Anarquistas publicaram no portal Pramen um artigo sobre as condições necessárias para mudanças. Achamos que o seu texto vale a pena ser conhecido.
É fácil ser revolucionário/a ou rebelde em tempos revolucionários. Não é necessário muito para fazer isso: é juntar-se à multidão e já estará carregando as ondas da História. Mas é muito mais formidável quando tudo o que poderia ser proibido é proibido. Quando a humilhação dos que estão no poder é a norma, quase incontestável. Quando as/os amigas/os e camaradas são torturadas/os nos bosques e em caminhonetes.
Nesses anos, a única coisa que leva as pessoas a agir é a auto-estima e um ódio feroz e impiedoso pela injustiça. Infelizmente, nem toda a gente é capaz de derramar esses sentimentos. Portanto, esse é o momento para os tumultos solitários virem à tona.
Mikhail Zhlobitsky, que explodiu a si mesmo no edifício do Serviço de Segurança Federal de Arkhangelsk em 31 de outubro [de 2018], já está quase esquecido, já que muitos outros eventos aconteceram desde então. Enquanto isso, não sabemos quase nada sobre ele. Não há nem fotos normais, nem a sua página na rede social, nem testemunhos de parentes. Claro, não levamos em conta os artigos da mídia propagandista pró-governamentais que alegaram que Mikhail Zhlobitsky era “mentalmente anormal” e escreveram que ele foi “ridicularizado na escola”.
Então, devemos apenas fazer suposições sobre Mikhail Zhlobitsky unicamente com base em seu ato.
Ele tinha 17 anos. Vamos lembrar o que cada um de nós fez aos dezessete anos. Primeiro álcool, primeiro sexo, primeira universidade e primeiro emprego. Olhemos para trás – a maioria de nós tem uma quantidade decente de tempo entre esses dias e os dias de hoje. Nós vivemos isso. Nós amamos, perdemos o coração, estávamos a rir e a chorar. Mas Mikhail Zhlobitsky não viverá estes anos. Porque ele colocou duas coisas acima de tudo no mundo: a sua própria dignidade e o ódio pela injustiça. Ele colocou-os acima da felicidade pessoal, de sensações agradáveis, amor e outras coisas. Acima da sua própria vida.
Pense nisso: ele recusou a coisa mais valiosa que tinha.
Pode-se avaliar a eficácia política das suas ações de diferentes maneiras, dizendo que “se ele vivesse, ele seria capaz de fazer mais”, e assim por diante. Mas na verdade, ele fez algo que a maioria de nós não é capaz de fazer. Numa das suas mensagens em salas de chat, ele disse: “Estou esperando até completar 18 anos para que eu, mas não os meus pais, assuma a responsabilidade pelas minhas ações. Estás à espera de quê, eu não sei.” Com esta frase, ele finalmente descreveu a si mesmo. Já agora, policiais russos também descreveram a si mesmos quando publicaram a foto póstuma de Michael no seu canal de telegram, acompanhando-a com comentários de troça.
Eu sempre acreditei e ainda acredito que a força moral de uma pessoa e a sua honra imanente tem apenas uma dimensão – a capacidade de sacrificar a si mesma. Esta habilidade começa a partir de pequenas coisas. Por exemplo, pode-se abandonar algum prazer momentâneo para beneficiar outras pessoas e alguém é capaz de cometer um suicídio no interesse da revolução. Não há necessidade de palavras e declarações altas, se as suas necessidades básicas de segurança e conforto forem, em algum momento, superadas instantaneamente.
Vamos lembrar quantas vezes qualquer um/a de nós (e eu também) colocamos o conforto pessoal acima de tudo. Eu não vou à reunião porque estou cansado desse dia ou porque preciso me preparar para os exames, porque tenho um aniversário, porque preciso de alimentar meu gato, ou qualquer outra coisa. O ativismo é ótimo! Mas deixe as/os outras/os fazerem isso. Tenho coisas mais importantes para fazer (vida, família, trabalho, pais, entretenimento). Existe outra opção: Eu vou lutar quando eu fizer todas as outras coisas, porque é preciso pensar no futuro! Em geral, é desejável lutar sem prejudicar a si mesmo.
Mikhail preferia não falar, mas fazer. E enquanto tivermos medo de nos sacrificar mesmo em pequenas coisas, o mal continuará a avançar com detenções, algemas, torturas. E este mal apenas ocasionalmente encontra no seu caminho pessoas destemidas. Mas não é necessário explodir a si mesmo para se juntar a estes destemidos. Não é necessário utilizar de modo algum a violência, uma vez que, para além da violência, existe um enorme arsenal de métodos que, por vezes, são ainda mais perigosos. Mas, de qualquer forma, devemos nos lembrar que a prontidão para as dificuldades – pelo menos nas pequenas – é um pré-requisito para a revolução. E a revolução nunca será confortável.
Quando você perceber, os destemidos tornar-se-ão grupos, e os grupos se tornar-se-ão massas. E aqueles que forçaram os jovens de 17 anos a se explodirem serão chamados a prestar contas.
Nikolay Diadok
Fonte: https://anarchistnews.org/content/thoughts-about-mikhail-zhlobitsky
Tradução > Ananás
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Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!