A agrupação anarquista “Mujeres Libres” conseguiu, entre 1936 e 1939, que 20.000 mulheres se formassem profissionalmente, conhecessem seu corpo e questionassem seu papel na sociedade.
JENNIFER TEJADA DEWAR
MADRID – Acabar com a ignorância, a escravidão e a submissão sexual eram os principais objetivos de Lucía Sánchez Saornil, Mercedes Comaposada e Amparo Poch y Gascón, as impulsionadoras de “Mujeres libres”, uma revista cultural e de documentação social que viveu entre os anos 1936 e 1939. Pouco depois criariam a agrupação anarquista vinculada à CNT com o mesmo nome, através da qual levariam a cabo diferentes projetos para lutar pela emancipação da mulher frente à relação hierárquica que sofriam na sociedade.
Este fim de semana [outubro 2015] no Ateneu de Madrid celebraram-se as jornadas Mujeres libres e feminismo em tempos de mudança, organizadas pela Fundação Andreu Nin e a Fundação de Estudos Libertários Anselmo Lorenzo, vinculada à CNT. Na mesa redonda A educação como via da emancipação da mulher, se contou com a participação de Laura Sánchez Blanco, professora de História Moderna na Universidade de Salamanca, que destacou o papel que teve “Mujeres Libres” na luta pela igualdade nos anos 30.
“Milhares de mulheres tem que reconhecer sua própria voz porque foi silenciada pela história”. As palavras de Sánchez Saornil descrevem o objetivo da publicação nascida em uma época na qual o analfabetismo feminino superava 47% e a mulher se via obrigada a estar em um segundo plano, sempre subordinada ao homem. A revista pretendia atraí-las ao movimento libertário e ensinar-lhes os passos que tinham que seguir para ser livres. A agrupação, com aulas teóricas e práticas, capacitava a mulher com a formação que requeria para ser mais independente.
A educação tripla vs a tripla escravidão
A escritora e jornalista María Ángeles García-Maroto também esteve na mesa redonda, onde defendia a ideia de que a educação “pode fazer escravos, mas também pode fazer-nos livres”. “E mais”, acrescentou, “é uma arma revolucionária”.
O projeto de “Mujeres Libres” se propôs a ideia de uma tripla educação para abolir a tripla escravidão a que estavam submetidas as mulheres. Em primeiro lugar, se lutou por acabar com a ignorância: “se não podemos fazer uso da palavra, não podemos defender-nos, pelo que somos escravas daqueles que nos dizem o que temos que fazer”, explicava Sánchez Blanco.
O segundo passo era oferecer-lhes uma formação dessa revolução social que se perseguia. Na revista se explicavam os princípios básicos do anarquismo: “Havia que abolir o Estado, o Governo, e toda autoridade que nos converta em escravas” esclarece a professora.
Segundo Sánchez Blanco, outro dos temas nos quais se centraram foi a condição sexual da mulher: “Estava destinada a ser uma boa mãe e dona de seu lar”. O que se pretendia desde a agrupação era reeducar a sociedade e que fosse a mulher a que decidisse se queria ser mãe ou não. Também desenvolveram uma campanha importante sobre a maternidade consciente, ou seja, na qual se lançou a mensagem de “procriar com cabeça”.
Os projetos educativos para as mulheres
“Mujeres Libres” criou 147 agrupações, as quais estavam inscritas 20.000 mulheres. “Comparada com outras agrupações femininas podemos considerá-la pequenina”, diz Sánchez Blanco, referindo-se ao número de inscritas, “mas se consideramos todos os projetos que desenvolveram podemos considerá-la grande, por todas as boas ideias e intenções que tinham e as conquistas que alcançaram, apesar das barreiras que se encontraram no caminho”.
Para demostrar esta ideia, a professora universitária destacou alguns dos trabalhos importantes que foram se expandindo pelos diferentes bairros de Madrid, que foi o foco inicial do projeto.
Organizaram aulas elementares de cultura geral e de idiomas para acabar com a ignorância. Criou-se uma escola teórico-prática de automobilismo para que as mulheres aprendessem a dirigir. E, em alguns bairros, faziam palestras dominicais para que entendessem que “a política era a tirania que as havia feito escravas”. Ademais, as mulheres não tinham nenhuma independência econômica já que estavam sob a tutela do pai se estavam solteiras ou do marido se estavam casadas. Por isso, “Mujeres Libres” lhes oferecia uma formação que as capacitaria profissionalmente, o que lhes permitiria serem realmente livres.
Sem deixar de lado a luta da mulher, pelas circunstâncias bélicas do momento, mostraram apoio na retaguarda: “Criaram uma leiteria, uma horta onde faziam práticas agrícolas, tinham oficinas de confecção de roupas e receberam formação em assistência sanitária”.
As agrupações avançaram tanto que decidiram criar um instituto de cultura para receber mais mulheres. Foi então quando incorporaram uma oferta de ensino superior de contabilidade, anatomia e fisiologia.
Amparo Poch y Gascón era a encarregada de organizar lições de anatomia. Não conhecia nem seu próprio corpo feminino porque era um tema tabu. Nas aulas se falava abertamente sobre o aparato genital da mulher e a prevenção de enfermidades. A prostituição foi outro tema que se abordou: “Não queremos ter filhas. É uma preocupação porque podem acabar sendo prostitutas”. Assim refletiam as mulheres grávidas com as quais trabalhava Poch y Gascón. “No entanto não se preocupavam quando era o homem ou os filhos os que iam aos prostíbulos”, destaca Sánchez. Por isso, as aulas de Poch y Gascón foram fundamentais para entender a libertação da submissão sexual da mulher.
A mulher na atualidade
Apesar de toda a luta que fizeram mulheres como Sánchez Saornil, Poch y Gascón ou Comaposada, a mulher atual no entanto se encontra com uma triste realidade: “Ainda estamos mais em casa que os homens, quando há um enfermo em casa, somos normalmente as cuidadoras, às crianças somos nós que damos a mamadeira…”, lamenta a jornalista García-Montoro. Recorda, ademais, que a revista “Mujeres Libres” advogou sempre por uma maternidade livre, e por desgraça, na atualidade todavia parece que as mulheres tem assinado o papel de mães nesta sociedade. “Aos homens não se exige casar-se ou ser pai”, encerra.
Durante a exposição de ideias na mesa redonda, Laura Sánchez Blanco mostrou uma fotografia de mulheres que trabalhavam de mecânicas para ilustrar o avanço social que se conseguiu nesses anos, mas acrescentou: “É muito triste que nos dias de hoje, fotos como estas sigam surpreendendo”.
Fonte: http://www.publico.es/sociedad/educar-liberar-mujer.html
Tradução > Sol de Abril
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quero agradecer a ana pela entrevista com esses compas. altamente inspiradora!
Moesio, Esses são as/os TODOS os meios de comunicação/websites/podcasts anarquistas que não estão em plataformas corporativas,se possível difundir. Aqueles indivíduos,…
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