[Espanha] Falemos de coerção e liberdade sindical

O caso dos sindicalistas da CNT Xixón condenados por realizar sua atividade sindical é fundamental porque poderia criar um precedente. É urgente propor uma emenda legal para evitar que tais sentenças se repitam no futuro.

Entre os princípios legais em que se baseia o direito penal, o princípio da intervenção mínima e da proporcionalidade deve sempre prevalecer. Em outras palavras, a ação punitiva do Estado só deve ser usada como último recurso (ultima ratio) para proteger os bens legais, quando tal proteção não puder ser alcançada por meios menos prejudiciais ao indivíduo.

As seis sindicalistas da CNT em Xixón foram condenadas por dois crimes, incluindo coerção grave. Em nosso Código Penal, o crime de coerção está incluído no grupo dos “crimes contra a liberdade”. Este delito criminal é projetado para ser aplicado somente em casos particularmente graves, nos quais está provado que foi utilizada violência ou intimidação. Mas também é necessário que tenha havido uma conscientização e vontade de que o uso de tais meios tinha como objetivo subjugar o sujeito supostamente coagido. Após estas avaliações legais, a verdade é que quando imaginamos o crime de coerção, muitos casos graves vêm à mente, mas nenhum deles tem a ver com comícios à porta de uma empresa.

Dito isto, é claro que algo está errado com nosso sistema legal e judicial quando sindicalistas são condenados a três anos e meio de prisão e uma multa de 150.000 euros por realizar ações de natureza eminentemente pacífica e de protesto à porta de uma empresa. Se a Suprema Corte não anular a sentença, um meio particularmente prejudicial terá sido utilizado se levarmos em conta a pena de prisão e o valor da multa. Pode se tornar um precedente perigoso para o movimento sindical.

As trabalhadoras condenadas estavam realizando atividades sindicais, além de quaisquer outras considerações que possam ser feitas sobre os fatos do caso. Sendo assim, o direito à liberdade de associação consagrado no art. 28 da Constituição espanhola é um direito fundamental que não só está especialmente protegido em nossa Carta Magna, mas também é imposto pelos regulamentos europeus, bem como por tratados e acordos internacionais dos quais o Estado espanhol é parte. E este direito à liberdade sindical está inevitavelmente ligado a outros direitos fundamentais, como o direito de reunião e manifestação (art. 21 EC) ou o direito à liberdade de expressão (art. 20 EC).

Em um Estado de direito, é compreensível que os direitos fundamentais tenham limites e não sejam absolutos, mas o que os tribunais – em seu papel de intérpretes da lei – devem levar em conta é que essas limitações não acabam esvaziando completamente seu conteúdo essencial. Em outras palavras, que a liberdade sindical não se torne inútil e seja minada diante da -insistentemente protegida – liberdade de empreendimento, que também é reconhecida pela Constituição.

Para ser mais descritivo no argumento: se tomarmos o direito à liberdade de associação e o separarmos/dividirmos do direito de reunião e do direito à liberdade de expressão, seria totalmente inútil e sem qualquer utilidade social. E um direito que é inútil não é um direito real que possa ser exercido.

Com alguma tristeza e desânimo, estamos todos muito acostumados a ler as decisões judiciais nas quais a liberdade de empreendimento no âmbito da economia de mercado é repetidamente dada prioridade sobre outros direitos fundamentais e sociais, como a liberdade de associação. Alguém famoso corrupto repetiria a expressão “isso é o mercado, meu amigo”, visto que as prioridades em um sistema econômico capitalista não são exatamente os direitos da classe trabalhadora, mas a liberdade de empreendimento e o máximo lucro corporativo. Não faltam exemplos onde grevistas, trabalhadores em protesto e manifestantes são criminalizados e condenados. Neste último caso, ainda nos lembramos do “Não caso” dos dois militantes da CNT Logroño que foram injustamente acusados de participar pacificamente de uma manifestação.

Casos como a “sentencia de la manada” demonstraram que a organização e mobilização social é capaz de forçar uma modificação legislativa que aumentaria a proteção das mulheres contra o abuso e a agressão sexual – embora, é claro, ainda tenha suas deficiências. Assim como as mobilizações que conseguiram a recente revogação do art. 315.3 do Código Penal, que definiu um crime específico de coerção para greves e que permitiu que mais de 300 pessoas fossem processadas criminalmente nos últimos anos.

E é neste ponto que é necessário recorrer diretamente aos tribunais e ao legislador. Apelo através de mobilização social e protesto, que são elementos necessários para divulgar, conscientizar a sociedade, reunir a solidariedade e legitimamente exigir uma absolvição. Se, com a lei em mãos, os juízes conseguiram condenar e manter a condenação em um caso como este, talvez a lei deva ser emendada para esclarecer de uma vez por todas que a atividade sindical e/ou piquete não pode ser incluída no delito genérico de coerção.

O caso das seis sindicalistas da CNT Xixón é de tal relevância que uma modificação legal deve ser considerada imediatamente para evitar que este tipo de sentença reapareça no futuro e que – sem dúvida – levaria à absolvição imediata antes que a sentença fosse cumprida. A Suprema Corte ainda tem a última palavra.

Os direitos fundamentais são defendidos através do seu exercício. Neste sentido, no próximo sábado 24 de setembro, a CNT organiza uma grande manifestação nas ruas de Madri em frente ao Ministério da Justiça sob o lema “o sindicalismo não é um crime”. Colocar o foco das atenções e exigir proteção real para a liberdade sindical, a liberdade de expressão e o direito de manifestação é uma exigência que nos afeta a todos. Que a confusão entre coerção e exigências passe a ser coisa do passado.

Fonte: https://www.elsaltodiario.com/anarcosindicalismo/hablemos-de-coacciones-libertad-sindical?fbclid=IwAR17tpK8MR_ujzGWbjxKAqVzKiUoqRKXyYi1jX_ZKEApqWhROIuA3TjowEU

Tradução > Liberto

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