[França] Attard, como eu me tornei anarquista

A história de Isabelle Attard é uma história de reconstrução. Militante do partido Europe Écologie – Les Verts (Europa Ecologia – Os Verdes), e então do partido Nouvelle Donne (Novo Acordo), deputada de 2012-2017, ela pensava que poderia atuar de dentro das instituições para servir à democracia e ao bem comum. Chegou a pensar que seria possível mudar a forma como as instituições funcionam. Ela se engajou em causas como dos softwares livres, de Rojava, contra o estado de urgência e contra o aeroporto de Notre-Dame-des-Landes. Ela também vivenciou o escárnio dos deputados quando uma mulher discursa na Assembleia Nacional, o desprezo com o qual muitos tratam os assessores parlamentares, os empregos fantasmas a serviço do partido… e ainda assim se apresentou para um novo mandato em junho de 2017, mas os eleitores de sua circunscrição não a reelegeram.

Após uma derrota eleitoral, é comum procurar se realocar em alguma função dentro do partido, na iniciativa privada ou pública. Mas Isabele Attard decidiu parar tudo e iniciar um verdadeiro exame interior. Suas leituras, discussões e reuniões a levaram a descobrir outros rumos, como a anarquia (ela usa este termo), o comunismo libertário e a autogestão, a ponto de se encontrar neles.

Um momento de partilha

Essa fase de desconstrução e reconstrução durou dois anos, dois anos de profunda convulsão com a incômoda questão: por que demorei tanto a me tornar anarquista? Para ela, como para a imensa maioria da população, o anarquismo era nebuloso e inacessível, porque é negligenciado, especialmente nos cursos de história, que tratam de sua origem, e pretendem que o anarquismo possua uma consciência republicana que deveria ser a personificação dos melhores. Liberdade, igualdade, fraternidade: um lema que é muito semelhante aos ideais anarquistas, no entanto, como conciliar falsas promessas e uma verdade impostora?

Este livro é escrito em primeira pessoa e é tão instrutivo quanto são as autobiografias, que se afastam do narcisismo e do estigma de ser um exemplo para oferecer um momento de partilha. Ela não pretende reinventar teorias anarquistas, ainda assim, nos apresenta uma aspiração cada vez maior por uma transformação profunda da sociedade, como as manifestações dos Coletes Amarelos e as mobilizações contra o colapso climático, que o capitalismo está nos levando. E esse é o ponto interessante. Conseguimos perceber que a autora não se tornou anarquista por acaso e que sua aversão aos meios de dominação foram determinantes para sua tomada de decisão. Assim, “Como eu me tornei anarquista” pode ser classificada como uma obra de educação política popular.

De fato, ela parte de sua própria experiência e revisita as contribuições das utopias revolucionárias da Ucrânia, Espanha, mas também a menos conhecida contribuição chinesa, com a experiência federalista anarquista na Manchúria em 1929. Ela ligas essas lutas, que a ideologia dominante tentou marginalizar ou apagar, com as atuais “ZaD” (Zone à Défendre – Zona a Defender), às empresas autogeridas na Grécia e Argentina e às revoluções em Chiapas e Rojava.

A contribuição das utopias revolucionárias

Isabelle Attard nos convida igualmente a (re)descobrir, entre outros, os pensamentos de Voltairine de Cleyre e Murray Bookchin, dois anarquistas estadunidenses, cuja contribuição é útil a todo aquele que pensa que o comunismo libertário do Século XXI não se pode ser reduzido à contribuição do anarquismo e das correntes marxistas antiautoritárias e que também é inseparável da ecologia e do feminismo.

Laurent Esquerre (UCL Aveyron)

>> Isabelle Attard, Commentje suis devenue anarchiste, Seuil/Reporterre, 160 páginas, 12 euros.

Fonte: https://www.unioncommunistelibertaire.org/?Lire-Attard-Comment-je-suis-devenue-anarchiste

Tradução > Café com Alecrim

agência de notícias anarquistas-ana

mar não tem desenho
o vento não deixa
o tamanho…

Guimarães Rosa