[Espanha] Entrevista com o projeto “Local Anarquista Magdalena”

Pergunta > Como surge o projeto do Local Anarquista Magdalena?

Resposta < O Local Anarquista Magdalena está localizado no número 29 da rua Magdalena (Antón Martín) na 2º esquerda [Madri]. É um lugar que tem uma longa tradição anarcossindicalista e que há alguns anos passou a ser gerido por coletivos anarquistas, mas sem caráter sindical. O local é utilizado principalmente para reunir e armazenar o material dos coletivos. É ao final de 2003, com o nascimento da biblioteca, quando se abre, mais especificamente, o processo que tornou o local o que é hoje. Nos meses posteriores inicia-se a trabalhar a idéia de abrir uma livraria e uma videoteca, e finalmente é inaugurada no dia 11 de fevereiro de 2006. Embora a princípio os três projetos mencionados operassem autonomamente, o passar do tempo nos fez ver que todos tínhamos o mesmo objetivo, a divulgação das idéias anarquistas e os problemas e lutas que nos parecia interessante, assim passamos a trabalhar juntos. Também conjuntamente gerimos o calendário de atividades, que consiste principalmente em palestras e debates, mas também em fazermos alguma projeção e alguma exposição.

Pergunta > Quais são os projetos que integram e participam do Local Anarquista Magdalena?

Resposta < O local, há muito tempo, foi estruturado por quatro projetos principais: uma livraria, uma biblioteca, uma videoteca e um arquivo, que atualmente está em processo de classificação e catalogação. Esses quatro projetos compartilham um mesmo objetivo principal, que marca a linha das pretensões do local, a compreensão crítica da realidade circundante e servir como ferramenta para a difusão e fortalecimento das idéias libertárias e contestadoras mediante material escrito e audiovisual. Queremos evitar que todo esse material fique inerte em suas prateleiras ou disponível apenas para aqueles que vêm ao local porque todos os domingos o levamos à rua –  mais adiante falaremos sobre isso e da praça Tirso de Molina. Assim, em todos os meses são realizadas atividades, palestras, exposições, apresentações de livros, projeções, etc. Algo notável também é que o projeto em geral serve de suporte para outros projetos que existem ou estão sendo elaborados nos últimos meses em Madri. Este é o caso da nova rádio “cabeças de tempestade”, que colocou seu estúdio de gravação em uma das habitações do local, ou diferentes assembléias, desde aquelas que abordam áreas como exploração e libertação animal ou a reclusão na prisão ou em centro de menores, até outras, como as do “Encontro do livro anarquista de Madri” ou as de projetos tão importantes como este jornal que nos entrevista. Para coordenar os projetos principais que integram o local, nos reunimos em uma assembléia de gestão onde distribuímos o trabalho e nosso tempo livre para fazer avançar os mesmos.

Pergunta > Quais são seus objetivos principais e que dificuldades encontraram para realizá-los?

Resposta < Como objetivos temos dois principais: o primeiro, ser um ponto de informação e discussão, uma referência no sentido de que as pessoas interessadas em certas idéias saibam que aqui podem encontrar esse material, que aqui pode interar-se. O outro objetivo principal seria colocar nossos recursos à disposição do “movimento” anarquista, isto é, que os coletivos e indivíduos utilizem o espaço se necessitarem, seja para realizar atividades, seja para fazer suas reuniões, seja para deixar sua propaganda e outros grupos buscá-la.

Quanto às dificuldades, na seção de divulgação, são várias que temos encontrado. A primeira é que manter uma livraria, uma biblioteca, uma videoteca e um espaço de debates, entre algumas pessoas, supõe uma grande quantidade de trabalho. Às vezes tem-se o tempo necessário e tudo funciona perfeitamente; outras vezes as forças estão mais ajustadas e se leva adiante a tarefa na base de esforço. É uma questão de ritmos, que em projetos como uma biblioteca, onde o ritmo é você quem dá, é mais suportável que em uma livraria, mais condicionada pelas novas publicações, intercâmbio com outras livrarias e distribuidores, feiras do livro, etc. Em todo caso, continua a ser uma questão interna que só de nós depende gerenciar.

Outra dificuldade é que Magdalena está localizada em um segundo piso e isso leva as pessoas para trás, acham que será escuro, com um ar de suspense, e é apenas um local, mas no segundo piso. Ter um espaço no nível da rua nos faria mais acessível, mas as condições econômicas deste local são muito favoráveis ​​para deixá-lo (já que qualquer outro do centro é muito proibitivo economicamente para ser resolvido facilmente). Também o fato de chamá-lo “anarquista” é por vezes uma espécie de barreira (outras vezes é o oposto, depende da pessoa e da sua vontade ou conceito do termo).

Quanto ao segundo objetivo, fazer com que os anarquistas sintam que pode contar com o local e o utilizem; a verdade é que é um objetivo que se consegue lentamente, especialmente porque desde poucos anos atrás são cada vez mais as mostras de apoio real que recebemos, mais coletivos reúnem-se no lugar (são nove ao dia hoje) e mais pessoas sentem o espaço como seu e o utiliza. Dificuldades que tivemos nesse sentido, as mesmas de qualquer pessoa que viva em uma cidade como esta: custa estar perto de outras pessoas, é difícil estabelecer relacionamentos verdadeiros e duradouros, custa criar confiança mútua. A maneira de lidar com isso tem se mostrado com afinco e com interesse ​​em avançar nessa direção.

Pergunta > Quais projetos têm para o futuro?

Resposta < Consideramos essencial a salientar a importância que tem para nós a evolução que tem sofrido o projeto de alguns anos atrás até aqui. A capacidade e esforço que muitos companheiros tem tido durante todo este tempo fez com que o projeto do Local Anarquista Madalegna tomasse um rumo mais definido, algo tremendamente positivo. Agora o que nos interessa é que os projetos que integram e participam no local se fortaleçam e progridam em seus objetivos. Por tudo isso, mais que projetos futuros, preferimos falar de projeção para o futuro.

Como mencionamos, nestes últimos anos, apesar das dificuldades que qualquer projeto pode se encontrar – que não foram poucas – fizemos com que o local seja um espaço de confluência para algumas iniciativas de caráter libertário que venham nascendo em Madri. Embora não tenhamos ainda rompido com o “gueto” que nos caracteriza ao ambiente libertário, conseguiu-se que o local gradualmente se torne um ponto de encontro entre companheiros, seja para discutir, reunir-se, deixar propaganda, etc.

Gostaríamos que qualquer interessado ​​de fora dos nossos ambientes participe do local, mas estamos cientes da dificuldade de romper o isolamento social que temos e onde estão imersos os anarquistas. No entanto, é verdade que, apesar de poucas, vêm pessoas de todo tipo. Por outro lado, também estamos cientes da dificuldade e do tempo que vamos levar realizando esse objetivo e por isso não somos ansiosos, pois o projeto vai cumprindo muitos outros. Uma das nossas pretensões principais é que o local seja identificado como uma ferramenta para o movimento libertário, ou seja, que as pessoas o sintam como algo seu e participe – formando-se, reunindo-se, sugerindo atividades, etc. – como for possível. Assim, vamos verificando que com a cooperação e apoio mútuo de todos os companheiros envolvidos e os projetos mencionados, se cria um senso de coletivo que vai se materializando e modelando na efetividade de todos esses projetos envolvidos no local.

Pergunta > Por que optaram pelo aluguel e não pela okupação para um projeto como este?

Resposta < Quando se pensa sobre o projeto que quer fazer, se considera a melhor maneira de fazê-lo, o que é necessário e o que é a melhor coisa para isso. No nosso caso, a primeira coisa que precisávamos era ter um espaço e para isso podes ter duas opções, ocupar ou alugar. Nós queríamos oferecer um lugar para a divulgação de idéias libertárias e contestatórias como uma livraria, biblioteca, videoteca, atividades, etc. e fazer do local um ponto de encontro onde as pessoas pudessem se encontrar e deixar sua propaganda. Estamos conscientes de que isto não é alcançado da noite para o dia, mas ao longo de um processo que reúne tempo e esforço. Atualmente é quando o local está se tornando no que estamos descrevendo.

E passado já um tempo começamos a ver que o trabalho investido valeu a pena. Algo que nos deu a oportunidade de construir um projeto desta natureza, ou seja, um projeto permanente, tem sido possuirmos um espaço relativamente duradouro, alugado. Apesar das contradições que isso implica para nós, estarmos à custa de um contrato de arrendamento ou de uma pressão imobiliária especulativa, acreditamos que o aluguel nos deu a possibilidade de manter o projeto estável, algo que a ocupação não pode garantir. Uma de nossas prioridades no projeto, como dizemos, é a difusão através de material escrito e audiovisual. Manter uma biblioteca, uma videoteca, uma livraria e um arquivo – além dos outros projetos que compõem o local – sob condições inseguras, é um risco que não queremos correr, pois há muito esforço e dinheiro investido, bem como material que queremos deixar sempre disponível para o interessado e que não queremos perder, por exemplo, por uma ordem de despejo.

Pergunta > O que é para vocês a distribuição alternativa e que papel desempenha para vocês a praça de Tirso de Molina?

Resposta < A distribuição alternativa não é nada além de uma ferramenta que oferece a opção de mover o material fora dos canais comerciais. Também possibilita obter benefícios para projetos existentes e a continuidade da mesma distribuição. Isto é, uma rede de bibliotecas, editoras, distribuidoras… à margem do que poderia ser da rede oficial com que trabalham a Casa do Livro, Carrefour, as livrarias da rua… A característica da distribuição alternativa é que não busca o ganho pessoal. Ao contrário dos enfoques mercantis e comerciais de consumo, a distribuição alternativa não busca outro benefício que a possibilidade de difusão de um determinado material. Nesse sentido, o que diferencia um distribuidor ou livraria como a nossa das empresas que lucram com venda de livros é que o tempo investido no projeto é o nosso tempo livre. Ou seja, não temos atribuído um horário de trabalho ou qualquer coisa assim, mas o fazemos porque queremos e por difundir nossas idéias. Para fazer isso, como dizemos, estamos organizados em assembléias e distribuímos o trabalho a ser feito para manter e avançar o projeto.

Por outro lado, a Praça de Tirso de Molina desempenha um papel muito importante dentro do que vínhamos comentando sobre a distribuição alternativa, já que toda manhã de domingo, coincidindo com o Rastro, são montados muitos postos de índole política, que também tem projetos como o nosso. Para nós, montar o posto da livraria em Tirso de Molina todos os domingos significa prolongar o trabalho constante que fazemos no local. Isto é, é uma forma de trazer material à rua e facilitar a difusão das idéias nele contidas. Tirso de Molina é um ponto de encontro dos projetos e distribuidoras políticas e uma referência para a abordagem e conhecimento das idéias de contestação, convocatórias, etc. Anteriormente, quando não era tão vigente a internet, a única maneira de interar-se sobre as convocatórias era de boca em boca, por panfletos… e Tirso de Molina era um lugar onde podias encontrar todas essas informações. Se quisermos, pode seguir sendo.

Aproveitamos a oportunidade para dar uma saudação a todos os distribuidores que, graças ao seu empenho e dedicação, tudo isto é possível. Obrigado por seu esforço, por passar horas e horas sentados atrás de uma mesa em um concerto, em jornadas, em uma praça, etc, espalhando nossas idéias.

Mais infos: www.localanarquistamagdalena.org

Fonte: Jornal “Todo por Hacer”

agência de notícias anarquistas-ana

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No batente
Som dormente
Ângelo Amarante