Por Julián Sorel | 20/06/2021
Na última segunda-feira começou o julgamento contra Aung San Suu Kyi, eleita democraticamente em novembro e derrubada em 1º de fevereiro por um golpe de Estado do exército. Em meio à onda de violência que sacode o país, os punks da Birmânia (Myanmar) se organizaram para enfrentar os militares e denunciar a repressão.
Segunda-feira foi o primeiro dia do julgamento da líder birmanesa Aung San Suu Kyi, presa após o golpe de Estado pelas forças militares sob o comando do General Min Aung Hlaing em 1º de fevereiro em Myanmar, a antiga Birmânia. Desde fevereiro, milhares de birmaneses têm protestado nas ruas e entre 800 e 900 morreram violentamente em confrontos com o exército e a polícia. Os punks birmaneses, que surgiram sob a ditadura militar nos anos 90, agora, em meio a protestos inflamados e terror pela possibilidade de uma nova ditadura, estão se destacando com sua revolta forte e determinada. Membros da cena punk birmanesa juntaram-se à resistência que guarda as ruas das principais cidades de Mianmar para impedir que o Tatmadaw – os militares – sequestrassem os manifestantes, enquanto a televisão estatal expõe listas de pessoas a serem presas e a junta militar bloqueia as fronteiras e o acesso à internet. Bandas punk como The Rebel Riot, Kultureshock, The Outcast e The Slingshot, entre outras, formaram o coletivo Cacerolazo (Panelaço), nomeado após a forma de protesto antigovernamental popularizada por esse nome desde os anos 70 em vários países da América Latina. Hoje, a grande repercussão do Cacerolazo birmanês ressoa e, testemunho do descontentamento geral contra a junta golpista militar, abala com seu ritmo indomável todo o território. Assinada pelo Cacerolazo, a música The Night Will Not Be Silenced, composta, escrita e gravada por bandas de punk rock da antiga cidade de Rangoon (agora Yangon), capta o barulho que varre pela Birmânia todas as noites quando, às 20h, os manifestantes começam a bater panelas e panelas. “A noite não será silenciada” é o slogan do tributo às centenas de pessoas mortas pelas forças de segurança desde fevereiro.
A comunidade punk birmanesa organizou o projeto Food Not Bombs, que durante anos, e com maior intensidade desde que os líderes golpistas tomaram o poder em fevereiro, vem distribuindo alimentos para os mais necessitados. Japan Gyi, vocalista da banda Outcast e ativista da Food Not Bombs, foi hospitalizado em março durante uma violenta repressão no bairro da classe trabalhadora de Hlaing Thar Yar, no extremo oeste de Yangon, um dos mais populosos do país e um enclave industrial com centenas de fábricas têxteis chinesas, onde muitos de seus 700.000 habitantes, muitos deles migrantes rurais tentando escapar da pobreza, trabalham. A página Food Not Bombs no Facebook relatou: “Desde o golpe de 1° de fevereiro, nossa comunidade tem estado indignada. Protestamos, e no início o protesto foi pacífico. Após um tempo, o protesto foi violentamente reprimido, pessoas foram presas, espancadas e houveram até mortos. As mortes dos manifestantes estão aumentando de dia para dia. Mesmo assim, não paramos de protestar de todas as maneiras possíveis. Hlaing Thar Yar é o lar de muitas pessoas da classe trabalhadora de todo o país. A junta reprimiu a Hlaing Thar Yar mais do que outras cidades para defender as fábricas chinesas. Em 14 de março, Japan Gyi participou dos protestos em Hlaing Thar Yar. Naquela noite, soldados e policiais chegaram para reprimir e começaram a usar gás lacrimogêneo, balas de borracha e balas reais. Mais de 50 pessoas foram mortas e muitas ficaram feridas. Japan Gyi foi baleado (possivelmente com uma bala de borracha) no braço direito e quebrou um osso. Ele foi levado para o hospital e foi engessado. Seu braço ainda não está bem. Nossa comunidade está preocupada com sua condição. Ele não só é vocalista, mas também toca baixo, bateria e violão. Ele é um jovem importante para nossa comunidade, entregando alimentos com o Food Not Bombs. Estamos todos rezando para que seu braço se recupere. Precisamos de apoio para sua família. Esperamos que ele esteja de volta conosco em breve. Não é apenas o punk que é a trilha sonora para a luta. A canção Kabar Ma Kyay Bu (Não esqueceremos até o fim do mundo), emblemática de outra revolta birmanesa em 1988, com letra e música revolucionárias do clássico do Kansas Dust in the Wind de 1977, está mais uma vez varrendo Myanmar este ano, enquanto os violinos, harpas, violoncelos e trombones dos jovens músicos da orquestra Generation Z MM fazem vibrar o centro de Yangon.
Em Yangon, Kyaw Kyaw, o famoso vocalista do grupo punk Rebel Riot, um conhecido membro dos protestos, estava na mira das forças de segurança. Ele ouviu que seria preso e não se escondeu, mas no dia em que vieram buscá-lo em sua casa, os soldados foram chamados para outra área da cidade onde, por coincidência, 3.000 trabalhadores tinham acabado de entrar em greve. Kyaw Kyaw juntou-se a outros punks para organizar o Cacerolazo e depois produziu One Day, um vídeo gravado com sua banda nas ruas no início da manhã para filmar as imagens antes que os militares pudessem detê-los. Rebel Riot lançou a canção ACAB: “Nós, Rebel Riot, estamos indignados com a injustiça e brutalidade da polícia contra manifestantes pacíficos. Nós protestamos nas ruas e através da música com nosso vídeo ACAB. Não se trata apenas de uma canção. Nele retratamos a violência policial. Esperamos que ela sirva a esta revolução. A letra diz: “Nós não acreditamos no sistema de justiça. Polícia imunda. F**k the police. ACAB”.
Notas
> Você pode conferir The Night Will Not Be Silenced, do coletivo punk yangon punk Cacerolazo, aqui: https://www.youtube.com/watch?v=NNOwIvsNfD4
> Você pode assistir à ACAB, do The Rebel Riot, aqui: https://www.youtube.com/watch?v=wRjL-YD9oYI
> Você pode assistir ao documentário My Buddha is Punk (Andreas Hartmann, 2015), sobre a cena punk birmanesa, aqui: https://vimeo.com/ondemand/mybuddhaispunk
Tradução > Liberto
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https://noticiasanarquistas.noblogs.org/post/2021/02/17/mianmar-videoclipe-rebel-riot-one-day/
agência de notícias anarquistas-ana
Aconchegantes,
Os raios do sol de inverno —
Mas que frio!
Onitsura
Avante!
Obrigado, Mateus!
Incrível texto. O Nestor não conhecia. Bravo!!
Tradução ruim para o título... No texto - se não nesse, no livro - ele faz uma distinção entre shit…
tmj compas! e que essa luta se reflita no bra$sil tbm!