[Colômbia] Máscara do filme ‘V de Vingança’ tornou-se um ícone global

Passou de assinatura de um poderoso grupo de hackers a um símbolo do descontentamento mundial.

Uma máscara pálida e zombeteira vem se tornando o símbolo de manifestantes em todo o mundo. E a tal ponto que hoje compete com a mítica imagem de Che Guevara, captadas por Alberto Diaz ‘Korda’, ao menos entre os jovens.

Anonymous, o maior e mais temido grupo de hackers, a converteu em um ícone internacional ao usá-la como uma assinatura de ataques cibernéticos sem precedentes contra governos e grandes corporações. Mas faz um tempo que este símbolo deu um salto do mundo cibernético às ruas. Por isso, hoje ele é visto também em movimentos por uma melhor educação no Chile; as reivindicações dos ‘indignados’ na Espanha, os protestos de dissidentes na China ou nas marchas contra a cientologia na Inglaterra, para citar apenas alguns exemplos.

A máscara, tal e como a conhecemos, veio do filme V de Vingança (2006), que é baseado na novela gráfica de Alan Moore, ‘A Conspiração da Pólvora’. Trata-se de uma história inspirada em Guy Fawkes, um católico inglês que orquestrou no início do século XVII um complô para matar o rei James I e a sua corte protestante de uma só vez. Seu plano era explodir o Palácio de Westminster, em novembro de 1605, durante a sessão de abertura do parlamento. Coisa que não conseguiu.

O filme, ambientado no futuro, conta a história de um homem misterioso, uma espécie de justiceiro solitário que, por trás de uma máscara, realiza atentados para combater um governo ditatorial, ultraconservador e fascista que controla a Inglaterra. Algo que recorda os regimes que George Orwell e Aldous Huxley descreveram em seus livros 1984 e Admirável Mundo Novo.

Mas como terminou essa máscara, um híbrido de história e ficção, tornando-se símbolo de rebeldia e inconformismo a nível global?

Para o analista simbólico e pesquisador Rodrigo Argüello, exceto de que a máscara é um elemento esteticamente atraente, tem várias mensagens implícitas muito fortes: a mensagem libertária, um anonimato que representa milhões e a possibilidade de que esses milhões possam identificar-se, unirem-se e expressarem-se através de um símbolo poderoso que, também, os protege.

“Há um fim, que é a transformação dos indivíduos isolados em coletividade, livrando-se da severidade, do jugo, do tédio da vida cotidiana ou para rebelar-se ao imposto, ao dogma e aos fundamentalismos”, diz o especialista, que recorda que Nietzsche costumava dizer que “o profundo ama a máscara”.

No entanto, ele salienta que “não devemos esquecer que antes destes movimentos de protesto que hoje vemos uma grande quantidade da máscara, o filme V de Vingança já havia se tornado uma referência para os jovens, pois não é qualquer filme: tem uma mensagem política muito poderosa”.

“O preocupante, acrescenta, é que isso poderia abrir caminho para uma espécie de ‘anarquismo’ ou ainda, de ‘terror anônimo’, de inspiração gótica, que na literatura e no cinema é bom, mas que na realidade pode ser uma área mais complexa”.

O sociólogo e pesquisador em questões de cultura juvenil, Fernando Quintero, opina que isso se tornou “uma espécie de manifesto contemporâneo de uma nova ação política”.

“É uma forma de expressão política que se misturam as diferentes causas: desde o ambientalismo ao anti-consumismo. Uma idéia de protesto, de rejeição, predominantemente antissistema, e onde a força não vem de uma identidade clara, nem de uma cabeça ou um líder, mas da unidade de uma grande multidão anônima”.

Alfredo Molano, colunista e estudioso de processos sociais, diz que o que a máscara faz é “unir milhares em um propósito sem permitir identificar as pessoas que estão por trás desse propósito”. E explica que esta necessidade de “anonimato” está fortemente influenciada pelo medo às “acusações, à exclusão ou à repressão dentro de um sistema que se percebe muito parecido com a idéia orwelliana do “grande irmão”, ou seja, desse Estado todo-poderoso que tudo vê e observa: por meio de cartão de crédito, de telefone, twitter, e-mail, etc.”.

E conclui: “É a reação de uma população que se sente agredida pelo desemprego, pelo consumo agressivo e falta de oportunidades, em um mundo que os ignora como pessoas e apenas os vê como números, como compradores, e como potenciais consumidores”.

Um tremendo negócio

O maior paradoxo desta história é que este símbolo moderno do inconformismo se tornou um enorme negócio, especialmente para a companhia cinematográfica Warner Bros. que, depois de haver produzido o filme, possui os direitos do ícone de bigode fino e bochechas rosadas .

A máscara já alcançou o honroso título de ser o artigo mais vendido na amazon.com, onde se pode comprar por 7 dólares e onde supera as vendas de outras máscaras, como as do Batman, Harry Potter e Darth Vader.

“Vendemos mais de 100.000 destas máscaras ao ano e é a mais vendida, das outras apenas vendemos cerca de 5.000”, disse ao ‘The New York Times’ Howard Beige, vice-presidente executivo da Rubie, a empresa de Nova York que as produz.

O próprio Beige confessou que a princípio pensou que as pessoas realmente gostavam muito do filme. Opinião que mudou quando começou a ver imagens de manifestantes com a máscara em todo o mundo.

Por: Andrés Rosales

Fonte: El Tiempo.com