ANIVERSÁRIO NO CÁRCERE
Nunca fui muito amante dos festejos, não há datas que me causem emoção ou alegria, sobretudo considerando todas as datas impostas como “dia de sei lá o quê”. Só são uma prática a mais do mercado para encher seus cofres e para que sigamos distraídos em vidas apáticas. De fato considero nefasto presentear coisas materiais para demonstrar afeto a nossos próximos. Sequer festejo meu aniversário, ainda sendo um dos poucos dias que, sim, me agradava compartilhar com minha gente marcando assim uma nova volta ao sol no calendário gregoriano alheio.
Hoje é um desses dias um tanto particular. É meu primeiro aniversário em um centro legal de detenção e tortura.
E desta vez, ainda que seja meu desejo não poderei estar com minha filha. Nem com Tam, minha companheira de vida, nem com minha velhinha, que são minha esfera privada e as pessoas que me mantêm firme neste momento tão particular.
Vão ser 8 os meses que estou identificado, assinalado, exposto na mídia, vigiado, isolado, controlado, investigado. E 4 os meses que estou sequestrado em celas de diferentes lugares por, sobretudo defender e manter minhas ideias e convicções de que este mundo já era e devemos construir um mundo novo. Não para nós, mas para os que vierem. Sentando bases no comunalismo, no apoio mútuo, no respeito, na solidariedade e nos acordos mútuos.
Acontece que certos “senhores” creem que manter isto significa ir contra seus interesses. E não estão tão equivocados, sabem que lhes acaba o tempo e necessitam exemplificar metendo-nos medo. Me dizem que sou terrorista. Eles que são os terroristas profissionais. Dizem que pretendo meter medo à sociedade, justo eles que em cada discurso, em cada lei, em cada gesto e ação não fazem mais que atentar contra as pessoas e a vida em geral. Bom, creio que, sim, chegue até aqui e ainda que pareça ilógico me orgulho de que me nomeiem como seu inimigo. NÃO OS RESPEITO DE JEITO NENHUM.
Conheci nesta prisão muita gente que merece esse respeito. Convivo aqui com pessoas do povo, aqui não há nenhum grande poderoso ou criminoso legal. Nesta privação de minha liberdade só há gente de baixos recursos, golpeados, sofridos, quebrados, feridos, maltratados. Justamente por esses que me chamam seu inimigo. E então começo a recordar. Por quê? O que fizemos para sermos perigosos? Aqui há pura gente que atenta contra a propriedade privada, mas só em menor grau, muitas vezes para alimentar suas famílias, ou por estarem fartos de ver em suas vitrines ou seus programas, vidas que jamais vão poder comprar. Em meu caso particular será por apoiar sempre lutas genuínas e agir nesse sentido.
Também vendo o arame farpado por uma janela de grades, recordo a todos os compas que estiveram e estão ao meu lado, ainda na distância. Compas que se entregam de corpo e alma em cada atividade, sofrendo todo tipo de carências, mas entregando tudo a troco de nada. Para eles vai meu abraço hoje. Uma saudação fraternal a todos eles, me sinto orgulhoso de caminhar a seu lado.
Apesar de tudo a luta continua. Vale a pena não vender-se a essas merdas. Obrigado a todos os parças e os compas que marcam seu apoio desde Formosa, Salta, Jujuy, Mendoza, San Luis, Chaco, Cordoba, Entre Rios, Neuquen, Rio Negro, Chubut. Aos companheiros internacionalistas do Uruguai, Chile e Alemanha. E a todos os mesmos de sempre de Buenos Aires e arredores que, apesar da tortura que me impõem tenho os sonhos intactos e o devo a seu apoio e newen. Este aniversário é com vocês à distância.
Abaixo os muros das prisões.
Desde um complexo penitenciário ocupado pelo Estado argentino. 30-06-2022.
Emir Acosta
Tradução > Sol de Abril
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https://noticiasanarquistas.noblogs.org/post/2022/03/29/argentina-a-imprensa-aponta-e-dispara/
agência de notícias anarquistas-ana
Venha aqui comigo,
oh pardal sem pai nem mãe.
Venha aqui brincar.
Issa
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!