O grupo espanhol de música eletrônica experimental Poupées Électriques está em turnê realizando o espetáculo “CNT 1910-2010 Viva a Utopia” e acaba de lançar juntamente com a Fundação de Estudos Libertários Anselmo Lorenzo um DVD, que traz a atuação do grupo em diversos eventos em todo o país. A seguir, entrevista que o Poupées Électriques concedeu à ANA.
Agência de Notícias Anarquistas > De onde vem o nome Poupées Électriques?
Poupées Électriques < Poupées Électriques é o nome da primeira apresentação que os futuristas italianos realizaram em 1909. O futurismo italiano foi o início da arte do século XX e a ruptura com a arte tradicionalista anterior. Foi um movimento convulsivo e seus seguidores tinham abordagens políticas muito opostas: enquanto alguns italianos e russos tomaram posicionamentos anarquistas e comunistas, outros, porém, eram seguidores do fascismo italiano. Este movimento cultural e artístico tem sido uma inspiração para nós, por seu desafio e ruptura, e a busca de novas formas de expressão.
ANA > E como se iniciou a história do Poupées Électriques na cena musical eletrônica alternativa?
PE < Poupées Électriques começaram sua história há mais de 6 anos no cenário da música eletrônica com uma abordagem de auto-gestão (Do It Yourself), muito próximo do punk independente e underground eletroacústico. A idéia principal era expressar nossas idéias sem utilizar os meios convencionais usuais e distantes das correntes eletrônicas mais comerciais.
ANA > Vocês tiveram alguma banda ou escritor como inspiração para criar o grupo?
PE < Nossas influências foram muitas ao longo dos anos. Desde escritores como Malatesta, Hakim Bey, Guy Debord, Chomsky…, pintores como Pollock, Balla, Duchamp, Boccioni… e músicos como John Cage, Nurse With Wound, Crass, Stockhausen, Russolo, etc., o Cabaret Voltaire por Hugo Ball, os movimentos vanguardistas anarquistas, as correntes naturistas e veganas… Todas essas tendências foram uma grande influência sobre as nossas abordagens criativas e filosóficas.
ANA > Quais as vantagens e desvantagens de fazer um trabalho independente?
PE < A principal vantagem está em ter o controle em todos os momentos de sua criação. Não obedecemos a interesses de empresas e multinacionais que compreendem a criação humana como um produto comercial. A distribuição se torna mais caro para ter que gerenciar a si mesmo e o volume de unidades reduz a capacidade que você tem que responder a essa distribuição. Mas isso significa também um maior compromisso com seu projeto e em sua produção.
ANA > E qual a relação da banda com a Internet, as redes sociais…
PE < Hoje em dia as redes sociais e a Internet facilitam a comunicação, a distribuição e a publicidade a um custo muito baixo. É uma grande vantagem para a criação e distribuição de um produto independente e para uma banda sem fins lucrativos como a nossa. Lidar com o público é mais personalizado e não tem que depender de um selo comercial para a publicidade.
ANA > E com a Anarquia?
PE < Nossas influências são visivelmente libertárias. Os dois principais membros e regulares do Poupées Électriques são militantes da CNT (Confederação Nacional do Trabalho, o histórico sindicato anarcossindicalista espanhol) e ambos também são vegans. Temos muita relação com os movimentos libertários a nível nacional e internacional, bem como com coletivos de direitos dos animais, livre opção sexual, etc.
ANA > Os primeiros trabalhos de vocês, “Caos Es Lo Primero” e “End Of Diversion”, tratavam de que assuntos?
PE < “Caos Es Lo Primero” era um conjunto de peças muito diferentes com inspiração nas vanguardas artísticas do início do século XX (futurismo, dadaísmo, surrealismo), utilizando ferramentas atuais e recuperando algumas esquecidas (como o “intonarumori” de Luigi Russolo).
“End Of Diversion” foi um show especial na comemoração ao centenário do Manifesto Futurista de 1909. Neste trabalho abordamos o declínio do sistema capitalista e da cultura de entretenimento, e de como os capitalistas querem nos vender uma nova versão: o capitalismo 2.0. Para este trabalho, inspirado no ruidismo futurista, contamos com a participação de atores da Cia. De Teatro Espiral.
ANA > Sabemos que vocês participaram de uma turnê por toda Espanha chamada “CNT 1910-2010 Viva a Utopia”. O que mais marcou vocês neste evento? Destacaria alguma apresentação?
PE < Para a comemoração do Centenário da CNT preparamos um espetáculo eletroacústico audiovisual sobre os últimos cem anos do movimento libertário espanhol. Para isso, fizemos um estudo sobre os antigos filmes do SIE (Sindicato Independente de Espetáculos) e vários documentários sobre o movimento operário. Utilizando os mais recentes avanços em software e tecnologia, extraímos áudio e imagens, para criar uma “escultura sonora” que pudéssemos acompanhar com instrumentos eletrônicos (osciladores, teremim, sintetizadores, percussão digital…) e que tentassem levar o espectador a fazer um apanhado histórico sobre um movimento que marcou a realidade deste país durante o século passado. Nossa intenção tem sido levar ao maior número de localidades possíveis e, após 14 meses de sua estréia em 1º de maio de 2010, fomos capazes de interpretá-lo em Madri, Barcelona, Adra, Burgos, Logroño, La Cabrera, Lorca, Alcoi, Córdoba, Ciudad Real, Guadalajara, e estamos dispostos a levá-lo onde quer que nos solicitem. Cada apresentação foi única e incomparável e nos permitiu conhecer pessoas maravilhosas, que nos mostrou fielmente que a realidade pode ser mudada.
ANA > Eventualmente vocês usam vocais nas apresentações, ou só instrumentos eletrônicos?
PE < Este é o primeiro show do Poupées Électriques onde usamos a voz como o tema principal da obra. A intérprete vai direcionando o público ao marco histórico que representamos, e termina interpretando o tradicional hino anarquista “Às barricadas”. Para isso escolhemos uma soprano amiga nossa, que também é neta de Cenetistas.
Além disso, no Poupées Électriques interagimos com outros instrumentos, como piano e flauta, nos apoiando tanto no eletrônico com o formato de software como com osciladores analógicos, sintetizadores digitais e teremim digital. Nossa música é um resumo dos últimos cem anos na tecnologia aplicada à música.
ANA > A imagem é um elemento de grande importância no trabalho de vocês, certo?
PE < É fundamental, já que uma atuação do Poupées Électriques não é um concerto usual (como poderia ser uma performance de uma banda de rock), mas sim uma situação em que pretendemos introduzir o espectador e que a experiência, para bem ou mal, é uma série de sensações pessoais sobre o que ele percebe. Para criar essas sensações, imagens, sincronizadas com a música, desempenham um papel fundamental, especialmente quando se aborda um cenário histórico como o do nosso show atual.
ANA > Vocês estão lançando agora um DVD. Como este trabalho está estruturado? São imagens de shows?
PE < Recentemente realizamos, juntamente com Fundação de Estudos Libertários Anselmo Lorenzo, o lançamento de um DVD com a performance realizada nos atos do Xº Congresso da CNT, em Córdoba, em dezembro de 2010. Além disso, o DVD contém uma revisão de todas as atuações que temos feito em todo o estado e uma alusão para os nossos espetáculos anteriores (“Caos Es Lo Primero” 2006-2009, “End of Diversion” 2009-2010). Além disso, o DVD é acompanhado de um livreto de capa dura, com textos e imagens dos concertos que temos feito.
ANA > E como foi o ato de homenagem aos compas assassinados pelo fascismo que a CNT realizou neste último sábado em Barcelona do qual participaram? Deve ter sido um evento muito emotivo, não?
PE < Ele foi o evento mais emocionante que já vimos, e foi um verdadeiro privilégio e uma honra poder participar nesta homenagem aos homens e mulheres que deram suas vidas pela liberdade e pela revolução social. É importante que a memória não caia no esquecimento e foi gratificante ver várias gerações de pessoas compartilham o ato. Queremos agradecer a CNT Barcelona e todas as pessoas que tornaram isso possível.
ANA > E quais os projetos futuros?
PE < Estamos atualmente ainda realizando o show “CNT 1910-2010 Viva a Utopia”, embora já começamos a preparar o que será o próximo show: Poupées Électriques, a obra original de FT Marinetti, do nosso particular ponto de vista e com as ferramentas tecnológicas atuais. Continuaremos também trabalhando em outros projetos paralelos, como RUSTUF, um duo de eletropunk vegan com temática animalista (www.rustuf.com).
ANA > Algo mais?
PE < Obrigado pelo seu interesse e por difundir nossa música. E, obrigado especialmente por divulgar e difundir os ideais libertários.
Saúde e revolução social.
Mais infos:
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!