Musa Balde tinha 23 anos de idade. Na noite entre sábado e domingo, ele morreu na CPR [“centros de permanência para repatriação”].
No dia 9 de maio ele estava em Ventimiglia, fora de um supermercado onde estava tentando obter algum dinheiro. Três homens o atacaram com pontapés, socos e barras. Alguém faz um vídeo: Musa está no chão, encolhido enquanto os três homens o atacam.
Uma história de violência racista como muitas outras: apenas a difusão das imagens impede que o silêncio caia sobre sua história, porque pessoas como Musa raramente têm a possibilidade de contar e de serem acreditadas. É evidente que a mídia dá amplo espaço à versão dos agressores, que o acusam de tentativa de roubo, como se essa acusação pudesse tornar menos grave uma surra brutal.
Musa nasceu na Guiné: ele foi um dos muitos que tentam ganhar a vida, esperando cruzar a fronteira, continuar a viagem, dar sentido ao seu projeto de vida.
Em Ventimiglia, como nas montanhas do Piemonte, a fronteira é uma linha virtual para aqueles que têm o que é preciso para viver na Europa. As portas estão fechadas para os pobres, para os muitos que partiram em sua jornada da África despojada, colonizada e desertificada.
Na França, Musa tinha conseguido chegar e trabalhar por um tempo. Mas então ele, naquela cidade fronteiriça, conseguiu estudar, fazer o ensino médio, construir uma rede de amigos e solidariedade. Ele frequentou o centro social La talpa e l’orologio (A toupeira e o Relógio), e também participou de iniciativas e manifestações antirracistas.
No dia 9 de maio Musa é levado ao hospital: tem alta no mesmo dia, sem receber os papéis com o diagnóstico. Ele passa a noite em uma cela de segurança. Na manhã seguinte, ele é levado para Turim, onde, após a audiência de validação, é trancado na CPR de corso Brunelleschi.
Entre os muitos papéis que o fazem assinar, não há nada sobre a surra que sofreu.
Ele logo termina em solitária. Provavelmente eles o colocaram no chamado “pequeno hospital”, uma área da CPR próxima à parede onde existem celas individuais semelhantes a galinheiros. Nada a ver com um hospital. Apesar das feridas evidentes em seu rosto, Musa nunca é examinado.
Seu advogado o encontrou duas vezes e ele parecia muito abatido, incapaz de entender por que estava preso depois de ser atacado. A razão é trivial: sua rápida deportação teria tornado o julgamento contra seus agressores muito difícil.
Musa morreu sozinho. De acordo com reportagens da mídia, foi suicídio. Os rumores que saem da CPR falam de uma nova surra por parte dos guardas.
Uma coisa é certa. Estamos diante de mais uma vítima de fronteiras, de prisões para os indocumentados, de violência estatal contra pessoas racializadas.
Eclodiram protestos na CPR: os prisioneiros decidiram imediatamente entrar em greve de fome. Ontem à noite, incêndios foram ateados em duas áreas da prisão para migrantes.
À noite, nas paredes do Escritório de Imigração da Sede da Polícia de Turim, apareceu a escrita “Musa: assassinato do Estado”. Queimem a CPR”!
A história da CPR em Turim é marcada por tantas vidas destruídas… Fathi, Feisal, Musa e muitos outros cujos corpos são marcados por espancamentos, cortes auto infligidos para escapar da deportação.
A CPR é uma lixeira social, onde os inimigos de uma guerra não declarada, mas feroz, são reunidos. A “hospedaria” é um não lugar, o nome alude aos cuidados, mas se refere aos antigos hospícios para os pobres. Um leprosário para os indesejáveis.
Todos os dias as fronteiras matam. As CPRs são a fronteira no meio de nossas casas. A alguns passos do nicho onde Musa morreu vivem meninos e meninas da mesma idade, que tiveram a sorte e o privilégio de nascer no lado “direito” da fronteira.
Há aqueles que acreditam que esta é a ordem do mundo.
Não temos a intenção de nos resignar a esta ordem. Estamos ao lado daqueles que lutam na CPR e ao longo das fronteiras feitas de nada que só a violência dos Estados torna real.
A indignação não é suficiente. Precisamos atrapalhar.
Se um dia nos perguntarem onde estávamos quando pessoas morreram no mar e nas montanhas, quando em nossas cidades havia prisões para pessoas viajantes, gostaríamos de poder responder que estávamos lá, com outros, na luta contra todas as fronteiras, Estados e prisões.
Federação Anarquista de Turim
>> Para Musa e os outros. Comício e manifestação até a CPR <<
Terça-feira, 25 de maio, CPR de Turim. Mais de duzentas pessoas participaram da manifestação lançada pela assembleia “Não a CPR” e da reunião ilegal em frente às paredes da prisão para migrantes, onde, em uma cela de isolamento, morreu Musa Balde. Intervenções, batucadas, música durante uma hora e meia. Depois, formou-se uma marcha, para contar ao bairro, o que acontece a alguns passos de suas casas. Para contar sobre vidas sob chantagem, vidas tornadas ilegais por uma lei racista e classista, uma lei que cria uma lacuna entre os submersos e os salvos. Um sulco feito de homens em armas, prisões, solidão, falta de cuidado, celas de isolamento para aqueles como Musa. Pessoas sem valor, armas descartáveis. As garantias são todas para os três batedores com passaporte italiano, que o massacraram em Ventimiglia.
A indignação desta vez foi além das paredes da CPR, dos círculos de camaradas que sempre estiveram lá, mas a história de Musa é apenas a última de muitas, surgiu graças a um vídeo que mostrou a violência que ele sofreu em Ventimiglia. A violência do Estado, das prisões, das leis permanece nas sombras da narrativa da mídia.
A CPR mata. Ano após ano, a lista de homens e meninos que morreram na CPR cresce mais, por causa dos espancamentos, da falta de cuidado, da indiferença.
A indignação não é suficiente. É necessário chegar ao meio, é necessário lutar para que as paredes da CPR permaneçam apenas na memória.
Fonte: https://www.anarresinfo.org/musa-omicidio-di-stato-al-cpr-di-torino/
Tradução > Liberto
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