por Joseph SP. | 09/10/2019
Quase nunca me pronuncio por redes sociais, mas hoje não deixei de pensar nas condições de turbulência social que vive o país e as maneiras nas quais afetam a minha vida. Alguns em redes sociais fizeram um chamado à PAZ e a calma, clamando pela paralisação das mobilizações dos setores mais despossuídos da sociedade: xs indígenas, xs camponesxs, as mulheres e os estudantes. Com hashtags como #EcuadorPaísdePaz nos fazem crer que a PAZ esteve sempre aí e que unxs “outrxs” vieram quebrá-la e vandalizá-la. No entanto, me é impossível pensar se realmente teve PAZ e se outros similares a mim a tiveram antes de todas estas manifestações. Realmente tenho PAZ? Quem a tem? Que é realmente a PAZ?
Já faz muitos anos, venho pensando com muita tristeza e decepção se poderei cumprir minhas metas em um contexto onde não existem oportunidades de vida para jovens e pessoas que se dedicam às ciências sociais. Todas as manhãs me levanto com ansiedade e refletindo sobre minha possibilidade de desenvolver minha existência em uma sociedade atravessada pela desigualdade, a discriminação, a corrupção e a homofobia. Tive PAZ? Faz quase três meses, um amigo de quem sinto falta, decidiu sair do país pelas péssimas condições laborais do Equador e pela homofobia recalcitrante de sua família. Se graduou em Hotelaria e desde então (já quase um ano) não conseguiu um emprego fixo nem reconciliar-se com seus seres queridos. Agora se encontra como ilegal nos EUA tratando de sobreviver em um contexto onde os migrantes e latinos são perseguidos ou tratados como corpos de carga para explorar e violentar. Quando converso com ele rimos e damos alento, mas refletimos se em algum momento voltaremos a nos ver. Acaso tivemos PAZ?
Sem falar de outros corpos nos quais a pobreza se expressa em condições básicas de necessidade e onde a violência parece ser um ato cotidiano de cada dia. Penso, por exemplo, nos milhares de casos de feminicídio onde os assassinos são absolvidos pelos tribunais; na quantidade enorme de pessoas em hospitais públicos que jamais serão atendidas ainda em condições catastróficas; nas milhares de crianças que trabalham nas ruas e praças da cidade; nxs milhares de desempregadxs urbanos que desesperadamente buscam uma forma de sobrevivência para elxs e suas famílias. Acaso elxs e suas famílias tiveram PAZ?
A PAZ, queridxs amigxs, se converteu em um bem a que é possível aceder por uma articulação complexa de fatores que envolvem a classe, a raça e o gênero. A PAZ, em nosso contexto como país (e latino-americano) unicamente o conseguem aqueles que podem aceder a um seguro privado, a um emprego, a uma moradia, a um salário digno, a férias, etc. Quantas pessoas neste país têm um trabalho digno? A quantas pessoas lhes pagam o que merecem? Quantos estudantes têm assegurado seu futuro? Quantos jovens chegarão sequer a estudar? Quantos indígenas e camponesxs acedem a serviços básicos como água, saúde e moradia e outras coisas? Quantas mulheres e LGBTI vivem em espaços seguros, sem violência nem discriminação? Nebot, Guillermo Lasso e toda a horda de banqueiros e empresários de merda que apoiam as campanhas a favor da “PAZ” no Equador, podem falar dela porque suas putrefatas existências se mantêm asseguradas pelo trabalho e despojo de outrxs. Falam de PAZ porque não conhecem o que significa trabalhar e não ter suficiente para alimentar a ti e a tua família. Falam de PAZ porque não sabem o que significa migrar e sofrer discriminação na rua e no trabalho. Falam de PAZ e não conhecem o que significa receber abusos constantes de teu parceiro e estar ameaçada de morte todos os dias. Falam de PAZ, mas não sabem o que significa ir a um hospital e não ter dinheiro para salvar a tua mãe, pai, avô, amigo…
Quem fala de PAZ?
Tradução > Sol de Abril
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