[Chile] A mudança não está nas urnas

O grande Capo [Sebastián Piñera, presidente do Chile] voltou de suas férias esta segunda-feira (24/02) com energias restauradas. Agora chama a seus sequazes e colegas de outros bandos a um “acordo contra a violência”. Os carcereiros tremem ante às possibilidades que estão se abrindo para a insurreição no território chileno.

Estão inventando, acordo atrás de acordo (no congresso ou na sobremesa), uma inovadora forma de dominação na qual se combina todo o potencial repressor da ditadura, a “fluidez” econômica que garanta o livre mercado e o potente lubrificante social que contribui para o espetáculo da democracia.

Hoje uma habitante do sul do Chile teve que recordá-lo a um vizinho, ainda intoxicado pelo pão e o circo, que distribuía volantes em uma feira livre: “uma constituição sem congresso e sem presidente, o povo é o que a leva agora!”. Que a palavra “constituição” sobre nesta frase é o de menos. Para a maioria, que padecemos este mundo no qual morremos de fome ou tédio, de gênero ou cor de pele, o sentido de realidade está posto em uma forma completamente nova de nos relacionarmos com nosso entorno e com nós mesmos. O conceito ou nome que lhe atribuam é muito menos importante que o que ocorra na prática.

A tecnologia e a internet, o que fica de nossos saberes ancestrais, a ausência de líderes e representantes, a obsolescência da política e dos partidos, a multiplicidade de demandas e necessidades que cobrir, a impotência e a raiva acumulada por anos de vida miserável que só se precariza e se torna mais competitiva, a urgência brutal que demanda a própria terra agonizante; tudo isto e muito mais se confabula para fazer deste um assalto que o Poder não tem nenhuma certeza nem garantia de ser capaz de conter e que ameaça com dissolvê-lo.

A rotina política (e intelectual) do “sim” e do “não” é muito cômoda quando as coisas seguem seu curso normal. Mas essa normalidade se interrompeu. A velha história de escolher entre A ou B, aprovar ou rechaçar, esquerda ou direita, que se repete primeiro como tragédia e depois como comédia, uma e outra e outra vez, está posta a prova por decreto popular.

Ao Estado março está chegando. O povo despertou em outubro e em março dizem que se levanta.

Tradução > Sol de Abril

agência de notícias anarquistas-ana

nas ramagens embaciadas
o sol
abre frestas

Rogério Martins