangue aberto. É sobre o que acontece quando uma sociedade impregna todas as interações de hierarquia, coerção, alienação e humilhação, e depois finge estar chocada quando alguém puxa o gatilho.

Comentadores liberais falam sobre esse tiroteio como se fosse uma ruptura grotesca, estranho ato que invade a democracia pacífica. Os anarquistas, porém, sempre entenderam que a violência não é a exceção, mas a regra. É o ruído de fundo da sociedade de classes. O próprio trabalho assalariado é imposto pela violência. Se você se recusar a trabalhar, passará fome, e será policiado ou preso. Todo o edifício da propriedade privada repousa sobre a ameaça de violência e a força.

O que aconteceu em Utah não foi uma aberração impensável. Simplesmente, foi uma expressão mais direta da mesma violência que o próprio Kirk defendia sempre que zombava dos professores em greve, pedia repressão policial, elogiava as batidas da ICE ou as guerras imperiais dos EUA. Isso não significa que o seu assassinato pudesse ser comemorado, mas não podemos ignorar que Kirk era um arquiteto da violência ideológica, um homem que usava a sua vasta plataforma para normalizar a opressão, endurecer corações em relação aos pobres, os racializados, os queer, a classe trabalhadora.

O jovem que puxou o gatilho, Tyler James Robinson, não era um vilão de desenho animado, mas um produto dessa mesma sociedade. Ele teria gravado slogans antifascistas nas suas balas – “Ei, fascista! Pega essa!” – e feito referência à música “Bella Ciao”. Não foi um ato aleatório de caos, foi um ato conscientemente político, moldado pela cultura da internet, pelas guerras de memes e pelo longo conflito ideológico nos EUA.

A questão não é se Robinson era “louco” ou “malvado”. A questão é por que tantas pessoas são levadas a um ponto em que a morte parece ser a única resposta – a morte dos inimigos ou a sua. Os Estados Unidos são uma panela de pressão, com a desigualdade atingindo graus históricos, a sindicalização nunca tão baixa, os trabalhadores pendurados em dívidas e precariedade, as moradias caríssimas, sem acesso à Saúde e com o clima em colapso à sua volta.

Juntando a isso o ritmo constante da política reacionária dizendo que tudo o que é progressista ameaça, que toda pessoa trans é predadora, que todo migrante é invasor. Acrescentando a insistência liberal de que o sistema é basicamente sólido, que reformas incrementais nos salvarão, e tudo resulta em uma geração preparada para o desespero e a ruptura.

Sem enganos: o Estado usará a morte de Kirk como combustível para a repressão. Os apelos por “unidade” e “paz” serão rapidamente traduzidos em vigilância ampliada, mais poderes para a polícia e penas mais severas para protestos. Cada reunião de estudantes de esquerda, cada marcha antifascista, cada comício sindical será pintado como uma potencial célula terrorista. Os centristas liberais se unirão à extrema direita para exigir calma, civilidade e segurança, o que, na verdade, significa docilidade, silêncio e obediência.

É por isso que os anarquistas precisam ser claros. Não apelamos a atos individuais de assassinato, não porque os poderosos não mereçam ser desafiados, mas porque tais atos quase sempre fortalecem a própria máquina que estamos tentando desmantelar. No anarquismo, a “propaganda pela ação” tem longa história no anarquismo e nos ensinou que atos isolados de violência são facilmente cooptados pelo Estado, transformados em desculpas para prender organizadores, fechar espaços radicais e criminalizar a dissidência.

É fácil, em momentos como este, cair na linguagem da vingança, dizer que Kirk “merecia isso”, e que foi justiça cármica. O anarco-comunismo, entretanto, precisa oferecer algo mais profundo do que vingança. A nossa tarefa é imaginar um mundo no qual até mesmo os inimigos não precisem mais ser inimigos, um mundo onde Charlie Kirk nunca teria se tornado um porta-voz dos guerreiros culturais bilionários, e no qual Tyler Robinson nunca teria se tornado tão alienado e furioso que fosse capaz de matar. Isso significa compreender as forças que moldaram esses dois homens, e trabalhar para abolir essas forças. Significa construir uma sociedade na qual ninguém seja levado ao ponto de acreditar que a única maneira de mudar o mundo é com um rifle de precisão.

Agora, a tarefa é construir organização. Não recuar para o moralismo, não desistir e declarar que tudo isso é uma tragédia incompreensível e, certamente, não deixar que o Estado monopolize a narrativa. Precisamos construir as estruturas que tornam a violência menos provável, não por meio de sermões pacifistas, mas por meio de ajuda mútua concreta, sindicatos de inquilinos, comitês no local de trabalho, fundos de solidariedade, clínicas gratuitas e educação radical.

A energia que move alguém como Robinson precisa ser redirecionada à luta coletiva, à ação direta em massa, à construção de um mundo que torne irrelevantes os Charlie Kirks do futuro. Uma única bala não pode abolir o capitalismo, mas uma greve geral pode. Uma onda de greves por causa de aluguel pode. Uma recusa em massa em lutar nas guerras do Estado, em pagar as suas dívidas, em obedecer aos seus chefes, isso pode.

A morte de Charlie Kirk é um sintoma, e não é solução. A solução é o que construímos juntos nos locais de trabalho, bairros, nos movimentos. A solução é a solidariedade. A solução é o poder coletivo. A solução é um mundo no qual a vida vale a pena ser vivida por todos, não só pelos ricos, não apenas pelos reacionários mais barulhentos de cima de um palco. Isso significa acabar com a ordem econômica que exige a pobreza, acabar com o Estado que a impõe, acabar com as ideologias que nos mantêm divididos. Significa desmantelar o aparato de violência de forma tão completa que ninguém mais ache que precisaria pegar em armas para ser ouvido.

Se queremos realmente acabar com a violência política, precisamos nos empenhar seriamente em acabar com o capitalismo. Qualquer coisa a menos que isso é ficar só lidando com os sintomas.

Fonte: https://theslowburningfuse.wordpress.com/2025/09/13/charlie-kirks-death-and-the-violence-of-capitalism/

Tradução > CF Puig

agência de notícias anarquistas-ana

bateu o vento
perfume nas mãos
jasmim no chão

Bashô

[Alemanha] Protesto contra o Congresso da Indústria de Cruzeiros em Hamburgo   

Hamburgo, 11 de setembro de 2025. Desde as 8h, 11 ativistas do grupo de ação Smash Cruiseshit protestam em frente à entrada do pavilhão de exposições de Hamburgo. O Congresso da Indústria de Cruzeiros “Seatrade Europe” está sendo realizado no local. Do telhado do edifício, os ativistas baixaram uma faixa com os dizeres “Parem os Cruzeiros”. Ao mesmo tempo, dois ativistas subiram em mastros de bandeira e desenrolaram outra faixa. Com essa ação, os ativistas pretendiam denunciar as atividades prejudiciais ao clima da indústria de cruzeiros e chamar a atenção para os problemas causados ​​por essa indústria.

“O que está acontecendo aqui discretamente, dentro da conferência, nada mais é do que a maximização do lucro de alguns, às custas dos trabalhadores e do meio ambiente. Acreditamos que uma indústria tão prejudicial não deveria poder se esconder nesses espaços e operar sem ser perturbada. É por isso que estamos aqui para garantir que o que está por trás dessa indústria também seja visível de fora”, explica o ativista Alex P. antes de subir no mastro da bandeira.

Cruzeiros são uma das formas de férias mais prejudiciais ao clima. Além das emissões significativas de CO2, o uso predominante de óleo combustível pesado, tóxico e prejudicial ao clima, leva à alta poluição por enxofre nos oceanos. Os navios de cruzeiro também produzem grandes quantidades de plástico e outros resíduos. Em resumo, viagens de cruzeiro resultam, entre outras coisas, no aumento da temperatura e do nível do mar, na acidificação dos oceanos, na perda de biodiversidade e na poluição ambiental com microplásticos e material particulado. 

As empresas de cruzeiros estão cada vez mais recorrendo a alternativas supostamente mais ecológicas. O gás natural liquefeito (GNL) é cada vez mais utilizado como combustível. O GNL consiste principalmente de metano, um gás de efeito estufa com uma pegada de carbono de 20 anos 80 vezes pior que a do CO2. Durante a extração, liquefação e transporte, o metano escapa para a atmosfera. O fracking também está sendo cada vez mais utilizado para extração. Isso envolve a injeção de produtos químicos tóxicos em camadas profundas de rocha, utilizando grandes quantidades de água, para extrair o gás.

“A indústria de cruzeiros está tentando criar uma imagem verde por meio do GNL. Na realidade, GNL significa água potável contaminada, riscos à saúde de humanos, animais e de todo o meio ambiente… O GNL extraído por fraturamento hidráulico é frequentemente extraído em terras de comunidades indígenas, contra sua vontade e resistência. Essas continuidades neocoloniais precisam acabar!”, afirma o ativista Mo R.

Além dos impactos ambientais, os ativistas também se preocupam com as condições de trabalho desumanas na indústria de cruzeiros. Eles enfatizam que muitas pessoas que trabalham em navios de cruzeiro recebem salários bem abaixo do salário mínimo aplicável. No transporte marítimo global, é prática comum que a maioria dos navios não navegue sob a bandeira do país em que sua empresa de navegação está sediada ou do país que visitam regularmente. Em vez disso, as empresas de navegação registram seus navios onde é mais lucrativo para elas. Navegar sob a bandeira da Libéria, Panamá, Itália ou Malta permite que paguem impostos baixos e contornem leis trabalhistas protetivas, padrões sociais ou requisitos ambientais por meio de regulamentações locais ou padrões mais baixos.

“A maioria dos trabalhadores no convés trabalha em condições de trabalho gritantes por salários de fome. As companhias de navegação usam a liberdade de escolher a bandeira sob a qual navegam para burlar as regulamentações trabalhistas e explorar ainda mais os trabalhadores. Qualquer um que resista a isso deve esperar ser demitido e perder seu sustento. Essas são condições sob as quais ninguém deveria trabalhar”, diz o ativista Quinn F., descrevendo as condições de trabalho.

O protesto dos ativistas também se dirige aos participantes do “Hamburg Cruise Days” deste fim de semana, que eles descrevem como “o maior festival de cruzeiros da Europa”. De sexta-feira a domingo, são esperados até 600.000 visitantes, que serão presenteados com oito navios de cruzeiro diferentes. Haverá também uma programação semelhante à de um festival.

“O Cruise Days serve como uma grande plataforma de publicidade para a indústria de cruzeiros. Com programas como fogos de artifício e uma série de mentiras sobre sustentabilidade, as partes interessadas estão polindo, manipulando sua imagem. Para nós, é claro: não pode haver cruzeiros em um mundo climático justo. Com o nosso protesto, nos opomos à exploração da indústria de cruzeiros e defendemos um mundo justo para todos”, afirma a ativista Jessie O.

O programa “Smash Cruiseshit” continua nos próximos dias: um encontro de networking para ativistas acontecerá na sexta-feira. No sábado, o grupo convida todos para uma conferência anti-cruzeiros, que será aberta ao público no campus da Universidade de Hamburgo. No domingo, haverá outro protesto animado — desta vez contra os “Dias de Cruzeiros de Hamburgo”.

E-mail: Smashcruiseshit@proton.me

Telefone: 015213680617

Instagram: @smashcruiseshit

Mastodonte: @smashcruiseshit

X: @smashcruiseshit

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agência de notícias anarquistas-ana

Entre haicais e chuva
Súbita inspiração:
Um trovão.

Sílvia Rocha

[Itália] Hoje a rebelião é um dever ético        

Editorial / Semi sotto la neve, nº 11

A rebelião é justa. Hoje, a rebelião é um dever ético. É o que fazem os estudantes sérvios, as massas turcas e georgianas, os opositores de Israel e do governo de Netanyahu, muitos cidadãos dos Estados Unidos da América e alguns, embora poucos, mas valentes residentes de Gaza, as mulheres no Irã, assim como tantas outras pessoas em diferentes lugares do planeta, inclusive em nossa realidade europeia, em distintos contextos geográficos, culturais e políticos: homens e mulheres que se rebelam, nos questionam sobre o presente e nos fazem imaginar um futuro diferente.

Desde a publicação do primeiro número desta revista, em fevereiro de 2022, já se passaram alguns anos, mas os acontecimentos históricos foram numerosos, rápidos e impactantes, gerando novas perguntas, novos desafios e também novas possibilidades para nós.

O caminho que escolhemos conscientemente para potencializar os aspectos proativos e positivos que ressaltam as experiências libertárias atuais, o esforço por encontrar e questionar todas essas realidades espontâneas, antiautoritárias e mutualistas que prefiguram outra forma de nos relacionarmos socialmente, continuam sendo o sentido mais profundo e importante de nossa revista. Não esqueçamos nem negligenciemos, contudo, a importância e a opção estratégica da revolta permanente, individual e coletiva, a ruptura do imaginário dominante, a vontade de opor não apenas a resiliência, mas também a resistência diante de uma deriva autoritária e perigosamente totalitária da política contemporânea. É por isso que, ainda que com um espírito crítico e autocrítico, queremos nos considerar participantes ativos em todo movimento que lute contra qualquer forma de dominação, seja ela visível ou nova e oculta.

A beleza e a energia criativa das rebeliões espontâneas representam para nós o valor acrescentado que ilumina e alimenta a esperança. Mas tudo isso não deve nos enganar nem nos levar a buscar atalhos que, quase sempre, demonstraram gerar novos poderes e novas desigualdades, uma vez consolidadas em sistemas autoritários. Não queremos esquecer o profundo significado da profecia de Étienne de La Boétie quando, já em 1500, nos advertiu sobre o verdadeiro espectro da ‘servidão voluntária’. Hoje, numa época em que assistimos a uma busca frenética e irracional por novos líderes, novos homens (ou mulheres) no comando, novos homens santos e novos deuses, devemos contrapor a isso uma visão ampla e aberta, que devolva às pessoas o extraordinário poder dos sonhos, a possibilidade concreta de viver nossas relações humanas segundo práticas de solidariedade, respeito, autonomia, liberdade e amor.

Sem uma ‘visão’, o pragmatismo necessário e indispensável se traduz em pobreza e na prática do óbvio, gerando e alimentando uma política de slogans e mesquinharia, típica de nossos sórdidos governantes. Mas essa esperança não é uma ilusão, nem uma evasão mística da crua realidade, e sim uma consciência que, como Colin Ward repetia com frequência, nos faz perceber que uma sociedade totalmente totalitária não pode existir, assim como também não pode uma sociedade completamente libertária. Ao contrário, dentro dessas formas de agregação humana persistem espaços, interstícios e momentos em que a liberdade e a tirania se apresentam de maneira irredutível e destrutiva. E é isso que faz com que nossas ações em favor da liberdade encontrem sentido, a qual deve se expandir, mas também se defender em suas formas, por mais incompletas que sejam, diante da ameaça de uma dominação invasora.

Temos o privilégio — sim, porque foi o acaso que nos trouxe a esta parte do mundo — de viver em uma zona geográfica como a Europa, e devemos ser conscientes disso. Mas isso tem pouco a ver, em perspectiva, com nossa ideia de habitar uma terra sem nos tornarmos seus donos. Devemos sempre nos pensar como ‘estrangeiros residentes’ e relançar uma ideia, inclusive de Europa, distinta da oficial e institucional de uma nova superpotência entre outras. A saída é o federalismo integral, que restitui a centralidade do processo de tomada de decisões aos níveis mais baixos possíveis, que visualiza uma ‘divisão em vez de uma fusão’ (para dizê-lo novamente com as palavras de Colin Ward), uma pluralidade de sociedades e não uma sociedade unificada e de massas, um federalismo integral que inclui a gestão compartilhada dos bens comuns, formas avançadas de mutualismo, relações de apoio mútuo, a valorização da diversidade e muito mais.

Considerando tudo isso, a partir da nossa pequena contribuição, continuamos oferecendo aos nossos leitores — uma semente constante de uma vida plena e livre — reflexões, perspectivas, conversas e artigos que se inserem nesse caminho difícil, arriscado, mas livre. Carecemos de contribuições e reflexões profundas sobre muitos temas, e por isso estamos sempre em busca de novos colaboradores que possam colocar sua sensibilidade e experiência a serviço de uma causa comum. Somos uma revista de tendências, mas também queremos ser um viveiro de inspiração, livre de polêmicas estéreis e de dogmatismo.

Neste número, uma amiga (Silvia Rizzo) e dois amigos (Pier Paolo Casarin e Tibor Lepel) compartilham três experiências diferentes: uma de acolhimento e apoio a estrangeiros por meio de outros que, com seu trabalho solidário cotidiano, rejeitam pensamentos e comportamentos de intolerância violenta; um estudo e pesquisa eficaz e estimulante, mas também de solidariedade ativa e não verbal, em um lugar — uma prisão de menores — de sofrimento e violência; e, por fim, um projeto ecológico na Alemanha, com voluntários, que oferece um exemplo de prática autogerida, solidária e de trabalho. O tema da prisão e suas possíveis alternativas, um tema especialmente importante para nós, é o eixo da conversa que mantemos com Stefano Anastasia, garante das pessoas sujeitas a medidas restritivas de liberdade para a Região do Lácio e porta-voz da Conferência de Garantes Territoriais de Pessoas Privadas de Liberdade. Tendo em mente que sociologicamente se define como ‘desvio social’ é, na realidade, também produto de condições de penúria social, cultural e econômica, publicamos um ensaio de Guido Candela sobre a pobreza na Itália de hoje que, para além de números frios, é um alerta e um estímulo para lutar por reduzir as desigualdades na medida do possível e o mais rapidamente possível. Outros três artigos de fundo enriquecem este número: dois sobre os temas da ciência, da medicina e das diversas posturas que a dramática e recente epidemia de Covid também desencadeou em nosso âmbito libertário (Pamela Boldrin e Francesco Spagna). Por fim, uma valiosa contribuição de Giorgio Fontana que nos questiona sobre o significado mais profundo dessas ‘sementes’ que queremos que germinem livremente. Por outro lado, retomamos com um artigo de Tomás Ibáñez a discussão sobre o que chamamos de ‘anarquismo proativo e positivo’ (discussão aberta por Francesco Codello no número 8 desta revista), uma visão em parte diferente, mas certamente enriquecedora, dessa reflexão que nos merece especial atenção. As duas genealogias estão dedicadas respectivamente a Elisée Reclus (Francesco Berti) e a Federica Montseny (Valeria Giacomoni). Por fim, uma contribuição de Francesco Spagna sobre Bob Dylan e outra de Mariangela Mombelli e Enrico Ruggeri, que continuam a resenhar filmes que consideramos interessantes para nossos leitores. Em resumo, mais material para discutir, questionar e relançar. E tudo isso mantendo uma direção ‘obstinada e contrária’, mas também, e sobretudo, útil para alimentar um sonho e uma esperança de mudança real e profunda em nossos corações e mentes.

Fonte: https://redeslibertarias.com/2025/08/22/hoy-la-rebelion-es-un-deber-etico/

Tradução > Paymex

agência de notícias anarquistas-ana

O vaga-lume à noite
acende sua luz.
Pisca-pisca.

Aprendiz