Uma história oral do anarcopunk em São Paulo – parte 2

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por Eduardo Ribeiro | 20/07/2018

Cansados do ganguismo e da estagnação que dominavam o cenário no final dos anos 80, os anarcos se autodenominam, rompem com o modelo punk caverna e surgem as primeiras bandas e militâncias.

Movimento Anarco-Punk no Brasil tomou forma a partir de iniciativas que começaram em São Paulo. No começo dos anos 90 era comum encontrar os anarcopunks agrupados na Praça Ramos, entre a Galeria do Rock e a Woodstock Discos, e nas escadarias do Teatro Municipal. Em abril de 91, por exemplo, rolou na Praça Ramos um protesto contra a Guerra do Golfo Pérsico (!). Também era possível encontrá-los aos sábados à noite na Estação da Luz. O MAP surgiu espontaneamente entre punks da periferia. É simples de entender: eles sentiam na pele a desigualdade, o tédio e a opressão, atraíam-se pela crueza do punk, mas achavam que era chegada a hora de transpor a música e agir para tentar mudar alguma coisa. Era necessário pular fora da viciosa cultura das gangues, que estava consumindo muita energia produtiva.

Já esmiuçamos o contexto do punk no final dos anos 80 que propiciaria a busca dos jovens anarquistas, deslocados nas reuniões do Centro de Cultura Social e da Confederação Operária Brasileira, por uma representatividade legítima. Na segunda parte desta história oral, os entrevistados compartilham relatos do descontentamento que alimentou a vontade de criar um movimento mais ativista. E do rompimento, parte geracional parte ideológico, dos anarcos dos anos 90 com as demais bancas punks. As primeiras bandas anarco que se tornariam clássicas, como Execradores e Metropolixo, surgem no âmbito das iniciativas do Coletivo Altruísta, e descobrimos a razão do fim da Amor, Protesto y Ódio, entre outras fitas.

Encantamento e desilusão

Silvio Shina: Um dia, em meados dos anos 90, meu irmão chega em casa com um zine chamado Atitude Pessoal, do Nenê Altro. O No Violence, na figura do Ruy Fernando, juntamente com este zine, os shows do Execradores que eu tinha visto e os zines anarcopunks, me viraram do avesso. Comecei a ouvir cada vez mais som punk, anarco e hardcore. E comecei acompanhar essa movimentação. Só sei que, algum tempo depois, eu estava participando de um grupo libertário chamado Coletivo Altruísta, que se reuniu inicialmente ao redor das bandas Execradores, Metropolixo, Desertor e Atitude Consciente (da qual eu era vocalista). Isso se deu também pelo fato das bandas não possuírem todo o material necessário para ensaiarem. Então, dividíamos guitarras, baixo, bateria e equipamento de som. E o que não tínhamos, comprávamos coletivamente, quando podíamos. O que era de vez em nunca.

Começamos organizando shows na região do Grajaú e em outros lugares. Depois, passamos a também editar um boletim, O Altruísta, por meio do qual divulgávamos as atividades do coletivo e de outros grupos anarquistas, além de textos e charges feitas pelo grande Sérgio Valdez, vulgo Loquinho. Ele fazia manualmente toda a arte do coletivo. Desde cartazes até capas das split tapes que lançávamos e a arte do boletim. As duas split tapes que lançamos foram a Muito Além do Barulho (que vinha acompanhada de um livreto em papel sulfite rosa como uma forma simbólica de protestar contra a homofobia e o machismo dentro do punk), com as bandas Desertor, Atitude Consciente, Metropolixo e Execradores; e a Ideologicamente Perigosos (1994), com Metropolixo e Execradores, pois a essa altura a Desertor tinha saído do coletivo, e, a Atitude Consciente, acabado.

E a gente divulgava tudo isso nos shows, nas manifestações, nas atividades e afins. Mas o principal meio por onde escoávamos essa produção para além do Centro de São Paulo eram os correios. Haja cola no selo para tanta carta! Eu mandava muitas cartas toda semana pelo correio. Mais de 50. Era muito foda. A atitude punk dos anos 80 estava muito atrelada às gangues, à violência cega, à despolitização e a um certo niilismo. Tanto os anarcopunks como eu, morador de uma periferia violentada pelo Estado, estávamos à procura de outra coisa. Mesmo não sabendo direito o que era essa outra coisa.

>> Para ler a reportagem na íntegra, clique aqui:

https://www.vice.com/pt_br/article/kz7wba/uma-historia-oral-do-anarcopunk-em-sao-paulo-parte-2

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