[Espanha] “É preciso ter fé na humanidade, no natural, para aspirar que essa mudança de estrutura seja possível”

[Entrevista a Jesús Lizano (Lizanote da Acracia), sobre seu livro: “Olá Companheiros! (Manifesto Anarquista)”.]

Antonio Orihuela > Jesús, você acaba de publicar um manifesto anarquista. O que há de novo em relação ao seu modo de pensar que nos oferece este livro?

Jesús Lizano < Mais que novidade, o culminar do meu pensamento, ou seja, uma fusão definitiva entre o poético e o libertário, que, na verdade, vem desde o início da aventura que vivo, claramente refletida nos meus poemas, e muitos fragmentos de meus “diários”, “cartas”, “artigos”… Culminação, sem dúvida, essa fusão a que deve aspirar a nossa espécie, a qual só o pensamento anarquista se fundiu com a poética, com a inocência do natural, isso sim, superando sua inevitável fusão com a política, pode levar-nos. Surpreenderá a muitos ver como é compreendido e aceito o ideal libertário, uma vez que se pode dar essa fusão. E este livro traz a visão que eu tenho mostrado de poema a poema, pensamento a pensamento, sofrimento a sofrimento, e compreensão a compreensão… Embora, na verdade, há muito tempo que, sem sabê-lo, já era libertário… Basta recordar o título de um de meus livros em edição de autor: “O meu mundo não é deste reino”…

Antonio > Como você se sente em seus oitenta anos: salvo, perdido…?

Jesús < O artista não vive para ele, se não para sua obra, e seu trabalho não é para ele, se não para os demais. Eu não me sinto, portanto, nem uma coisa nem outra… A pergunta que me faço é: o que será de Lizania? Até que ponto será reconhecida e compreendida… Embora a solidão sempre tenha sido minha companheira, a solidão “heróica”, como definiu o poeta Carlos Murciano em seu artigo falando sobre o meu livro “Heróis”… Vendo Lizania no contexto do “político-social” é entendido muito bem se você conhece a minha atitude de confronto com o poder literário (ver meu “Cartas”, ao mesmo tempo…)

Antonio > O que precisamos para conquistar a inocência?

Jesús < Não se trata de conseguir a inocência, mas a inocência nos conquistar, o que só é possível aproximando-nos do natural, vendo-nos como um fragmento da natureza, e não como a estrutura “dominante-dominado” que nos determina.

Antonio > É a cultura uma arma do poder?

Jesús < É inevitável que a cultura, tudo o que ela implica, está nas mãos do poder, dos dominantes. Para eles é uma arma fundamental com a qual eles podem nos manipular, nos mentalizar, usar-nos, e se conveniente nos sacrificar, juntamente com outros poderes, de modo que o que deveria ser a chave para a rejeição de todo poder é convertida em sua principal arma.

Antonio > Que bússola, direção, a humanidade precisa, Jesús, para se encontrar?

Jesús < Como em um século e meio atrás, no primeiro Manifesto Anarquista encontrou: a rejeição de todo o poder, da política, que é a luta pelo poder…, superando a estrutura dominante-dominado, a qual ainda estamos determinados, e começando a nos organizar em comunidades humanas, não, claro, políticas, religiosas ou familiares… É preciso nos organizar, mas não que uns poucos nos organizem, mentalizem e manipulem, e se convier nos sacrifiquem.

Antonio > Por que nos custa tanto trabalho nos reconhecer como mamíferos?

Jesús < Muito simples: porque durante séculos os dominantes vem nos mentalizando e enlouquecendo, mentalizados e enlouquecidos que são, impedindo de ver o natural, submetendo nossas vidas a essas idéias malucas, em conseqüência de todo o domínio que impede o livre processo de nossa mente ao natural, a sua conquista, o que impede vermos a todos companheiros, ver o denominador comum que nos une para além dos incontáveis números ​​diferentes que confundem-nos, e enfrentar a nossa complexidade; ver, finalmente, a ajuda mútua como a única “lei”, a única “moral”, a única “verdade”… Ver o que, francamente, somos: mamíferos…

Antonio > Está longe o Mundo Real Poético?

Jesús < A poesia do mundo real está aqui, no natural, na sua beleza, na sua inocência, na fusão da unidade e do diverso. Somente nossa loucura nos impede de apreciá-lo, entre as luzes e as sombras naturais, perdidas no poço político. E, claro, é preciso ter fé na humanidade, no natural, para aspirar que essa mudança de estrutura seja possível… enfim: leia Lizania, aventura poética e libertária.

Para baixar o livro em PDF: http://www.lizania.net/

Fonte: Periódico “CNT” – junho de 2011