[Itália] Na morte do papa rei. A máscara populista de um monarca

Roma blindada. Ruas fechadas, praças militarizadas, atiradores de elite nos telhados, sistemas anti-drone ativados, contratorpedeiros posicionados no rio Tibre. Para homenagear um soberano estrangeiro, Jorge Mario Bergoglio, conhecido como “Papa Francisco”, a cidade foi transformada em um teatro de guerra. Os alertas saltavam nos celulares dos cidadãos como uma nova liturgia da ansiedade, enquanto a população inteira, alheia e impotente, se via sequestrada dentro de sua própria cidade. E, claro, como sempre, quem pagou a conta foram os próprios cidadãos italianos — os mesmos que fornecem água de graça ao Vaticano e agora tiveram que bancar também a encenação fúnebre do mais recente monarca de Além-Tevere.

Não apenas repressão física, mas também cultural e simbólica: o governo de Meloni proclamou cinco dias de luto nacional, mascarando sob o luto religioso uma vontade política clara: reduzir, ofuscar e apagar o 25 de abril, Dia da Libertação, data do antifascismo que o governo neofascista nunca engoliu. Na Itália, o morto certo ainda pode ser mais útil do que o vivo que luta.

Diante desse cenário, o desfile hipócrita dos poderosos se completou em todo seu esplendor miserável. Políticos de direita e de “esquerda” compareceram ao funeral, ajoelhando-se diante daquele símbolo de poder. Os ausentes, se é que houve algum, faltaram apenas por oportunismo, não por convicção.

Lembram dele como “o papa dos pobres”, mas Francisco, como destacado na última edição por Daniele Ratti, nunca teve coragem — nem vontade — de apoiar a Teologia da Libertação, aquela que, na América Latina, buscava unir cristianismo e luta contra a opressão. Na verdade, a história nos mostra o oposto: Jorge Bergoglio, na Argentina, sempre se manteve distante — ou mesmo hostil — a essas experiências. Condenou abertamente seus irmãos jesuítas que aderiram aos ideais de Gustavo Gutiérrez, Helder Câmara e Leonardo Boff. Sua visão de “caridade” sempre foi paternalista, longe de ser revolucionária!

Em 2004, definiu como “fascismo” a introdução da educação sexual nas escolas de Buenos Aires. Em 2010, falou em “guerra de Deus” contra o casamento igualitário. Abertura e modernidade? Bergoglio representava a ala mais conservadora da Igreja argentina, aquela que, como destacou o intelectual uruguaio Alberto Methol Ferré, deixou morrer o impulso dos pobres pela libertação por medo de se comprometer politicamente.

Durante a ditadura militar de Videla, como denuncia o jornalista Horacio Verbitsky em seu livro El Silencio, a biografia de Bergoglio esteve ligada à página sombria da “Guarda de Ferro” e ao desaparecimento dos dois jesuítas Orlando Yorio e Francisco Jalics. “Papa dos desaparecidos”? Seu silêncio ensurdecedor diante de um regime sanguinário ecoa bem mais alto.

Ratti teve a coragem de dizer sem hipocrisia: um papa continua sendo um papa, ou seja, um reacionário. A mídia ocidental, em seu frenesi por encontrar sempre um “papa bom”, varreu para debaixo do tapete as posições reais de Bergoglio.

Feminismo? Para ele, é “machismo de saia”. Homossexualidade? Algo a “ser tratado pela psiquiatria” se manifestado cedo demais. Já os “lobbies gay” eram uma obsessão a combater, inclusive dentro da Igreja. Mulheres sacerdotes? Um “não” claro e irrevogável. Padres casados? Talvez só em “lugares remotos” como a Amazônia. Aborto? Crime pior que terrorismo: médicos que o praticam são “assassinos de aluguel”.

Sobre a pedofilia clerical, Francisco não foi o purificador que pintaram: protegeu figuras-chave da hierarquia envolvidas em escândalos. Na Argentina, tentou abafar o caso do padre pedófilo Julio César Grassi; como papa, nunca encontrou tempo para se reunir com Jean-Marc Sauvé, autor do relatório sobre abusos na França.

Quando o Charlie Hebdo foi alvo do terrorismo islamista em 2015 (ataque que matou 17 pessoas), Francisco “condenou” o atentado… mas logo completou: “Quem insulta a fé alheia deve esperar um soco”. Um jeito elegante de dizer que a liberdade de expressão pode ser sacrificada em nome da religião.

Resumindo: Jorge Bergoglio não mudou a Igreja. Apenas atualizou o marketing. Um iPad na mão, gestos populistas, milhões de seguidores no X (ex-Twitter, agora controlado por Elon Musk) e toneladas de retórica sobre os pobres — retórica nunca traduzida em ações reais contra a opressão sistêmica que a própria Igreja historicamente sustentou.

Francisco não foi um “progressista”. Foi um conservador sorridente, o rosto humano de uma instituição podre, que só se salva graças a truques de comunicação. Lutou contra todas as formas reais de libertação, da América Latina à Europa, e defendeu até o fim o sistema patriarcal, autoritário e violento chamado Igreja Católica.

Por isso, hoje, enquanto os poderosos se curvam diante de seu caixão, nós seguimos nos curvando apenas diante de quem luta para libertar o mundo.

‘gnazio Fatina

Fonte: https://umanitanova.org/in-morte-del-papa-re-la-maschera-populista-di-un-monarca/

Tradução > Liberto

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Um sol transparente
e um mar azulão
brilhando na areia quente

Winston

[Espanha] A menor biblioteca do mundo

Michel Ende, em seu romance MOMO, nos convida a dar uma olhada em um mundo onde é impossível “perder tempo”. Onde o bar de sempre vira um fast food e o simples contato humano de uma interação é anulado. Parecia loucura, mas nesta Barcelona gentrificada, o pesadelo virou rotina.

A grande conquista da compra d’EL LOKAL, graças ao APOIO MÚTUO, à SOLIDARIEDADE e à AÇÃO DIRETA, é um freio nas lógicas extrativistas da cultura. EL LOKAL, como espaço de encontro, permite conversas intermináveis que tentam mudar o mundo, mas, acima de tudo, convida a brincar, a imaginar. Essa qualidade exclusiva da humanidade que, nestes tempos de IA, parece que estamos entregando às máquinas. Como bons CRONÓPIOS que somos nós, os “lokaleros”, você sempre vai encontrar coisas espalhadas por aí — um martelo (da vez que consertaram aquela prateleira) ou uma camiseta que alguém experimentou e esquecemos de devolver ao lugar.

Talvez seja por isso que não suportamos espaços livres ou vazios desperdiçados. Então imagina a nossa surpresa ao puxar um cartaz velho e encontrar um cubo de dez centímetros de lado na parede — cheio de NADA. Isso não podia ficar assim e, como uma travessura a mais, criamos a menor biblioteca do mundo. Você pode se perguntar: “Mas os livros são funcionais?” E é aí que respondemos: sim e não. Dá pra abri-los, e mesmo que as páginas estejam em branco, isso é só uma pequena armadilha que preparamos pra você exercitar sua imaginação.

Pense nas crianças que ainda não sabem ler, mas abrem um livro ao acaso e contam a melhor das histórias. E é aí que a gente fala sobre brincar. Nem tudo precisa ter uma finalidade ou ser feito na correria, como dizia Michel Ende no seu romance. E você, já veio conhecer a menor biblioteca do mundo?

ellokal.org

Tradução > Liberto

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Crisântemos brancos –
Tudo ao redor também
É graça e beleza.

Chora

Nenhum governo nos representa. Nunca representou.

De Vargas a Bolsonaro, de Lula a FHC, de Dilma a Temer, a história do Brasil é uma sequência coreografada de promessas quebradas, palanques ensaiados e a mesma engrenagem moendo o povo, só mudam os nomes na placa da máquina.

Lula? Ascensão operária transformada em braço político da conciliação com os donos de tudo. Fez aliança com banqueiro, empreiteiro, latifundiário e ainda vendeu isso como avanço social. Colocou pobre no avião, mas deixou elite no comando da torre. E quem ousou lutar fora da institucionalidade foi espionado, preso ou silenciado. O PAC asfaltou não só estrada, mas também a passagem da polícia sobre comunidades inteiras.

Bolsonaro? O oposto igual. Prometeu “libertar” o povo, mas entregou armas aos ricos e grilagem aos latifundiários. Transformou o autoritarismo em fetiche e o ódio em programa de governo. Serviu ao mercado com a mesma disciplina de quem sempre foi escravo do capital. Ajudou banqueiro, agronegócio, militar e ainda teve a ousadia de chamar isso de liberdade.

Antes disso? Collor, o caçador de marajás que confiscou a poupança do povo. FHC, o intelectual das privatizações, que vendeu patrimônio público a preço de banana enquanto escrevia crônicas sobre democracia. Sarney, símbolo da transição que manteve tudo igual. Todos com a mesma missão: manter a ordem e o progresso, ou seja, a desigualdade com selo institucional.

Mas nós, os de baixo, sempre soubemos: não há salvação no voto, nem libertação por decreto.

Bakunin já avisava: “a liberdade não se conquista através do Estado, porque o Estado existe para negar a liberdade“.

Emma Goldman dizia que “se votar mudasse alguma coisa, já seria proibido“.

Errico Malatesta lembrava que “a revolução não se faz no papel, mas na prática do dia a dia, nas ruas, nas relações.

E no Brasil, o que chamam de democracia é um balcão de negócios onde o povo entra como moeda e sai como estatística. A esquerda institucional acredita que o problema é o modelo; a direita, que o problema é a gestão. Mas o anarquismo responde: o problema é o poder.

Por isso, não queremos reformar a prisão, queremos derrubá-la.

Não nos basta escolher o capataz, queremos o fim da senzala.

Não nos iludimos com PEC, CPI ou STF, porque quem julga a opressão de dentro da engrenagem é só mais um parafuso.

Se a história do Brasil foi escrita por governos, talvez esteja na hora de escrevermos outra, sem governo nenhum.

O ser humano sente-se atacado por mil males que o escravizam e o tornam miserável, o que impede seu desdobramento natural e livre; ele folheia a história e está convencido de que nenhum governo fez a felicidade do povo.  Reis, imperadores, presidentes, todos foram maus, todos pesaram sobre os ombros do povo como uma laje sepulcral; nenhum governante tem sido o abrigo dos fracos e do flagelo dos fortes; todos os governos têm sido uma mãe carinhosa e amorosa dos poderosos e uma madrasta cruel e arrogante dos humildes. Nenhum homem pode fazer a felicidade do povo quando ele já está à frente do governo.” – Ricardo Flores Magón, 1917

Anarquismo – Liberdade

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outrarte
o ouro esboço
do crepúsculo

Guimarães Rosa

[Uruguai] Juan Pardo, desenhista, gravurista, escultor e oleiro anarquista

No dia 6 de fevereiro de 1969, com 76 anos, morre em Montevidéu o anarquista Juan Pardo. Totalmente desconhecido atualmente, Pardo fez uma propaganda anarquista constante e tenaz, sendo parte dessa rede solidária e anônima da qual fazem parte dezenas e centenas de lutadores sociais. Destacou-se como artista, realizando numerosas xilografias que retratavam os rostos das principais figuras do anarquismo local e internacional nas páginas de diferentes jornais anarquistas, como: Inquietud (1944-1950), Voluntad (1956-1965) ou Solidaridad, órgão da Federação Operária Regional Uruguaia. Seu companheiro e amigo Vladimir Muñoz dizia que “com suas madeiras gravadas, abria sulcos nas mentes dos leitores rumo às concepções libertárias.”

Ele combinava sua arte com a redação de textos de estilo gauchesco, assinados com o pseudônimo “El Jinete L’Azulejo”. Sua extensa produção pode ser facilmente encontrada ao percorrer as páginas da imprensa anarquista local nas décadas intermediárias do século XX.

Tradução > Liberto

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probleminhas terrenos:
quem vive mais
morre menos?

Millôr Fernandes

[Paraguai] Não contem conosco!

Eles querem nossos corpos para serem cúmplices na militarização permanente dos territórios: aterrorizando, assassinando e destruindo em nome de uma falsa segurança que só beneficia o extrativismo e seu ciclo interminável e egoísta de destruição e exploração.
Não contem conosco.

Eles querem nossos corpos para a guerra e o serviço militar, enquanto nas casas e nas ruas nos matam de misoginia e machismo. Já basta!
Não contem conosco!

Querem nos usar como justificativa para os gastos militares estatais, baseados no medo que eles mesmos produzem, junto ao armamentismo desenfreado que enriquece máfias disfarçadas de autoridade. Não faremos parte disso.
Não contem conosco.

Chamamos à ação comunitária e solidária entre os povos contra a indústria armamentista — um negócio de ódio, morte, destruição e discriminação. A segurança promovida pelos Estados e pelo capitalismo é uma ficção que perpetua o monopólio da violência, alimentando permanentemente o negócio das armas, a opressão dos povos e a exploração dos territórios.

Na RAMALC (Rede Antimilitarista da América Latina e do Caribe), acreditamos que a segurança é uma vivência comunitária e empática, construída coletivamente em cada território que habitamos, de forma horizontal, em um diálogo sororo e alegre, como um exercício coletivo de ação direta.

Este e todos os 15 de maio são o Dia Internacional do Direito à Objeção de Consciência ao Serviço Militar — o direito de dizer NÃO a participar de guerras, conflitos, agressões e mortes. Em tempos de militarização e autoritarismo, não colaborar com a violência é um exercício indispensável de liberdade e solidariedade.

Declare-se objetor/a!

ARQUIVOS PARA BAIXAR: https://documentos.imagenacrata.org

ramalc.org

Tradução > Liberto

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caminho mundo…
a treva negra
envolve tudo…

Luís Aranha

[Espanha] Barricada de Papel Nº79: Antiespecismo, uma luta pela vida e a justiça

Neste número de Barricada de Papel, Patricia Gutiérrez, ativista política, feminista e antiespecista, nos convida a questionar uma das opressões mais normalizadas de nosso dia a dia: o especismo. Através de uma reflexão pessoal e honesta, nos aproxima da discriminação sistemática que sofrem os animais não humanos pelo simples fato de não pertencer a nossa espécie.

Desde a exploração na alimentação e a experimentação até as resistências sociais e laborais que enfrenta o movimento antiespecista, Patricia põe sobre a mesa uma verdade incômoda: o sistema capitalista e patriarcal mercantiliza os corpos dos animais e perpetua seu sofrimento, ignorando seus direitos e sua capacidade de sentir.

O artigo nos fala também dos santuários de animais como espaços de resistência, onde se demonstra que outra forma de convivência é possível, baseada no respeito e na liberdade. E nos recorda que ser antiespecista é enfrentar a cada dia um sistema estrutural que legitima o uso e abuso dos demais animais, mas também é uma aposta pela justiça e a coerência em todas as nossas lutas.

Consulta o número completo aqui:

https://cgtandalucia.org/wp-content/uploads/2025/04/Barricada-de-papel-no-79-antiespecismo-1.pdf

Tradução > Sol de Abril

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Dentro do grilo
Um grito verde
Desfolha-se.

Paulo Ciriaco

Sob o governo Lula 3 os bancos nunca viram tanto dinheiro

No primeiro trimestre de 2025, terceiro ano do governo Lula 3, o Bradesco teve um lucro líquido de R$ 5,9 bilhões. Isso mesmo, em três meses quase 6 bilhões de lucro!!!

Bancos batem recordes de lucro

Em 2024, segundo ano do governo Lula 3, os 4 maiores bancos no Brasil (Bradesco, Itaú Unibanco, Santander e Banco do Brasil) alcançaram um lucro líquido conjunto de R$ 114,1 bilhões.

Em 2023, no primeiro ano do governo Lula 3, os lucros líquidos dos quatro maiores bancos do Brasil totalizaram R$ 96,9 bilhões. 

Lula 3, “mãe dos bancos”?

Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o homem que se autoproclama o “pai dos pobres”, mas que, na prática, tem se mostrado a verdadeira “mãe dos bancos”.

Resumindo

Muitos brasileiros ralam, recebem um mísero salário-mínimo de R$ 1.518,00, o que, para muitos, não é suficiente para cobrir as despesas básicas, como alimentação, moradia e transporte. E OS BANCOS FE$$$TEJAM!

CONTRA O ESTADO E O CAPITAL!

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Parada do trem –
Com o vendedor de flores
Vêm as borboletas.

Sôshi Nakajima

Quando o pensamento vira prisão: crítica anarquista à academização da vida

Sim, a teoria importa. Pensar é urgente. Mas pensar não é empilhar citações nem sacralizar bibliografias. Não é repetir jargões da cultura acadêmica para parecer inteligente. E, mais ainda: pensar nunca foi — nem deveria ser — privilégio da academia. A reflexão nasce do mundo, não das atas. A teoria se escreve com suor, tropeço e experimento. E, quando esquecemos isso, até o anarquismo se torna burocrático.

Há uma distorção em curso — e ela é grave: até o anarquismo tem supervalorizado a escolarização. Como se só fosse legítimo aquilo que já foi validado pela universidade. Como se só fosse anarquista quem fala difícil. Isso é o oposto do que se busca. Para ser anarquista, não é preciso ter diploma — é preciso ter disposição para viver sem amos. É preciso sentir na pele, e não apenas citar autores brilhantes. Quem constrói luta coletiva pode ser anarquista, mesmo sem nunca ter lido Bakunin.

A racionalidade acadêmica ocupou até os espaços libertários. Hoje, há quem exija referência para a raiva e bibliografia para a solidariedade. Teoriza-se tanto a prática que ela simplesmente não acontece. Fala-se de ação direta com vocabulário de defesa de tese. O que era para ser um corpo em movimento virou ritual de discurso e postura acadêmica.

É preciso dizer em alto e bom som: a teoria viva nasce da prática. Da tentativa, da contradição, da urgência de viver com coerência. E, sinceramente, está fazendo falta mais livro escrito por quem vive. Por quem tenta e erra. Por quem faz da vida seu laboratório. Queremos mais textos com calo, com gíria, com vísceras. Menos relatório, mais relato. Menos citação, mais chão.

A cultura acadêmica se tornou um problema sério. Já tem acadêmico que conceituou isso como “paralisia reflexiva”. Tem gente que fala tanto sobre mudar o mundo que não tem tempo de pegar numa enxada, reciclar numa feira, colar um lambe. Essa cultura em que as palavras não precisam ter conexão com as ações não nos serve. Não é antiautoritária — é decorativa.

Saberes não legitimados pela academia continuam sendo saberes. As sabedorias ancestrais e populares, muitas vezes oralizadas, pensam o mundo com o corpo. Negar isso é erguer muros onde caberiam fogueiras. É esquecer que há pensamento na ação de viver e na palavra que não precisa de assinatura. É cultuar um conhecimento moldado por estruturas hierárquicas, que só ganha valor se passar por bancas ou pelo crivo de avaliadores de revistas.

O anarquismo não precisa de papers. Precisa de corpo, de ação, de erro. Precisa de gente que arrisque, que escute o mundo fora dos muros acadêmicos. Pensar, sim — mas pensar como quem anda. Como quem dança. Como quem cai e levanta. Como quem não pede permissão para criar.

Se não rompemos com essa lógica, se não descolonizamos o pensamento anarquista da cultura acadêmica que o aprisiona, corremos o risco de nos tornar aquilo que juramos combater: uma elite do saber que fala de liberdade enquanto vive trancada em seminários.

O pensamento deve ser ferramenta, não ornamento. E o anarquismo, nunca precisou — nem precisa — da validação da cultura autoritária para existir. Antes de ser discurso, ele é vida em estado de insubmissão.

— Sementes Insubmissas

Sementes Insubmissas é um coletivo sem donxs, fronteiras ou chancela. Nasce do desejo de aprender além dos muros das instituições escolarizadoras, afirmando que saber não precisa de diploma para existir. Aqui, a teoria brota da prática, do corpo em movimento, do erro, do cuidado e da partilha.

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lá se vão as garças
vão pairando sobre o rio
vão cheias de graça

Gustavo Felicíssimo

“Este Lula afirmando hoje no encontro com o Putin que precisa se unir na luta contra o terrorismo internacional. Se unir com quem? Com um regime neofascista?”

Com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva visitando à Rússia, com reunião bilateral com Putin agendada para os próximos dias, resolvemos divulgar trechos de uma entrevista com a anarquista russa-brasileira Kristina Dunaeva bem antiga (foi realizada em novembro de 2004), mas que continua atual em diversos aspectos. Confira a seguir…
 
Agência de Notícias Anarquistas > Recentemente a Revista Exame soltou uma nota indicando que a Rússia é o 3° país com o maior número de bilionários do mundo, por outro lado, é um dos países mais corruptos do planeta. Curioso, não?
 
Kristina Dunaeva < Curiosíssimo!!! O que se passa agora na Rússia é a consolidação do monopólio de todos os poderes no Estado, ou seja, para um grupo restrito de pessoas, para a turma de Putin, que vem da ex-KGB – polícia secreta da URSS –, e que está reestruturando o poder ao redor de si. Assim, antigos membros da KGB se engajaram nas novas estruturas de poder de livre mercado criadas após a implosão do capitalismo de Estado soviético, ocupando altos cargos executivos de multinacionais, por exemplo. Recentemente, muitos bilionários vazaram do país, após acordos com o governo, com certeza. Um deles, que era dono de único canal da TV não federal, insistiu em ficar e agora está preso.
 
ANA > Vladimir Putin está no Brasil, se tivesse a oportunidade de falar com ele, o que falaria?
 
Kristina < Perguntaria, qual o objetivo da visita para o Brasil? Quais serão as negociatas? Putin vem para o Brasil negociar a venda de aviões caças militares Sukhoi. A aquisição será negociada pelo Ministério de Defesa brasileiro, representado pelo vice-presidente José Alencar que, antes de virar o ministro de defesa, visitou a Rússia. O vendedor, Ministério de Forças Armadas da Rússia, há 10 anos promove a guerra na Chechênia, é causador de genocídios, de atos de terrorismo estatal e mantém no poder o governo fascista do Putin. O Brasil, por sua vez, mensalmente fornece aos cidadãos russos toneladas de diferentes tipos de carne, devido ao nível precário da produção industrial de tal produto na Rússia e à hiperprodução e crescimento da indústria pecuária brasileira (curiosamente, o presidente da Sadia é ministro de Desenvolvimento do governo Lula).
 
Enquanto isso na Rússia: à custa dos povos da Chechênia e da Ingushetia, que estão sendo exterminados pelo exército russo com a cumplicidade silenciosa da maioria de pessoas da Rússia, Putin, alto membro da ex-KGB e atual FSB, foi “eleito” para governar mais quatro anos pelo povo rapidamente empobrecido, graças ao discurso nacionalista e totalitário e com o apoio da indústria bélica e petrolífera.
 
À primeira eleição de 1999 precederam as explosões de prédios residenciais em Moscou, o que serviu de pretexto para uma nova onda de genocídio na Chechênia. À última eleição de 2004 – a explosão no metrô de Moscou. Putin ganhou esta eleição no primeiro turno. Curiosamente, com os recordes de votação na Chechênia (89,65% e 92,6% dos votos em apoio) e na Ingushetia (91,09%). Enquanto isto na Sibéria, nas regiões de Krasnoiarsk e de Irkutsk, as eleições não rolaram (na Rússia voto não é obrigatório).
 
Putin ganhou a eleição prometendo que o governo russo realizará um programa social concreto e positivo em troca de apoio silencioso ao regime totalitário.
 
Em vez disso, o governo do Putin, junto ao Parlamento, completamente obediente, assinaram um pacote de leis antissociais que prevê a anulação de transporte gratuito para os aposentados, o cancelamento de distribuição gratuita de remédios para os doentes crônicos (por exemplo, para aqueles que sofrem de diabetes), a anulação de dotações estatais para os antigos presos  políticos, para os deficientes, inclusive para aqueles que sofreram de radiação em consequência da catástrofe de Chernobyl, a anulação de indexação de salários para aqueles que trabalham na região Setentrional da Rússia (costa do Oceano do Norte), a anulação de bolsas para os estudantes etc. Em alguns casos serão pagas dotações em dinheiro, só que se este dinheiro deverá sair dos orçamentos regionais que estão vazios, sem conseguir pagar os salários dos professores, médicos, funcionários estatais.
 
Outras medidas que prenunciam a consolidação do totalitarismo: a anulação das eleições diretas dos governadores (agora é o Putin que nomeia) e perseguição dos grandes partidos de “oposição” (comunista, por exemplo). Sou contra as eleições, muito mais contra o totalitarismo, e estas medidas servirão para que não rolem protestos e obstáculos durante as reformas do governo deste FDPutin!
 
ANA > É muito curiosa essa negociata belicosa e armamentista entre o governo brasileiro e russo. Mas não surpreende, já que uma das políticas do governo Lula é modernizar as Forças Armadas, e isso passa pela aquisição de armas, que eles dizem que é para defender a paz, a soberania nacional… uma grande hipocrisia!
 
Kristina < Tá foda. Este Lula afirmando hoje no encontro com o Putin que precisa se unir na luta contra o terrorismo internacional. Se unir com quem? Com um regime neofascista? Com os milicos, policiais?
 
ANA > Em que ponto está agora às mobilizações contra a guerra na Tchetchênia? Fale um pouco deste conflito…
 
Kristina < A cada semana em Moscou, São Petersburgo e algumas outras cidades acontecem os piquetes antimilitaristas. Quem organiza são as ONG’s de direitos humanos – que trabalham com presos políticos, vítimas do regime soviético e refugiados, anarquistas, indivíduos conscientes. Participei de alguns em Moscou, logo após a explosão da escola em Beslan. Numa das principais praças da cidade, no fim da tarde, foram acesas as velas, abertas as faixas com as inscrições contra a guerra, contra o genocídio dos chechenos promovido pelo exército russo e pelo Putin, contra o imperialismo, contra o terrorismo estatal que causou morte de centenas de crianças. Foram distribuídos panfletos e os participantes trocaram ideias com as pessoas que passavam na praça. Muitos passavam reto, sem levantar os olhos – o medo e a tensão em Moscou, capital do império russo, estão generalizados, muitos recusavam receber os panfletos, mas muitos conversavam.
 
Em Moscou, com as mesmas pessoas, participei da manifestação ultranazista organizada pelo governo e fiquei bem assustada. Fomos pra lá para ser uma gota contra no oceano da massa obediente – os participantes foram trazidos obrigatoriamente pelos sindicatos e universidades, e também pelos discursos dos governantes e figuras populares através das telas azuis dominadas pelo governo. Rapidamente distribuímos os panfletos no meio de bandeiras dos fascistas, das faixas com as citações de Putin, no meio dos carecas, de discursos que os notáveis gritavam do palco – que o inimigo está do lado de cada um, pode ser um vizinho, pode ser um amigo, quem não é russo é o inimigo, etc., – e aí estendemos uma faixa que estava escrito: “Todos somos reféns do terrorismo estatal”, aí nem passou 10 minutos – colaram os polícias falando que esta é uma manifestação em apoio ao governo, e não contra, e que não existe nenhum terrorismo estatal… Tudo isto no meio de vários provocadores, de pessoas surtando, nos acusando das recentes mortes de crianças; rasgaram a faixa, prenderam um companheiro e nós tivemos que sair juntos e ir bem longe para se dispersar e cada um pegar o metrô para seu lado.
 
Esta guerra é um mecanismo que o governo aciona assim que precisa justificar qualquer medida, qualquer passo, quando precisa eleger alguém como Putin. Na Rússia as informações sobre esta guerra são censuradas e ela serve de pretexto para a instalação de um regime fascista. O que acontece lá é o genocídio.
 
ANA > Você acha que hoje a “velha KGB” se confunde com a máfia russa, que é muito poderosa?
 
Kristina < É uma turma só que está no poder: que elegeu Putin, que faz a guerra, que apela a combater o terrorismo e explode a escola, os prédios, os metrôs…
 
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agência de notícias anarquistas-ana
 
e um vaga-lume
lanterneiro que riscou
um psiu de luz
 
Guimarães Rosa

Putin, o tiraninho queridinho da esquerda, da direita…

Vladimir Putin, o tiraninho autocrata que é o queridinho da esquerda, da direita e dos bilionários oligarcas europeus.

Bug mental na militância pro Putin, afinal seria Putin de esquerda ou de direita, para saber se apoio ou não? Se você se perguntou sobre isso, não entendeu porra nenhuma.

O Putin apenas faz o jogo que lhe interessa. Ele não é puramente ideológico, ele abraça Trump/Orbán/Bolsonaro e ao mesmo tempo Maduro/Ortega/Lula, e ainda dá propulsão nos sonhos imperialistas da população invadindo os países vizinhos.

É um mestre da política, se perpetua no poder com os métodos stalinistas, e se mantém no luxo e na riqueza capitalista abraçado com os bilionários oligarcas, seus fieis sócios na partilha do Estado russo. Um verdadeiro malabarista, o melhor de todos os tempos.

agência de notícias anarquistas-ana

Outono
Empoleirado num ramo seco
um corvo

Matsuo Bashô

[França] O anarquismo pragmático | Não contem conosco para fazer parte dos anarquistas esquerdistas

Desde as últimas eleições legislativas, temos assistido ao florescimento de uma noção de anarquismo pragmático, que seria um anarquismo mais moderno e que votaria à esquerda para impedir a extrema direita de chegar ao poder. Adeus ao parlamentarismo anarquista tradicional e bem-vindo ao mundo das pessoas responsáveis que cumprem seu dever de cidadãos colocando um voto na urna ou apertando um botão. Não discutiremos desta vez nosso abstencionismo recorrente, mas insistiremos na inconsistência da esquerda francesa, pela qual não temos qualquer responsabilidade nas guerras de egos e poder. Nossos inimigos frequentemente nos acusam de nos trancarmos em nossa torre de marfim e de que é muito fácil estar certo contra todos. No entanto, gostaríamos de dizer aos nossos detratores que a lei do trabalho e as ordens do presidente Macron são responsáveis pelo enfraquecimento da representação sindical nas empresas. E que Hollande [ex-Presidente da França] aumentou nossa idade de aposentadoria com Marisol Touraine. Que a esquerda está bem dividida e não precisa de nós para isso. Que a esquerda não é anticapitalista nem antimilitarista, ao contrário dos libertários. Que a esquerda pretende aumentar as despesas militares, etc. Que o antissemitismo borderline de Mélenchon não nos agrada; que flertar com os militantes trotskistas do seu ex-partido, a OCI, não nos entusiasma, tanto mais que muitos militantes “insubmissos” relatam uma certa violência nas relações dentro do movimento populista. Que seguir Glucksman [político francês] não nos convém, pois ele é muito social-democrata e segue os passos de Hollande. Que os ecologistas partidários são políticos que só aspiram ao poder. Que nos lembremos das trajetórias políticas de François de Rugy, Brice Lalonde… sem contar as travessuras de certos eleitos com comportamento sexista e abusador etc. Os ecologistas sempre foram os suplentes do PS [Partido Socialista]. E trabalhar com comunistas de um partido stalinista é fora de questão; decididamente, os libertários estão a milhas de distância dos microcosmos políticos. E é a estes últimos que devemos nos unir para fazer barreira à extrema direita.

Aliás, Macron, Attal e companhia fizeram mais de escada do que de barreira ao RN [Reagrupamento Nacional].

Então, os anarquistas estão confinados a ver os trens passarem? Claro que não.

Para nós, o anarquismo pragmático tem outro sentido e outra prática. Quando vários horticultores, agricultores e criadores biológicos se juntam para criar uma quinta e um restaurante associativo, mesmo que nem todos sejam anarquistas, a iniciativa é anarquista. Quando um ex-funcionário público se reconverte em padeiro biológico e o seu forno solar é construído por estudantes de engenharia mecânica, a padaria pode não se chamar “a conquista do pão”, mas o espírito libertário está bem presente. Quando um centro cultural reúne uma biblioteca operária e juvenil, um centro documental, pintores, escultores e atores… para criações e exposições, isso se inscreve em um certo espírito libertário. Quando são ministrados cursos noturnos voluntários, quando as crianças são “orientadas” por animadores e professores libertários em atividades extracurriculares, etc., isso faz parte de uma concepção ampla e prática da pedagogia libertária. Quando festividades como o centenário da greve das sardinheiras em Douarnenez fazem sentido comum, ultrapassando as barreiras partidárias, isso também faz parte do espírito libertário combativo e memorial. Quando uma creche autogerenciada é criada com pais que doam seu tempo para reduzir custos e prestar serviços, essa é mais uma prática libertária em vigor.

Quando militantes se envolvem nas ZAD [Zonas A Defender), coletivos de luta contra o extrativismo, o enterramento de resíduos nucleares etc., muitos anarquistas estão presentes nessas lutas e lhes conferem um espírito autogestionário, mesmo que seja necessário manter a guarda alta para evitar a tomada do poder por certos protagonistas.

Quando 300 a 400 pessoas montam uma mercearia solidária e cooperativa, onde os associados doam seu tempo para fazer funcionar a estrutura sem funcionários permanentes, isso reforça nossas posições libertárias. Quando outra mercearia solidária faz um cadastro de idosos e deficientes que não podem se deslocar e recebem entregas, isso contribui para a ajuda mútua. Nas associações esportivas, libertários promovem o prazer do esporte longe das competições; nas associações culturais, um vento libertário sopra às vezes em lugares onde não se esperava.

Há mil e uma maneiras de dar vida à Ideia. Inúmeras experiências de SCOP [Sociedade Cooperativa e de Produção, um modelo de empresa democrática, NDT], de retomada do controle dos meios de produção, estão se ampliando. Não é preciso esperar pelo Grande Dia e muito menos pelos políticos, que sabemos que mais cedo ou mais tarde trairão. Vimos desfilar a esquerda plural no Primeiro de Maio de 2025 em Dunkerque para ressuscitar a ideia da nacionalização da ArcelorMittal, o que permitiria salvar os empregos e o aço francês. É novamente o país da fantasia. Por que essa esquerda política deixou fechar os altos fornos de Florange quando estava no poder com Hollande? Porque esses políticos têm facilidade em dizer que “as finanças são nossas inimigas” para captar os votos dos ingênuos, mas não deixa de ser verdade que os líderes da esquerda também são defensores do sistema capitalista. 

Os planos sociais se sucedem e a LVMH, multinacional que registra lucros superiores a 12 bilhões, pagou ao mesmo tempo três bilhões de dividendos ao seu principal acionista, Bernard Arnault, e demitiu 1.200 funcionários da sua subsidiária Moët Hennessy, principalmente por não substituir os funcionários que se aposentaram.

Portanto, os libertários não querem a vergonha nem a desonra de apoiar tal sistema. Se ser anarquista pragmático é votar nesse sistema injusto, não contem conosco para fazer parte dos anarquistas esquerdistas que só querem ficar na cola de políticos em busca de reconhecimento.

Ty Wi (GLJD)

Fonte: https://le-libertaire.net/lanarchisme-pragmatique/

Tradução > Accattone

agência de notícias anarquistas-ana

Maré outonal.
As ondas quebram na areia
Bem devagarinho.

Benedita Silva de Azevedo

[Uruguai] A esquerda é uma droga sistêmica

Por Raúl Zibechi | 07/05/2025

No Equador e na Bolívia, estão ficando evidentes as piores atitudes das esquerdas e dos progressismos. Em ambos os casos, trata-se de um desvio pragmático que substitui a ética pela ambição de poder e luxos, deixando de lado qualquer proposta programática e transformando a política em um mero exercício de acomodações personalistas para obter vantagens. Isso não é novidade, certamente, mas nos dois países mencionados, tudo já acontece sem a menor tentativa de disfarçar.

No Equador, os nove assembleístas do Pachakutik, partido de esquerda vinculado ao movimento indígena, assinaram um acordo com o governo de Daniel Noboa (classificado por essas correntes como ultradireitista) para lhe dar governabilidade, já que ele não tem maioria parlamentar. Eles declararam que agiram por “amor ao país”, mas escondem as prebendas que obtêm com essa atitude, que abre as portas para um governo antipopular, privatista e profundamente repressivo.

O partido de Rafael Correa não ficou atrás. Depois de firmar um acordo com a esquerda indígena e com o Pachakutik para apoiar Luisa González no segundo turno das recentes eleições, a candidata propôs ninguém menos que Jan Topic (outro ultradireitista) como futuro ministro do Interior, caso vencesse as eleições. Trapaças sobre trapaças, rasteiras por todos os lados, que só servem para desmoralizar as forças que se dizem de esquerda.

Na Bolívia, há pouco a acrescentar ao teatro do absurdo protagonizado por Evo Morales e pelo presidente Luis Arce, ambos do mesmo partido. Rafael Bautista resumiu isso claramente em um artigo recente: “Por trás de todas as ofertas de ‘salvar a Bolívia’, não há nenhuma salvação, apenas a vantagem proporcionada por uma situação criada para dar continuidade espúria ao mesmo círculo vicioso de um sistema e uma cultura política esgotados (que ainda pretendem preservar aqueles que veem o poder político apenas como um bem patrimonial).”

O pensador boliviano acrescenta que “nos 14 anos do ‘governo da mudança’, também se manteve o prebendalismo e o corporativismo dirigente para empoderar setores por pura conveniência política.” Sem diferenças programáticas, a disputa entre Morales e Arce se reduz a uma bruta e simples luta por poder pessoal, onde os caudilhos substituem propostas políticas por ambições individuais.

É a isso que a esquerda no continente foi reduzida: ambições de caudilhos e pequenos grupos para pegar as migalhas que caem da mesa do banquete neoliberal. Os povos ficam de fora dessa especulação das elites progressistas e só aparecem como recurso para derrotar o adversário. Porque já não conseguem disfarçar com palavras a crise ética que os envolve sem remédio.

O mais triste é que não há o menor sinal de autocrítica, que os líderes persistem no engano, seguindo um caminho que leva ao desastre sem consultar ninguém, a não ser sua própria sombra. Separar a ética da política foi o mesmo que se entregar ao mais cruel pragmatismo, onde se destacam as ambições pessoais. Nada mais.

Devemos entender que a esquerda é coisa do passado. Não podemos continuar presos à ideia absurda, desmentida mil vezes pelos fatos, de que existe uma contradição direita-esquerda, porque são exatamente a mesma coisa. As supostas diferenças são apenas um teatro, um show, para manter a população e os movimentos pendurados em um dilema inexistente.

O fim das esquerdas anda de mãos dadas com a crise do Ocidente, onde elas nasceram, e com as mudanças sísmicas e traumáticas do sistema-mundo, que não trazem nenhuma melhoria para os povos, mas apenas para as elites que já estão se acomodando diante das transformações que virão.

Mas, acima de tudo, devemos entender que os políticos de esquerda são parte das elites, dos de cima, que aprenderam a manipular os modos dos de baixo para enganá-los melhor. As mentiras demorarão um tempo para serem descobertas pela população que os apoia, mas não serão eternas, por mais danosas que sejam.

Uma última questão: o capitalismo não se sustentaria se não existisse a tal “esquerda”. O sistema precisa dela, assim como precisa de drogas para facilitar a dominação, porque é assim que controlam os desejos populares e suas organizações. Em suma, a esquerda é uma droga sistêmica.

Fonte: https://desinformemonos.org/la-izquierda-es-una-droga-sistemica/

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

Nas águas do mar
Águas-vivas flutuam
Tranqüilamente …

Miranda

Comunicado: 1ª Jornada Internacional Anarquista da Amazônia/Brasil | “Jornadas ANTI-COP”

Prezadas companheiras e prezados companheiros,

Como lembrete, e para aquelxs que possam estar interessadxs em se juntar a nós em nossa luta, a COP30 está sendo organizada em nossa cidade este ano, e ficaremos felizes em receber todxs xs ativistas libertárixs que queiram participar de atividades de protesto e denúncia da mais hipócrita das cúpulas destinadas a nos proteger das desgraças criadas pelos próprios organizadores do evento.

Teremos prazer em recebê-lxs e envolvê-lxs nos protestos planejados que estão sendo preparados no momento.

Agradecemos qualquer ajuda material que vocês possam nos fornecer (equipamentos de informática, áudio ou vídeo, por exemplo) e esperamos encontrar todxs que queiram se juntar a nós na luta que promete ser particularmente acirrada nas terras devastadas pelo agronegócio na Amazônia.

Além disso, ajudar-nos pode ser feito (e muito) compartilhando para todos os seus contatos libertários estas informações. Isso pode nos permitir conseguir levantar um verdadeiro bloco anarquista durante os dias de protestos que Belém vai conhecer durante a COP30.

Visto que os nossos povos amazônicos já estão mobilizados contra as leis que o governador do Pará tentou implementar contra eles, esperamos que a militância do Brasil como um todo e vindo dos outros países e continentes se faça presente conosco.

Para realizar isso, vamos hospedar, de modo militante, em nossas casas xs companheirxs oriundxs de fora do Pará. Para nos avisar da sua vinda, é só nos enviar uma mensagem eletrônica neste endereço: cclamazonia@gmail.com, indicando as datas de permanência em Belém e eventuais informações específicas a respeito das necessidades de hospedagem.

Em seguida, retomaremos contato para acertar os detalhes e confirmar a possibilidade de alojamento militante.

Ia JORNADA INTERNACIONAL ANARQUISTA DA AMAZÔNIA/BRASIL
“Jornadas ANTI-COP”

Data: 10 a 21 de novembro de 2025
Local: Belém / PA / Brasil


Vocês devem pensar em ter:
Uma rede
Um mosquiteiro
Repelente para mosquitos
Protetor solar
Um adaptador de tomada UE/EUA/Brasil

* Obs: em um outro chamado, pedimos um valor para a estadia dxs companheirxs. Após uma revisão dessa proposta, decidimos alojar de maneira solidária (gratuita) xs companheirxs que vão se juntar à nos nessa jornada.

Centro de Cultura Libertária da Amazônia – CCLA
Rua Bruno de Menezes (antiga General Gurjão) 301 – Bairro Campina – Belém do Pará.
cclamazonia@gmail.com
cclamazonia.noblogs.org

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https://noticiasanarquistas.noblogs.org/post/2025/04/17/sede-da-cop30-belem-prega-sustentabilidade-pra-gringo-ver/

https://noticiasanarquistas.noblogs.org/post/2024/09/27/cop30-amazonia-e-a-farsa-ambiental-do-capitalismo-verde/

agência de notícias anarquistas-ana

No frescor da sombra
Caldo pelos cotovelos —
Manga madura

Neiva Pavesi

[Finlândia] Vídeo | Principais aspectos da perseguição à comunidade LGBTQIA+ russa

Esta apresentação explora a situação atual da comunidade LGBTQIA+ na Rússia e destaca os desafios contínuos que ela enfrenta. Também inclui estatísticas de novembro de 2024, oferecendo uma visão geral do processo de refúgio para requerentes russos LGBTQIA+ na Finlândia, incluindo diretrizes gerais do procedimento oficial, a situação real e as dificuldades encontradas pelos requerentes.

Gravado no festival “Father Frost Against Putin” em 11 de janeiro de 2025.

Apresentação de Alex (Aleksandr) Nesterov – ativista LGBTQIA+ e de direitos humanos, defensor contra a guerra, fotógrafo e designer. Solicitante de asilo na Finlândia, Alex é membro ativo da QA:FI (Queer Asylum: Finland) e da Comunidade Democrática de Pessoas de Língua Russa na Finlândia. Ele esperou mais de 29 meses por uma decisão do Migri (Serviço de Imigração da Finlândia) e recebeu asilo após o festival.

>> Veja o vídeo aquihttps://www.youtube.com/watch?v=REOO3JRZSYA

Fonte: https://avtonom.org/en/news/key-aspects-persecution-russian-lgbtqia-community

Tradução > acervo trans-anarquista

agência de notícias anarquistas-ana

enamoradas…
as nuvens cinzentas
apagam o sol…

Rodrigo de Souza Leão

[Rússia] Apresentação do livro “Anarquismo e Filosofia da Educação. Experiência Pós-Soviética” em Yerevan

Em 11 de maio, às 20h, Maria Rakhmaninova, editora da Akrateia, PhD em Filosofia, fará uma apresentação de seu livro “Anarquismo e Filosofia da Educação. Experiência Pós-Soviética” em Yerevan, no espaço Мама джан (Spendiaryan 5).

O livro é a primeira coleção de entrevistas com educadores libertários no espaço pós-soviético e oferece ao leitor um panorama das experiências de várias práticas educacionais, desde a pedagogia da primeira infância até a educação universitária. Graças às muitas obras traduzidas que apareceram em russo nos últimos anos, não é segredo hoje que a tradição da educação anarquista tem uma extensa geografia, um rico corpo teórico e uma história impressionante. Em muitas regiões do mundo, esse campo do pensamento e da prática social vem sendo desenvolvido há muito tempo e de forma intensa. Para o mundo pós-soviético, esta tentativa de resumir a experiência contemporânea da educação libertária é a primeira. O livro explora as trajetórias de sua formação nos contextos tensos dos mundos pós-soviéticos e as possíveis direções para pesquisas futuras.

A coleção estará disponível para compra na reunião.

agência de notícias anarquistas-ana

Cigarras em coro
Ecoam no cemitério
Quebrando o silêncio.

Neide Rocha Portugal

Contra todas as igrejas | Poema anticlerical

Por Carlos Pereira Junior

Contra todas as igrejas

Nenhuma igreja me dirá o que pensar, / como viver, sentir e existir. / Nenhum papa, pastor ou embusteiro / me reduzirá a rebanho, / ou me porá de joelhos. / Pois não não acredito em metafísicas, / nas mentiras de um livro santo / e na sua moral duvidosa. / Repúdio a ideia de salvação, / hierarquias e ordem divina. / Contra a ilusão de vida eterna, / sou carne, mundo, finitude, / devir e imanência. / Não tentem ditar o que pode minha consciência.

. . .

Poema anticlerical

Alguma coisa morta / ainda se move / dentro de nós / através de toda metafísica. / Alguma coisa fedida, / podre e sagrada / ainda nos define a consciência da vida / como um suposto fato além matéria, / do mundo e da alegria Dionisíaca. / Nada é mais repugnante / que esta ilusão divina / que ainda sustenta o poder de estado, papas, pompas e hipocrisias.

agência de notícias anarquistas-ana

Ao fim da fogueira
Apenas cinco cachorros
Dormindo ao redor.

Miyoko Namikata